Entidades contestam o destino da BR-440
Pelo menos três petições foram protocoladas nos últimos dias para questionar a legalidade da obra da BR-440, na Cidade Alta. Os documentos estão em tramitação no Ministério Público Estadual do Meio Ambiente, Procuradoria da República, em Juiz de Fora, e Tribunal de Contas da União (TCU). O questionamento principal é a destinação do traçado da via. Uma das petições se embasa no Plano Diretor do Município para afirmar que o caminho não pode servir como ligação entre duas rodovias federais, e sim como via de acesso entre bairros. Já as outras petições questionam que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) pode financiar apenas obras de interesse da União, por exemplo, a ligação entre duas rodovias federais. No entanto, pelo novo projeto, a BR-440 começaria na BR-040 e terminaria na altura do campo do Nova União, no Bairro São Pedro. Desta forma, não estaria chegando ao trecho urbano que coincide com a BR-267, como previa o projeto original.
As petições, que são iniciativas populares, vieram à tona após o anúncio da retomada das obras da BR-440. Elas mobilizam moradores da Cidade Alta e grupos contrários à conclusão do espaço como rodovia. Desde que o novo edital foi publicado, em junho, e a Empa S/A escolhida a empresa responsável pelos trabalhos, em agosto, vários encontros têm sido feitos para tentar discutir o assunto. Eles defendem que a BR-440 é ilegal e objetiva apontar outras soluções para a via. Ninguém questiona que melhorias devem ser feitas no traçado e que a obra deve ser concluída, mas sim a transformação do espaço em rodovia, o que dividiria o bairro com um tráfego intenso de veículos pesados. Estes encontros têm mobilizado grupos que antes agiam de maneira isolada, mas que agora se uniram na busca de uma resolução para um problema que se arrasta há décadas e já trouxe muitos prejuízos para a população do entorno.
O que eles querem, na verdade, é que a Via São Pedro, como é conhecida, sirva apenas para ligação entre bairros, como prevê o Plano Diretor do Município. Paralelo a isso, há projetos da sociedade civil para que ela se transforme em área de promoção à educação e cidadania. Um novo encontro está marcado para ocorrer hoje, às 19h, na Casa da Colônia de São Pedro, em frente à igreja matriz do bairro. Desta vez, diversas autoridades foram convidadas, como representantes de Prefeitura, Ministério Público e Dnit.
Plano diretor
Conforme a advogada socioambiental Ilva Lasmar há duas semanas, as petições foram protocoladas. Um dos documentos, de sua autoria, foi entregue ao Ministério Público Estadual de Meio Ambiente, enquanto outros dois, de autoria coletiva, enviados para a Procuradoria da República, em Juiz de Fora, e o TCU. “Encontramos várias irregularidades, e muitas delas são as mesmas já levantadas na primeira fase das obras, antes deste edital. Mas as entidades não se atentaram muito para o caso.”
Ilva explica que a via não pode ser uma rodovia federal porque isso não está previsto no Plano Diretor. “A lei que instituiu o plano, de 27 de junho de 2000, operou textualmente esta proposta. O objetivo era estruturar algumas regiões da cidade.”
Outro questionamento é sobre a federalização da via com intuito de conseguir recursos da União. “Criaram uma ficção, que é uma estrada entre a BR-040 e a BR-267. É um projeto ficcional e, além disso, não existe a figura de federalização no entendimento jurídico. Existe a cessão, a delegação e as vias coincidentes. A verdade é que o Dnit só pode financiar projetos de interesse nacional. Só poderia ser diferente se a via municipal se coincidisse com projeto de outra rodovia federal, o que não acontece”, argumenta, citando ainda que o novo contrato com a Empa prevê a conclusão do traçado apenas entre a BR-040 e o Campo do Nova União, ao custo de R$ 45,9 milhões. “Quando o TCU suspendeu as obras, haviam sido construídos cerca de quatro quilômetros, ao custo de R$ 58 milhões. Agora o novo contrato prevê melhorias nestes mesmos quatro quilômetros, e dará praticamente o mesmo valor. Não faz sentido.”
Ainda segundo Ilva, a solução seria a transformação do espaço em uma área de interesse da sociedade. “Já demos dois projetos para a Prefeitura para a criação de um boulevard, em um conceito bonito e contemporâneo. Entendemos que tudo que já foi feito até hoje é ilegal e queremos anular esta ilegalidade mantendo a natureza jurídica, como está no plano diretor.”
‘Queremos que a via seja integradora’
De acordo com o professor de direito da faculdade Doctum, Rafael Pimenta, os encontros têm sido feitos com a participação de dez entidades, entre associações de moradores, professores universitários, ambientalistas e engenheiros. “Este novo processo de licitação está trazendo muitas dúvidas, não só do ponto de vista da arquitetura, urbanismo e engenharia, como também nas questões jurídicas. Há vários problemas no edital que não podiam ter sido negligenciados pela Prefeitura.”
O presidente do Instituto Ação Urbana e diretor da Federação dos Loteamentos e Sociedades Pró-Melhoramentos (SPMs) da Cidade Alta, Eduardo Lucas, afirma fazer um trabalho de conscientização com representantes dos moradores dos bairros e condomínios próximos. “Queremos que a via se transforme em uma avenida integradora. Gostaríamos de um novo processo de urbanização e humanização para que ali seja um ambiente saudável, com ciclovias, áreas de caminhada e espaço de lazer. Nossa fala não é de confronto com a administração pública. Só queremos que ela se sensibilize com os anseios da população da Cidade Alta. Defendemos o término da obra, mas não da criação de uma rodovia.
O novo contrato de prestação de serviços foi assinado no último dia 9 e entrou em vigor no dia 16. A previsão é que os novos trabalhos, que ainda não foram reiniciados, sejam concluídos até o dia 23 de novembro de 2016. A Tribuna tentou contato com representantes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) ao longo de uma semana, mas não obteve retorno acerca dos questionamentos. Já a Prefeitura, por meio de sua assessoria de comunicação, disse que não há como se manifestar porque a área se tornou federalizada. No entanto, foi confirmado que o prefeito Bruno Siqueira (PMDB) pediu ao Ministério das Cidades, recentemente, para que, no espaço da rodovia, haja também uma ciclovia. O chefe do Executivo ainda não teve retorno deste pedido.