Fiscais de posturas encontram dificuldades nas ruas
Categoria solicita edição do decreto com previsão específica de multas para que ações sejam mais efetivas
Sem a previsão específica de multas pecuniárias como sanções aos comerciantes que insistem em desobedecer ao Decreto Municipal 13.893, voltado para garantir o isolamento social, os cerca de 40 fiscais de posturas que atuam nas ruas de Juiz de Fora estão encontrando dificuldades para conseguir fazer valer as regras. Adotando, inicialmente, medidas de orientação, eles chegam a ir mais de uma vez em um mesmo estabelecimento comercial, sobretudo bares, e, mesmo com apoio da Guarda Municipal e da Polícia Militar, se veem expostos a possíveis enfrentamentos se decidem agir com mais rigor. Para a melhor eficácia das ações de fiscalização, que buscam evitar aglomerações a fim de coibir a propagação do novo coronavírus e não sobrecarregar o sistema de saúde, a categoria solicita ao Município a edição do decreto com a imposição objetiva de penalidades para quem desobedecer às normas.
Até esta terça-feira (14), conforme esclareceu a Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaur), o descumprimento do decreto pode acarretar sanções administrativas previstas no Código de Posturas, que vão desde a interdição, à multa e até cassação do alvará, no caso de persistência. Os infratores também estão sujeitos aos artigos do Código Penal 268 (infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa), como no caso do estabelecimento considerado não essencial que não baixar as portas; e 273 (falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais), que pode ser aplicado, por exemplo, na venda de álcool gel sem procedência.
“Há uma preocupação dos fiscais de posturas relativa à questão legal, à consolidação das medidas de isolamento social que partem do funcionamento do comércio e de atividades congêneres. Os decretos emitidos originalmente não foram claros em relação a certas regras e, principalmente, não deixaram claro também a aplicação da punição, das penalidades. Os fiscais são agentes do cumprimento da lei. Eles têm o poder de polícia administrativa e, portanto, sua autoridade se faz valer pela aplicação das sanções legais, não previstas, objetivamente, nos decretos anteriores do prefeito”, disparou o presidente da Associação dos Fiscais de Posturas, Randolfo Medeiros.
O assunto chegou a ser tratado pelo chefe do Executivo, Antônio Almas (PSDB), na última segunda-feira (13), durante entrevista à Rádio Super, de Belo Horizonte. Na ocasião, ele disse ainda estar na fase de convencimento, mas não descartou a adoção de estratégias mais drásticas para reforçar o isolamento social e conter o avanço da pandemia, como a aplicação de multas para aqueles que desrespeitarem as limitações impostas pelos decretos municipais. “Essas medidas podem ser tomadas em um curto espaço de tempo, entre 24 e 48 horas”, ponderou o prefeito. “É importante que cada um faça sua parte. Caso contrário, o sistema público e privado de saúde vai colapsar e enfrentaremos momentos muito difíceis”, reforçou a autoridade.
De acordo com o presidente da Associação dos Fiscais, já foi solicitado, por intermédio de interlocutores, agilidade na edição do decreto. “Há três semanas, a fiscalização percebe a paulatina reabertura do comércio e de algumas outras atividades. Ou pessoas driblando o decreto, em cima de interpretações pessoais, sobre as quais a fiscalização não pode fazer muita coisa.” Com essa “agitação e comoção” de parte da população, a categoria receia que não só a legislação não seja cumprida e o isolamento seja quebrado, como ainda desencadeie ato de hostilidade em relação à ação fiscalizadora. “Nossa segurança é precária, não sentimos uma articulação de alto nível na Prefeitura para que os fiscais fizessem parte de uma força-tarefa para cumprimento do decreto municipal. Pleiteamos até uma reunião com o prefeito há uma semana, mas não tivemos retorno até o momento”, afirmou Randolfo nesta terça-feira (14).
Fiscais têm “visão clara” das ruas
Atuando na linha de frente para garantir o fechamento de estabelecimentos comerciais e serviços não considerados essenciais, os fiscais de posturas são testemunhas de uma realidade de afrouxamento das medidas de isolamento e distanciamento social. “Temos a visão clara das ruas, estamos vendo as coisas acontecerem. Não sabemos se as autoridades acima de nós estão tendo a mesma perspectiva, mas, certamente, não estão andando pelas ruas da cidade. E o nosso temor é, sim, que o isolamento social se quebre, se parta”, declarou o presidente da associação da categoria, Randolfo Medeiros.
Na percepção dele, já foram suficientes as três semanas da “fase de convencimento”, com informações midiáticas ostensivas para que as pessoas permaneçam com os serviços não essenciais paralisados. “Vemos isso se esvanecer a cada momento. Se os fiscais perderem o controle das ruas, o isolamento social será partido, porque somente os fiscais estão garantindo o fechamento das atividades. Estamos sozinhos nas ruas”, desabafou, lembrando o apoio da Polícia Militar, na questão do fechamento dos bares noturnos – quando os fiscais chegam a se dividir em duas equipes para ampliar o raio de alcance, com base nas denúncias recebidas – e da Guarda Municipal, sempre que solicitada. “A percepção de quem está nas ruas pode não a ser mesma de quem está nos orientando”, completou, enfatizando que a Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaur), à qual os fiscais estão subordinados, sequer integra o Comitê de Prevenção e Enfrentamento ao Coronavírus (Covid-19), criado por meio de decreto no dia 16 de março, sob coordenação do prefeito.
“A Semaur, que executa os decretos municipais pertinentes às posturas da atividade econômica, nem faz parte do comitê gestor, ou seja, não está na zona de planejamento estratégico. E nós vemos isso com muita temeridade, porque é feito um decreto justamente para a minha categoria fazer o cumprimento, e ela não está sendo ouvida. A ausência da Semaur no comitê nos causou muita estranheza e pode ser um dos fatores que está levando as autoridades a não terem uma visão perfeita do que está acontecendo nas ruas.”
Paralelamente à queixa, a associação destacou que nenhum aparato extra foi oferecido aos agentes durante a atuação neste período de pandemia. “A fiscalização está trabalhando na quarentena, no estado de calamidade pública, com a mesma estrutura que faz o seu trabalho convencional, por exemplo, de fim de ano, de combate a ambulantes. Não tem equipamento novo, não tem logística nova, nenhuma orientação dos altos escalões. Nosso departamento tem que ficar se virando para reinventar rota todos os dias, e isso causa muito desgaste.”
“Pressão nas ruas para que tudo volte ao normal”
Os fiscais também sugerem o apoio de equipes da Saúde durante as rondas, já que estas poderiam auxiliar a população a executar corretamente as medidas de prevenção, como manter um distanciamento mínimo. “Grande parte das queixas diz respeito ao comportamento dos transeuntes. E nós realmente não temos poder para isso, para o ordenamento de filas ou sobre a situação sanitária no interior dos estabelecimentos. Sentimos muita falta de não fazermos parte de uma força-tarefa, de somente a fiscalização estar nas ruas para garantir o cumprimento do decreto”, argumentou Randolfo. Para ele, setores da saúde poderiam compor esse trabalho. “Ao lado da fiscalização do comércio, valeria a pena a composição com profissionais da área de saúde nas ruas, orientando as pessoas sobre o comportamento social, seja em filas, no interior dos estabelecimentos, nos serviços de bancos e lotéricas.” Segundo o representante da categoria, essa ausência “deu à população a sensação de que a quarentena estava acabando e só dificultou o trabalho”: “Há uma pressão nas ruas para que tudo volte ao normal, e nós temos a pressão legal para garantir que tudo seja segurado. Estamos entre a cruz e a espada.”
Com todos os parêntesis e críticas, muitas delas direcionadas à Administração Pública, Randolfo esclarece que o objetivo principal dos fiscais é que os atos para garantir o isolamento social proposto tenham êxito. “Nos manifestamos exatamente para que as coisas deem certo. Também temos familiares e amigos que não queremos que sejam contaminados. Pode ser que a visão administrativa seja diferente, mas valeria a pena ouvir nosso posicionamento.” Ele finalizou dizendo que todas as denúncias recebidas de desrespeito às normas são devidamente apuradas. “A maioria é procedente.” As ligações podem ser feitas para o 153 (Guarda Municipal) ou diretamente no departamento de fiscalização, pelo 3690-7507.
Resposta
Em nota, a Semaur informou que está agindo ostensivamente no cumprimento do Decreto Municipal 13.893 e suas posteriores alterações, sobretudo na área central e nos principais centros comerciais, como no Bairro Benfica, Zona Norte. As outras regiões da cidade são atendidas por rondas diárias da fiscalização. “Mesmo sem integrar o comitê gestor criado para as ações em relação à pandemia no município, a Semaur participa ativamente das decisões tomadas e é consultada sobre todas as questões que cabem à pasta”, assegurou. A secretaria ressaltou que estão sendo disponibilizados todos os equipamentos de proteção individuais (EPIs) necessários para a execução do trabalho nas vias da cidade, a fim de garantir a segurança dos servidores.