Especialistas dão orientações sobre prevenção à dengue

Tribuna conversou com infectologista e biólogo sobre gravidade da doença e medidas de combate ao Aedes aegypti


Por Carolina Leonel

18/05/2019 às 17h25- Atualizada 21/05/2019 às 20h56

Embora o período chuvoso e de temperaturas mais elevadas tenha passado, o número de casos confirmados de dengue em Juiz de Fora segue aumentando. Segundo a última atualização de dados da Prefeitura, 1.409 casos da doença já foram confirmados no município. Além disso, conforme levantamento feito pela Tribuna publicado neste sábado (18), entre março e abril deste ano, o registro de casos prováveis aumentou em mais de 1000%, de acordo com boletins divulgados pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG). Com o alto índice de notificações e com a crescente no número de suspeitas de mortes por dengue na cidade – já são sete -, a Tribuna conversou com especialistas para discutir as melhores formas de controle do Aedes aegypti, bem como as manifestações clínicas e agravos das doenças transmitidas pelo vetor.

Uma das principais orientações com relação a essas doenças é procurar atendimento médico imediatamente, para que o paciente possa ser medicado corretamente. Por isso, ao apresentar os sinais clínicos de alarme da dengue (ver quadro), a pessoa deve se preocupar e procurar atendimento médico. De acordo com o infectologista Guilherme Côrtes, tais sintomas evidenciam-se quando o paciente apresenta grave quadro de desidratação em decorrência da doença, sendo de extrema importância a hidratação venosa.

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O médico explica que a dengue se manifesta em dois momentos. “Na primeira fase, a pessoa fica com muita dor no corpo e febre alta. Na segunda, normalmente dois ou três dias depois, a pele começa a ficar avermelhada e a febre tende a diminuir. Nesse momento, o quadro tende a ficar mais grave, e é quando começam a surgir fenômenos hemorrágicos, pressão baixa, desmaio, diminuição de volume urinário e dor abdominal intensa. Ao contrário das viroses, que quando acaba a febre é sinal de melhora, na dengue, não. Nesta segunda fase é que vem o perigo: o corpo fica mais inflamado, a pessoa desidrata mais e precisa ficar de olho nos sintomas de alarde”, alerta o médico.

Negligência dos sintomas pode levar ao óbito

Muitas vezes, de acordo com o especialista, as pessoas negligenciam os sintomas de alarme ou encontram dificuldades de acesso à hidratação em emergências. Em consequência, a doença evolui de forma súbita, o que, em muitos casos, leva ao óbito. Além disso, o fato de grande parte da população já ter adquirido a doença no surto em 2016 é fator de risco, que aumenta em três ou quatro vezes a incidência de manifestações graves.

Ele cita ainda que a circulação de um novo sorotipo de maior virulência, associado aos outros fatores, também contribui para agravo da doença. Por tais razões, a divulgação de informações e dados sobre a doença no município, para ele, são fundamentais. “Acredito que para mobilizar a população, o potencial de gravidade da doença deve ser divulgado. Entendo que dados relacionados a confirmações e óbitos deveriam ser mais prontamente divulgados, (porque) se perde a oportunidade de prevenção e intervenção. A tendência natural é que as pessoas só se preocupem em intensificar medidas preventivas quando elas têm entendimento que, realmente, há a circulação de uma doença que pode afetar a vida delas. Então, a questão da divulgação é de extrema importância”.

“Nesta segunda fase é que vem o perigo: o corpo fica mais inflamado, a pessoa desidrata mais e precisa ficar de olho nos sintomas de alarde” Guilherme Côrtes, médico infectologista (Foto: Marcelo Ribeiro)

Orientações

Para identificação da doença, o infectologista também orienta a realização de exame hemograma com plaquetas ainda durante a primeira fase da dengue. “Além dos sinais clínicos, o paciente também precisa de sinais laboratoriais para monitorar a situação. Estes sinais, basicamente, indicam queda de plaquetas e aumento no hematócrito. A gente acredita que boa parte dos óbitos da dengue são preveníveis com hidratação venosa a partir de evidências clínicas e laboratoriais”, diz. Providências antecipativas são fundamentais para o tratamento da doença.

O médico lembra que a dengue mata e, para tanto, não precisa, necessariamente, estar relacionada a comorbidades. “Qualquer pessoa que tenha quaisquer distúrbios crônicos têm maior possibilidade de evoluir com maior gravidade e óbito. No entanto, o fato de uma pessoa não ter doenças crônicas não minimiza a gravidade da dengue. Então, podem morrer pessoas jovens por dengue caso desenvolvam os sinais de alarde e caso não seja feita a hidratação adequada”.

Eliminação dos criadouros do Aedes deve ser constante

A melhor forma de se prevenir, no entanto, é evitando a proliferação do Aedes aegypti. É o que defende o biólogo e especialista em comportamento e biologia animal do Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Fábio Prezoto. “A melhor maneira de se controlar a dengue é, principalmente, evitar a proliferação do mosquito. Se você interrompe a proliferação, você elimina a produção do mosquito adulto diretamente”. Por isso, a recomendação do especialista é para que a atividade de eliminar possíveis criadouros, vistoriando locais que possam acumular água, seja constante, já que, feita uma única vez, ela não é eficiente. “Você pode verificar um local específico ou a sua residência e naquela semana não ter nada, mas na semana seguinte pode ser que apareça um mosquito e o inseto faça a postura de ovos no local, por exemplo. Então este trabalho deve ser periódico”, alerta.
O biólogo orienta que haja um intervalo semanal para a vistoria. “Com o intervalo, dá tempo de você impedir que um ciclo todo de desenvolvimento do mosquito aconteça durante o período que não ocorreu a vistoria. Uma vez por semana, sempre aos sábados, por exemplo, a pessoa vai conseguir, se houver a presença dos ovos ali, estar impedindo que os ciclos aconteçam”, explicou.

Essa vistoria deve ser feita em locais e recipientes que possam acumular quantidades mínimas de água, pois mililitros são suficientes para que uma geração inteira de larvas complete o ciclo. “Isso pode acontecer de maneira bem fácil dentro da casa. São alguns reservatórios, poças de água regulares em um determinado local. Devemos ter cuidado com os próprios locais que armazenamos a água para consumo. Alguns eletrodomésticos podem empoçar água, por exemplo. A água que sai do ar condicionado e fica empoçada regularmente pode se transformar em um local interessante para o mosquito se proliferar; vasos de plantas e potes com água parada também são alguns dos principais locais em que se armazena água.” A orientação é que, em caso de reservatórios de água parada com possíveis larvas de Aedes, o conteúdo seja jogado fora, em local seco. O recipiente deverá ser lavado e devidamente higienizado.

Prevenindo picadas

Quando conter a proliferação do mosquito não é mais possível, o ideal é que a população adote medidas para prevenir picadas do Aedes. “O repelente é algo importante, principalmente quando a pessoa sabe que o local onde ela vai transitar pode ter a presença do inseto. Então, uma boa forma de se evitar sua picada – que é discreta -, é criar uma barreira fazendo uso de repelente. Em casa, nós recomendamos que as pessoas telem janelas e tomem cuidado de não deixar as portas abertas, sem controle, durante as primeiras horas da manhã e no fim da tarde, quando, muitas vezes, a fauna externa transita para o interior da casa”, sugere o especialista. Além de prevenirem a circulação do mosquito dentro das residências e possíveis picadas, essas medidas evitam o uso “indiscriminado de inseticida”, lembra Prezoto. De acordo com ele, a quantidade utilizada para matar o Aedes deixa resíduos que afetam outras espécies essenciais ao equilíbrio do ecossistema, como abelhas, por exemplo.

‘Todo mundo precisa fazer a sua parte’

O professor chama atenção para o alto percentual de criadouros encontrados em residências. Cerca de 80% do total dos focos estão dentro das casas. “Somente a vistoria individual tem uma ação cuja efetividade é limitada a um local. Se nós tivermos uma rede e essa ação for estendida para todas as residências, a possibilidade de controle amplia muito. Todo mundo precisa fazer a sua parte”, ressalta Prezoto.

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Os problemas relacionados à dengue geralmente acometem a população em períodos específicos do ano, o que faz com que as medidas de prevenção à doença sejam esquecidas no cotidiano de outras épocas, principalmente as mais frias do ano. Isso acontece, explica o especialista, porque temperaturas mais baixas fazem com que a presença dos mosquitos adultos caia drasticamente. O que não impede, no entanto, dos óvulos do inseto continuarem em movimento.

“Caracteristicamente, os óvulos do Aedes podem ficar à deriva em um possível criadouro por um longo período de tempo, até mais de um ano. Então, se existe um potinho abandonado próximo da casa ou algum outro local, o mosquito pode colocar seus ovos, mesmo em um local seco. Porém, se chove dentro de algum tempo, aquele reservatório vai se encher de água e os óvulos que ali foram depositados darão origem a uma nova geração de larvas e mosquitos. Em pouco tempo, entre sete e dez dias tem-se a emergência de adultos em um período em que era menos provável disso acontecer”.

População deve seguir orientações oficiais

Além das medidas citadas, relações estabelecidas pelo próprio meio-ambiente podem contribuir para o controle do Aedes aegypti. Entretanto, predadores naturais do inseto ainda são pouco estudados pela Ciência, explica Prezoto. “Nós sabemos de alguns (predadores) que são mais relatados, mas infelizmente ainda não temos uma estratégia clara para gente fomentar o uso de predadores. É sabido que aranhas e lagartixas podem ter um papel e contribuir no processo de caça dos mosquitos. Predadores, normalmente alados, funcionam muito bem sobre as fases adultas do mosquito, enquanto algumas espécies de peixes podem funcionar como predadores da fase aquática do mosquito (larva)”.

Por outro lado, o professor cita que existem crenças inverídicas e sem fundamentos científicos envolvendo o controle do Aedes por meio do cultivo de determinadas plantas. “Algumas pessoas afirmam que cultivar crotalária ajuda no combate à dengue porque esta planta atrai predadores do Aedes. Porém, essa relação é mítica. Nós cientistas não sabemos, de fato, como isso se formou, mas isso se arraigou de tal forma nas redes sociais que vira e mexe essa informação circula. Porém, não existe nenhuma evidência científica sobre isso”.

Portanto, o alerta do especialista é para que o controle dos insetos e a prevenção das doenças sigam as recomendações adequadas, “como as que são divulgadas em cartilhas da Prefeitura, em sites especializados. São recomendações simples, que não colocam a pessoa e a população em risco”.

 

Tópicos: dengue

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