Caso Matheus Goldoni: decisão de júri fica para sexta-feira
Jurado passou mal quando julgamento completava quase 16 horas e final foi adiado; testemunhas e quatro réus foram ouvidos nesta quinta
Após cerca de 16 horas de júri somente nesta quinta-feira (22), a decisão do julgamento do caso Matheus Goldoni ficou para esta sexta. A medida foi tomada por volta de 1h de sexta, momentos após um dos jurados passar mal ao final da tréplica da defesa. A retomada da sessão ficou marcada para as 9h.
Os trabalhos devem ser iniciados com o fim da tréplica da defesa dos réus, já que restavam 15 minutos para as considerações dos advogados. Em seguida, os jurados devem decidir o futuro dos quatro réus pronunciados por homicídio. Eles se reunirão em uma sala secreta e têm até duas horas para decidir o resultado. Depois, o juiz Paulo Tristão fará a leitura da sentença. Ao todo, o julgamento, que começou na terça, já ultrapassa 40 horas de duração.
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Na noite desta quinta, foi realizada a fase de debates, em que as partes fazem suas considerações perante os jurados. Esta etapa durou cerca de nove horas, e teve início por volta das 16h, quando o promotor do Ministério Público Hélvio Simões foi o primeiro a fazer uso da palavra, seguido pelo advogado assistente, Wagner Valssis. A promotoria defendeu que a participação do gerente operacional da boate – um dos réus – para a ocorrência da morte de Matheus Goldoni seria sua omissão, uma vez que que ele tinha o poder de impedir a ação dos seguranças e que a morte do jovem teria sido provocada pela conduta de dois seguranças com a ajuda de um ex-funcionário da casa noturna. A promotoria ainda ressaltou que a vítima teria sido violentada e que não teria feito uso de entorpecente na noite dos fatos.
Após a intervenção do Ministério Público, teve início o debate por parte dos três advogados de defesa dos réus. Os defensores apresentaram aos jurados o que acreditam ser inconsistências no processo, principalmente no inquérito policial. Uma das principais alegações é de que os réus teriam se molhado caso tivessem matado Goldoni afogado. A defesa afirma que ele morreu por um acidente. Os advogados criticaram, ainda, a cobertura do caso pela mídia.
Na réplica da acusação, o promotor Hélvio Simões começou sua explanação destacando que o local onde o corpo de Matheus foi encontrado estava muito diferente no dia em que os jurados estiveram lá (na terça) em comparação com o dia do suposto crime. Para a acusação, era impossível que Matheus se afogasse no local, porque a profundidade era muito pequena, segundo o promotor. Além disso, ele destacou que o corpo de Goldoni apresentava lesões internas, causadas por instrumento contundente, segundo a perícia, e afirmou que não teria motivos para Matheus descer a trilha da cachoeira onde foi encontrado. A acusação usou a réplica para sustentar que a asfixia foi causada por meio criminoso. O promotor e o advogado assistente optaram ainda por reproduzir vídeos de parte dos depoimentos prestados por duas testemunhas no plenário, consideradas chaves para a acusação.
Em suas últimas duas horas em plenário, a defesa dos quatro réus destacou o depoimento de um amigo de Goldoni, que viu o momento em que o jovem foi agredido. Ele disse perante o júri que viu quando um dos seguranças voltou à boate depois que Matheus saiu. O jovem diz que este intervalo durou de 10 a 15 minutos. Para a defesa, o espaço de tempo seria insuficiente para que os réus descessem a trilha e matassem Goldoni, usando da experiência de os jurados terem ido ao local, de difícil acesso, para exemplificar. Os defensores usaram ainda as alegações da perita da Polícia Civil para defender que a morte foi um acidente. Eles também destacaram que todos os réus seriam primários, sem nenhum envolvimento com crimes.
Depoimentos dos réus
Durante a tarde desta quinta-feira (22), foram finalizados os depoimentos dos quatro réus do julgamento popular do caso Matheus Goldoni. O primeiro réu a depor no dia, após a nova oitiva da perita, foi o gerente operacional da boate que trabalhava na noite dos eventos que culminariam na morte de Matheus. O interrogatório durou cerca de uma hora e meia. O segundo réu a depor, por volta de 12h30, foi um segurança a quem o rapaz supostamente teria tentado agredir. Ele teria, junto de outro segurança, corrido atrás de Matheus já do lado de fora da boate. Em seguida, foi realizado um intervalo. No retorno do recesso, um terceiro réu, outro segurança que trabalhava na noite dos fatos e teria perseguido Goldoni, foi ouvido. Por volta das 15h, o último deles, um ex-segurança da boate Privilège, começou a prestar suas declarações. Ele foi apontado como o homem que ofereceu carona em uma motocicleta a um dos seguranças que perseguia Matheus.
Perita é ouvida novamente
Pela manhã, a perita da Polícia Civil, Soraya Araújo, foi ouvida novamente, depois de prestar depoimento também nesta terça-feira. A situação foi considerada inesperada, pois os trabalhos seriam iniciados pelos depoimentos dos quatro réus. Segundo o juiz Paulo Tristão, ela o procurou nesta quinta, dez minutos antes de a sessão ter início, para pedir para ser ouvida novamente. Em sua breve fala, porém, a perita fez apenas uma ressalva sobre uma observação técnica que fizera em sua primeira oitiva. Os jurados receberam ainda, a pedido de um dos integrantes do júri, o laudo de necropsia e de levantamento e complementos.
Juiz promoveu acareação entre mãe de Matheus e testemunha
A mãe da vítima, Nívea Goldoni, foi submetida, na noite de quarta-feira, a uma acareação com uma das testemunhas, durante o julgamento, pelo juiz Paulo Tristão. O homem teria sido gravado pelos pais de Matheus, falando sobre o que vira no dia dos fatos e, durante a sua oitiva desta quarta, negou as informações, embora tenha admitido ser dele a voz na gravação. “O juiz falou pra gente ficar um de frente pro outro, e foi muito importante isso, os jurados quiseram me ouvir”, afirmou Nívea à reportagem. “Ele falou que não conversou. Mas e a gravação? Ele assumiu que é a voz dele. Graças a Deus a gente conseguiu mostrar que ele está com medo. Foi o que ele falou pra gente desde o início, que estava com medo de falar.”
Antes do começo da sessão da manhã de quinta, o advogado da família Goldoni, Wagner Valssis, comentou com a reportagem a respeito da acareação promovida pelo juiz Paulo Tristão entre a mãe de Matheus, Nívea Goldoni, e a testemunha que teria presenciado o desenrolar dos fatos do lado de fora da boate envolvendo o jovem e os seguranças da casa noturna. Segundo Valssis, a testemunha procurou a família para relatar o que vira, mas, durante a oitiva no julgamento, negou o que teria dito em uma gravação em áudio apresentado pela defesa por se sentir “acuado”. “Não foi a família que saiu buscando ele, ele primeiro entrou em contato e, numa primeira conversa, disse para a família que tinha visto. Isso consta nos autos. Só que depois, isso ele mesmo fala, por medo, ele volta atrás.”
Já o advogado de defesa dos réus, Ricardo Fortuna, considerou a acareação entre a testemunha e a mãe de Matheus “proveitosa”. “Foi muito bom para que os jurados pudessem ver a sinceridade e a verdade e aquilo que cada testemunha disse ter visto no dia dos fatos.” Ele também comentou a oitiva da perita criminal que procedeu o exame no local onde o corpo de Matheus foi localizado. “A perita esclareceu toda a dinâmica do evento e alguns pontos obscuros. Eu sou muito otimista com a Justiça”.
Histórico do caso
Há quase cinco anos, no dia 17 de novembro de 2014, o jovem Matheus Goldoni, de 18 anos, foi encontrado morto nas águas da cachoeira do Vale do Ipê, cerca de 56 horas após ter sido visto pela última vez do lado de fora da casa noturna Privilège. Dois seguranças, um ex-funcionário e o gerente operacional do estabelecimento foram denunciados como réus no processo. Eles foram pronunciados em junho de 2016 por homicídio triplamente qualificado: por motivo fútil, mediante asfixia por afogamento e com recurso que dificultou a defesa da vítima. Os quatro acusados ficaram em liberdade até a realização do julgamento.
Na denúncia de homicídio triplamente qualificado, o Ministério Público apontou que Matheus não teria se afogado sozinho, “ante a presença de pulmões aumentados, crepitantes e distendidos, com petéquias (pequenas lesões da pele ou das mucosas) e Manchas de Paltauf (equimoses viscerais nos pulmões dos afogados)”. Para o MP, além de asfixia, houve motivo fútil, “pois a vítima, ao sair da boate, nervosa, tentou dar um soco em dos seguranças”; e recurso que dificultou a defesa da vítima, “ante a superioridade numérica dos denunciados e a desproporcionalidade entre o porte físico deles e o da vítima”.
De acordo com a denúncia, o jovem estava no interior da boate e se envolveu em uma briga com dois clientes e com os seguranças do estabelecimento, sendo retirado do local. Na saída, ele tentou desferir um soco contra um dos acusados e saiu correndo. O rapaz foi perseguido inicialmente pelo segurança e por mais dois denunciados. Ainda conforme a promotoria, o ex-segurança da casa estava perto da Privilège em uma barraca de cachorro-quente e, ao ver um dos funcionários indo atrás de Matheus, deu a ele uma carona na sua moto para que pudesse alcançá-lo. Enquanto isso, o outro segurança e o gerente operacional continuaram a perseguição a pé.
Ainda conforme a denúncia, os dois homens que seguiram de moto alcançaram a vítima a cerca 250 metros da boate, perto da entrada de uma trilha que dá acesso à cachoeira onde o corpo do jovem foi encontrado. Para o MP, a dupla cercou o jovem, que foi imobilizado com um golpe de “mata-leão” até a chegada dos outros dois envolvidos. “Sob o comando do gerente operacional da casa noturna, que tinha o controle sobre a situação e deveria se ocupar somente com o funcionamento interno do estabelecimento, mas teria acompanhado a perseguição, os dois seguranças receberam a vítima das mãos do ex-funcionário que lhe aplicava o “mata-leão” e o levaram para a trilha, local considerado de difícil acesso, desconhecido por Matheus e no qual o jovem não iria voluntariamente”.
Para a promotoria, o rapaz foi morto pelos dois seguranças, por meio de asfixia por afogamento, enquanto os outros dois acusados ficaram vigiando a entrada da trilha. O corpo de Matheus só foi encontrado mais de dois dias depois de seu desaparecimento por uma testemunha que conhecia a cachoeira.
Repercussão
Ao longo dos três dias de julgamento, a plenária do Tribunal do Júri permaneceu lotada de familiares e amigos da vítima e dos réus, além estudantes e profissionais da área do Direito e curiosos. No local, cabem 198 pessoas sentadas, mas, nesta quinta, havia cerca de 260 pessoas no salão entre os que estavam sentados nos assentos e no chão e em pé. Por volta das 18h, ainda havia uma grande fila de pessoas na porta do Fórum Benjamin Colucci à espera de entrar e poder assistir ao restante do julgamento, uma vez que o caso teve grande repercussão. “Estou chegando agora e vou tentar entrar, pois considero que seja uma grande aula ver, in locu, a atuação dos promotores, defensores e demais advogados”, afirmou a estudante de Direito, Marina Dias de Assis, de 20 anos.
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