Candidatos de JF acionam a polícia contra concurso da educação

Dentre as falhas relatadas estão o uso de celular e a troca de informações entre os concorrentes durante o exame


Por Gracielle Nocelli

09/04/2018 às 18h09

Fila em frente à Escola Estadual Delfim Moreira virava a esquina antes da abertura dos portões neste domingo (Foto: Pedro Capetti)

Candidatos que participaram do concurso público da Secretaria de Estado de Educação (SEE) apontaram uma série de irregularidades durante a aplicação das provas, realizadas no domingo (8) em todo o estado. Além da mudança do horário determinado em edital para o início das avaliações, com atraso nos dois turnos da prova, foram relatadas falhas como alterações das salas onde os exames seriam realizados, uso de celulares pelos concorrentes, troca de informações entre os candidatos e falta de provas. Em Juiz de Fora, participantes que se sentiram prejudicados registraram boletim de ocorrência. A Polícia Militar (PM) confirmou a situação, mas não informou o número de pessoas que fizeram o registro. Os transtornos também foram verificados em outros municípios mineiros.

Moradora de Recreio, Tânia Meireles de Moraes veio a Juiz de Fora para fazer as provas. Em entrevista à Rádio CBN/Juiz de Fora, ela contou os transtornos enfrentados, o que a motivou a procurar a polícia. “Cheguei 12h45 no local do concurso, pois a orientação no edital é que os portões seriam abertos às 13h, para as provas começarem às 14h. Já estávamos lá, quando nos avisaram do atraso de uma hora. Quando abriram os portões, as salas informadas no cartão de informação dos candidatos não correspondiam ao determinado. Foi uma bagunça, as pessoas ficaram perdidas.”

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Ela relatou ainda que, já na sala, outros problemas foram identificados. “A fiscal entregou as provas, mas quando chegou na minha vez, elas acabaram. Eu e mais quatro pessoas ficamos sem avaliação. Ela não podia deixar os candidatos sozinhos, então, teve que esperar outra pessoa chegar para resolver o problema, o que demorou um bom tempo. Neste intervalo, os outros concorrentes já estavam vendo as questões da prova, tirando fotos com celular, mas nada foi feito. Nas redes sociais, circulam imagens das provas”, diz. “Quando outro fiscal chegou com um malote aberto, eu questionei se aquela avaliação que recebi era igual à dos candidatos da minha sala, o que até agora não tenho certeza.”

Outro candidato, que preferiu não se identificar, disse à Tribuna que também registrou boletim de ocorrência. por conta da “desorganização”. Segundo ele, no turno da manhã, as provas foram interrompidas. “Vi muita gente entrar depois do horário previsto no edital, que era às 8h. A prova começou com atraso e, depois de 12 minutos resolvendo as questões, fomos avisados para parar. As pessoas começaram a conversar e trocar informações. Era possível escutar o barulho nas outras salas também. Alguns candidatos continuaram fazendo a avaliação, descumprindo a ordem recebida, mas o fiscal não tomou nenhuma atitude. Percebi que ele estava despreparado, pois quando falei para colocar na ata do concurso sobre a conversa entre os participantes, ele parecia não saber do que se tratava.”

Problema ocorreu em outros municípios

A insatisfação dos candidatos com a organização do concurso da SEE não foi restrita a Juiz de Fora, onde 7.074 pessoas se inscreveram para disputar 142 vagas para professor da educação básica (PEB) e seis para especialista em educação básica (EEB). Em outros municípios do estado também foram relatados vários problemas. Em Montes Claros, no Norte do estado, a Polícia Militar teria sido acionada por conta de um sumiço de 26 provas.

A candidata Camila Alcântara, que prestou concurso em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, afirmou que naquele município também houve atraso. “Cheguei ao local de prova às 7h15, e, só depois de muito tempo, informaram que a aplicação não seria mais às 8h e sim às 9h. Ainda houve diferença no horário de início das provas entre as salas. Os candidatos que estavam nos primeiros andares da escola começaram o exame bem mais cedo do que aqueles que prestaram o concurso nos últimos andares. Os fiscais estavam muito despreparados e não sabiam dar orientações simples como, por exemplo, se era preciso recolher o celular.”

Segundo outro candidato, o atraso também aconteceu em Varginha, no Sul do estado, onde foram relatadas situações de interrupção de prova e uso de celulares pelos candidatos. Nas redes sociais, outras falhas foram apontadas num grupo de concurseiros. Os participantes afirmam que, em Guanhães, na região do Vale do Rio Doce, faltaram provas, e os fiscais teriam recolhido as avaliações para xerocá-las.

Sindicato sugere atuação de grupo contrário à seleção

O Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG) emitiu nota cobrando explicações do Governo de Estado e a investigação das práticas irregulares citadas pelos candidatos. “A realização do concurso público para cargos da educação foi uma importante conquista da categoria”, ressaltou em nota. “Embora o edital não tenha contemplado todos os cargos e carreiras, quase 17 mil vagas foram disponibilizadas. O cronograma foi feito dentro do limite do calendário eleitoral para a homologação ainda no primeiro semestre de 2018.”

O sindicato sugere a possibilidade de que um grupo tenha tentado prejudicar a realização do certame. “Ao acompanharmos as notícias sobre aplicação de provas, além dos atrasos, nos deparamos, em algumas regiões do estado, com práticas que sugerem um movimento organizado para desmoralizar o concurso. Pessoas fizeram filmagens dentro das salas e fotografias de gabaritos, pacotes de provas, listas de presença, questões de provas e utilização de celulares para posterior divulgação. Na sequência, começou a circular uma orientação de um grupo que assina “SISDEMG” pedindo que as pessoas enviassem os relatos. Este grupo é contra o concurso público e, há muito tempo, defende a efetivação e o contrato de cinco anos sem concurso público.”

O texto diz, ainda, que “a empresa contratada tem vasta experiência nesta área, o que nos causou ainda mais espanto diante dos relatos que recebemos ao longo do dia. Várias imagens divulgadas sugerem que foram feitas por pessoas que trabalharam na aplicação das provas, a serviço da empresa responsável pelo concurso. A permissão de utilização de telefones celulares e outras práticas dentro das salas e nas dependências dos locais de prova sugerem que não houve a correta fiscalização por quem tinha o dever de fiscalizar”. O Sind-UTE/MG também apresenta a possibilidade de que o atraso para a realização das provas pode ter sido provocado, já que a demora em uma cidade força o mesmo nas demais.

“O Sind-UTE/MG solicitará que o Governo do Estado preste explicações e investigue as práticas relatadas para que os responsáveis sejam responsabilizados pelos atos criminosos e que as pessoas que fizeram inscrição para o concurso não fiquem prejudicadas. O Sindicato reitera que as práticas identificadas sugerem a existência um movimento organizado contra o concurso.”

A orientação da regional do Sind/UTE em Juiz de Fora é para que os candidatos que identificaram falhas no certame registrem o boletim de ocorrência junto à Polícia Militar. A entidade não informou o número de reclamações formalizadas na cidade.

Organização reconhece falhas

A Tribuna tentou contato com a Fundação Mariana Resende Costa (Fumarc), organizadora do concurso, mas os telefones disponíveis no site não atenderam. Na página da empresa havia um comunicado emitido às 12h25 do domingo (8), poucos minutos antes do previsto para a abertura dos portões para a aplicação das provas da tarde, informando sobre o atraso de uma hora na realização do concurso. O texto justificava que a alteração era necessária para que os candidatos que se inscreveram em ambos os cargos pudessem participar das seleções, já que também havia ocorrido atraso no período da manhã.

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Em nota, a assessoria da Secretaria de Estado de Educação (SEE) informou que “a empresa contratada para realizar o concurso relatou que houve problemas com entrega de listagens de candidatos em quatro locais de prova em Belo Horizonte. Por causa disso, a empresa decidiu adiar em uma hora o início das provas em todos os locais nos quais elas seriam aplicadas, tanto na parte da manhã quanto na parte da tarde”.

O texto também afirma que no final da tarde de domingo, a SEE “tomou conhecimento de denúncias que circulavam em redes sociais quanto ao uso de celulares em ambiente de provas, além de fotos de supostas provas, e acionou imediatamente a Fumarc para apuração, e aguarda uma posição da empresa”. À Tribuna, a secretaria encaminhou a nota recebida pela organizadora. “A Fundação Mariana Resende Costa (Fumarc) esclarece que o concurso da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, realizado no dia 8 de abril, enfrentou um problema de logística, o que causou o prolongamento do horário de início das provas em 60 minutos.” O problemas, segundo a empresa, teria ocorrido no material de apoio aos fiscais, com a lista de presença dos candidatos, que seria destinado a quatro escolas de Belo Horizonte.

“(o material) Foi embarcado em veículo da Fumarc com outra rota de distribuição. Com isso, o veículo teve que retornar ao ponto de origem para a destinação correta do material de apoio. Para garantir aos candidatos as mesmas condições na realização das provas, o início do concurso, em todas as regiões, ocorreu quando as quatro escolas receberam o material. Também com o objetivo de respeitar o intervalo entre as provas da manhã e tarde, considerando que muitos candidatos participariam dos dois concursos, o início das provas, neste segundo turno, também foi prolongado.”

Segundo o texto, a Fumarc, com 40 anos de experiência na realização de concursos públicos e privados, está apurando os fatos envolvendo este concurso.

Concurso
O concurso oferece um total de 16.700 oportunidades, sendo 16 mil para professor e 700 para especialista, que serão distribuídas para as 47 Superintendências Regionais de Ensino (SREs). Em todo o estado, foram 178.489 inscritos. A remuneração inicial é de R$ 2.135,64 para ambos os cargos. Segundo dados da assessoria da SEE, somente para a regional Juiz de Fora, que engloba também outros 29 municípios vizinhos, foram recebidas 8.439 inscrições. O número de vagas é de 302, sendo 290 para docentes e 12 para especialistas.

As provas realizadas no último domingo consistem na primeira etapa do concurso e estavam marcadas para dois turnos. No período da manhã, com início às 8h, para os candidatos ao cargo de professor. Já os concorrentes ao cargo de especialista fariam a avaliação na parte da tarde, às 14h. A segunda fase do concurso será realizada por meio de avaliação de títulos.

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