Comida chega, e 75 adolescentes permanecem acautelados
Atualizada às 19h23
A crise de alimentação no Centro Socioeducativo Santa Lúcia foi resolvida, emergencialmente, no fim da noite de segunda-feira (12), depois que a juíza da Vara da Infância e Juventude, Maria Cecília Gollner Stephan, deu ultimato ao Estado para sanar as pendências que se arrastam desde março deste ano. Segundo a magistrada, o atraso no pagamento da empresa contratada para a prestação do serviço levou caos para unidade, cuja despensa vazia foi apresentada à imprensa. No entanto, a Secretaria de Defesa Social (Seds) informou que os alimentos que chegaram à unidade seriam suficientes apenas para dois dias. De acordo com a juíza, os adolescentes vão permanecer no Santa Lúcia até segunda ordem, visto que, “milagrosamente, os gêneros alimentícios para terça e quarta-feira foram entregues antes das 6h de ontem”, prazo estipulado pela magistrada para que o Estado solucionasse o problema.
Em nota, a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) afirmou que não há problemas financeiros com a empresa responsável pelas refeições e que o fornecimento não teria sido interrompido por falta de pagamento. “A Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas (Suase) esclarece que o contrato vigente entre o Estado e a empresa fornecedora de alimentos do Centro Socioeducativo Santa Lúcia, em Juiz de Fora, APL Comércio e Serviços, está com o pagamento dentro do prazo legal.” Ainda conforme a pasta, de acordo com o artigo 78 da lei de licitações e contratos, a suspensão dos serviços só pode ser feita após atraso superior a 90 dias da data do pagamento devido. Segundo a subsecretaria, a fatura mais antiga em aberto foi emitida pela firma no dia 9 de agosto de 2016. “A empresa não possui amparo legal para a interrupção dos serviços.”
Também em nota, a APL Comércio e Serviços, com sede no Mato Grosso do Sul, informou que, quando assumiu os contratos de Minas Gerais, “não tinha conhecimento dos constantes atrasos que ocorriam por parte da Seds”. A empresa garante que, mesmo com os problemas, não deixou de fornecer alimentos para o Socioeducativo. “Nunca deixamos de atender e fornecer as cinco alimentações que constam em contrato. Nosso trabalho é de extrema responsabilidade, porque sabemos que lidamos com pessoas em privação de liberdade, fazendo com que o serviço torne-se muito mais complexo.”
A empresa informou que tem feito compras à vista para três dias por causa dos atrasos, e que o fornecimento é superior a cinco toneladas de comida por mês. “Estamos bloqueados com inúmeros fornecedores, como pães, frutas e estocáveis, por não conseguirmos manter os pagamentos em dia junto a eles. Mesmo assim, compramos à vista todos os dias as matérias-primas para cada três dias de fornecimento, o que não caracteriza descumprimento contratual. No contrato não exige cláusula que solicite estoque com mínimo ou máximo de mantimentos.”
A APL confirmou ter enviado ofício à Vara da Infância e Juventude relatando a situação. “Apontamos todas essas irregularidades e assuntos para que tomassem conhecimento da situação que se encontravam os contratos administrados pela Seds em relação aos Socioeducativos. Não podemos admitir que o Estado de Minas Gerais jogue a responsabilidade de alimentar adolescentes privados de liberdade para as empresas prestadoras de serviços. Nossa responsabilidade é de fornecer, cumprir com o contrato e receber em dia pelo fornecimento, o que infelizmente não ocorre.”
Situação revela como instituição é vulnerável
O episódio confirma a vulnerabilidade de uma unidade que vem enfrentando diversas dificuldades no cumprimento da medida socioeducativa de privação de liberdade. Desde o ano passado, o Centro Socioeducativo é alvo de fugas e irregularidades que resultaram na destituição da antiga diretoria. Na última segunda-feira, a juíza Maria Cecília assinou 75 termos de cumprimento de medida socioeducativa domiciliar, a fim de pressionar o Estado a regularizar sua situação junto à empresa fornecedora de alimentos. Ela deu um ultimato até às 6h de terça-feira, garantindo que colocaria todos os adolescentes acautelados em casa se o problema não fosse solucionado.
O conselheiro tutelar, Abraão Fernandes, diz que, quando o Estado não respeita os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, “fere de morte” os direitos humanos e os direitos fundamentais previstos na Constituição, além do Estatuto da Criança e do Adolescente.