Juiz de Fora passa a ter viagem de moto por aplicativo

Uber Moto está em atividade na cidade desde a última segunda-feira e divide opiniões acerca da segurança de parceiros e usuários


Por Renato Salles

08/02/2022 às 20h18- Atualizada 08/02/2022 às 20h35

Desde a última segunda-feira (7), a empresa Uber já opera na cidade com um novo serviço de transporte individual de passageiros por motocicletas, o Uber Moto. Segundo a empresa, a atividade contará com os recursos já disponíveis para o transporte individual por carros. Os entregadores parceiros que usam motocicleta, já cadastrados no Uber Eats, podem optar por também fazer o transporte de passageiros. O serviço provocou polêmicas em outras cidades como Belo Horizonte, onde o mototáxi é proibido. Em Juiz de Fora, o Município não possui uma regulamentação específica sobre o tema. A reportagem procurou a Secretaria de Mobilidade Urbana da Prefeitura para comentar sobre a regularidade do serviço, mas, até o fechamento desta edição, não obteve respostas.

Para o novo serviço, a empresa reforça que os recursos de segurança adotados para o transporte individual de passageiros por carros estão mantidos. A plataforma alega ainda que o serviço funciona de forma complementar a outros modais de transporte, inclusive os coletivos. “As viagens de moto que são feitas pelo aplicativo da Uber têm tido como uso constante os deslocamentos de última milha, o chamado ‘last mile’, interligando os usuários da plataforma a modais de transporte, como as estações de ônibus, trens e metrô das cidades. Temos visto que esse é um tipo de uso muito pertinente para as viagens de moto, já que, muitas vezes, o trecho pode ser cansativo para ir a pé e curto para uma viagem de carro”, afirma Silvia Penna, diretora-geral da Uber no Brasil.

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Em simulações feitas pela Tribuna na tarde desta terça-feira, de pontos diversos e para endereços centrais da cidade, a diferença de preço para um mesmo trecho varia entre 24% e 51% entre o Uber Moto e o UberX, sendo a alternativa de moto mais barata

A empresa afirma ainda que está aberta a novos parceiros. “Para se cadastrar no aplicativo da Uber e dirigir na nova modalidade, o motociclista precisa ter CNH com observação de atividade remunerada (EAR)”, diz a empresa. Assim, a plataforma afirma estar diversificando as oportunidades de renda dos motociclistas parceiros.

Comissão de Urbanismo da Câmara trata tema com ‘cautela e preocupação’

Presidente da Comissão de Urbanismo, Transporte, Trânsito, Meio Ambiente e Acessibilidade, o vereador Zé Márcio Garotinho (PV) afirmou que o colegiado recebeu a informação do início dos serviços da Uber Moto “com cautela e preocupação”. Segundo ele, alguns pontos preocupam, sendo o principal a segurança daqueles que usam os serviços individuais de transporte por aplicativo. Neste caso, o entendimento é de que o modal motocicleta expõe seus usuários a “maior risco”.

O vereador disse ainda que a comissão deve avaliar possíveis questionamentos. Inicialmente, há o entendimento de que a prestação de serviço pode ser irregular, uma vez que o serviço remunerado de transporte de passageiros por motos não é regulamentado na cidade.

Proibição?
Para isto, também é considerada lei municipal de 2019, oriunda de um projeto de lei do vereador Vagner Oliveira (PSB), que alterou uma legislação de 1999 e proibiu, “terminantemente, a exploração do serviço de transporte de passageiros no território do Município de Juiz de Fora, por ônibus, micro-ônibus e por veículos dos tipos kombi, bestas, topics, vans ou similares, bem como qualquer tipo de veículo, sem credenciamento e autorização da Secretaria de Transporte de Juiz de Fora”.

Especialista teme riscos de acidentes

Mestre em engenharia de transportes, José Luiz Britto Bastos também alerta para riscos e considera que as motocicletas sequer deveriam transportar caronas. “A não ser que fosse com o uso do side car. Podemos observar que as motos mais antigas eram fabricadas com um banco só. A motocicleta é de longe o veículo mais perigoso que existe no trânsito. Não existe outro pior que a motocicleta”, afirma. Britto ainda lembrou o alto número de acidentes envolvendo motos. “A quantidade de acidentados nesse país é impressionante. A moto tem esse problema”, ressalta, lembrando que é comum práticas como o tráfego nos corredores e até em velocidade acima da permitida.

Os números de acidentes envolvendo motocicletas, de fato, chamam a atenção. Mesmo em meio ao período mais difícil da pandemia, marcado por restrições em diversas atividades, pesquisa da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) com base em dados oficiais do Ministério da Saúde mostrou que, entre março de 2020 e julho de 2021, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou um total de 308 mil internações de pessoas em decorrência de sinistros de trânsito em todo o Brasil. Dentre as vítimas dos chamados “acidentes de transporte”, qualificação usada pelas autoridades sanitárias, mais da metade, 54%, eram motociclistas.

Considerado apenas o período de janeiro a julho de 2021, o número de internações de motociclistas bateu recorde histórico, alcançando 71.344 casos graves e que exigiram a hospitalização do motociclista.

Viagens contam com seguro de acidentes pessoais

Segundo a Uber, as viagens de Uber Moto contarão com recursos de segurança oferecidos pela plataforma em todas as viagens, como seguro para acidentes pessoais, tanto para usuários quanto para parceiros, além de checagem de antecedentes dos parceiros e a possibilidade de o usuário compartilhar com seus contatos a placa, a identificação do condutor e sua localização no mapa, em tempo real.

“Assim como os entregadores parceiros do Uber Eats, condutores do Uber Moto receberão conteúdo educacional sobre segurança viária, estimulando a direção segura e o respeito às leis de trânsito. Todos os parceiros da Uber também passam por uma checagem de identidade via selfie, e, desde o começo da pandemia, uma selfie adicional verifica o uso de máscara”, afirma a empresa.

Preço pode ser até 51% mais barato que serviço prestado por carros

Segundo a Uber, a nova modalidade permite ao usuário “se deslocar de motocicleta por um preço menor do que o do UberX”, que é o serviço prestado em carros. Em nove simulações feitas pela Tribuna na tarde desta terça-feira, de pontos diversos e para endereços centrais da cidade, a diferença de preço para um mesmo trecho entre o Uber Moto e o UberX apontou que o serviço prestado em motocicletas pode custar entre 24% e 51% a menos.

Juiz de Fora integrou uma segunda etapa de implementação do Uber Moto em cidades brasileiras. O avanço aconteceu nesta segunda-feira, quando o serviço chegou a mais 38 municípios. Em Minas, também passam a contar com a oferta de transporte individual por motocicletas na plataforma as cidades de Governador Valadares e Ipatinga. “A modalidade desembarcou no país em novembro de 2020 por Aracaju e já está presente em outros 45 municípios brasileiros.” Assim, o serviço já é disponibilizado em 83 cidades.

Câmara chegou a discutir proibição em 2017, mas proposta foi arquivada

Sem a existência de uma regulamentação para a prestação de serviço de mototáxi em Juiz de Fora, a Câmara Municipal chegou a discutir, em 2017, um projeto de lei que pretendia proibir na cidade “uso de mototáxi cadastrados em aplicativos para o transporte remunerado individual de pessoas”. A proposta foi apresentada em 2016 pelo ex-vereador José Fiorilo.

O texto chegou a figurar na pauta de votação da Câmara em seis oportunidades entre março e abril de 2017, mas teve a discussão de seu mérito sempre adiada. Depois, acabou retirada de tramitação temporariamente pelo próprio José Fiorilo ainda em abril de 2017 e acabou arquivada definitivamente ao fim de 2020, ao fim do mandato do ex-vereador, que não conseguiu a reeleição.

Para plataforma, atividade não pode ser considerada como ‘mototáxi’

Em contato com a reportagem, a Uber descartou as interpretações de que os serviços de transporte individual por motocicletas oferecidos pelo aplicativo possam ser considerados como “mototáxi”. “A Uber desenvolve um aplicativo que conecta parceiros que dirigem os próprios veículos a usuários que desejam se movimentar pelas cidades, em acordo aos termos de uso da plataforma. Na modalidade Moto, parceiros contratam o aplicativo para realizar transporte privado individual em motocicletas, atividade prevista na Política Nacional de Mobilidade Urbana e distinta de categorias de transporte público individual em motocicletas, como o mototáxi”, diz a plataforma.

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Citada pela Uber, a Política Nacional de Mobilidade Urbana integra a Lei Federal 12.587 de 3 de janeiro de 2012. Conforme alteração feita em 2018, o transporte remunerado privado individual de passageiros é definido como o “serviço remunerado de transporte de passageiros, não aberto ao público, para a realização de viagens individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede”. A legislação em questão diz ainda que “compete exclusivamente aos municípios e ao Distrito Federal regulamentar e fiscalizar o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros” e define exigências para os motoristas nos casos em que a atividade não for regulamentada pelos municípios.

Aos olhos da empresa, “a norma federal que regulamenta o transporte individual privado de passageiros – e que estabelece os limites para a regulamentação pelos municípios – não faz distinção quanto ao tipo de veículo”. “É comum que a atividade seja desempenhada com automóveis, mas isso não significa que este seja o único modal permitido”, diz a plataforma em nota encaminhada à reportagem.

Associação espera que novidade não prejudique motoristas por aplicativo

A chegada de um novo serviço de transporte individual de passageiros por aplicativo na cidade deixa vários setores em alerta. Presidente da Frente de Apoio ao Motorista Autônomo da Zona da Mata (Fama-ZM), Sóstenes Josué conversou com a reportagem e afirmou que “não esperava que (o Uber Moto) fosse chegar tão rápido à cidade”. Ainda assim, sua expectativa inicial é de que a novidade não traga maiores impactos para os motoristas que já atuam na prestação do serviço por meio das plataformas digitais.

“Verificamos o impacto em outras cidades, principalmente em Belo Horizonte, onde o serviço já está funcionando desde o final do ano passado. Recebi informações prévias de que o impacto gerado por lá não foi muito grande. Na verdade, por moto, a Uber estaria fazendo mais o transporte de pequenos objetos e não de pessoas. Para nós, motoristas de aplicativo, isso não gera grandes impactos. A gente espera que isso se repita aqui também”, avalia Sóstenes.

Contudo, a categoria permanece atenta, uma vez que os impactos nos serviços oferecidos por motoristas variam conforme as características de cada cidade. Neste caso, Sóstenes citou especificamente o caso de Aracaju, capital do Sergipe, onde, segundo ele, já existia a cultura do mototáxi. “O relato que eu tive foi que lá, infelizmente, houve impactos para os motoristas de aplicativo.” O presidente da entidade que atua na representação dos motoristas autônomos afirmou que a categoria, inclusive, já analisou a situação jurídica que cerca a chegada do novo serviço.

“Fiz um estudo com o setor jurídico da Fama-ZM. Em Juiz de Fora, não existe legislação alguma que possa impedir a entrada do Uber Motos. Estamos analisando a possibilidade de sugerir alguma coisa na regulamentação que vem sendo discutida no Município e da qual participamos de uma mesa de debate montada pela Prefeitura. Na questão da legalidade, infelizmente não tem nada que se possa fazer. Na questão do impacto ao motorista, a gente espera que não traga impacto para uma categoria tão sofrida, que já vem passando por sérios problemas, principalmente com os aumentos sucessivos dos combustíveis”, resumiu.

Preocupação com a pandemia; empresa recomenda uso de capacetes próprios

Presidente da Frente de Apoio ao Motorista Autônomo da Zona da Mata (Fama-ZM), Sóstenes Josué também demonstra preocupação com a higienização de capacetes no novo serviço oferecido pela Uber. “Será que a plataforma Uber vai fornecer algum material para que os passageiros possam higienizar? Pedimos ao Poder Público para nos ajudar neste controle, caso contrário, pode ser um canal para a proliferação do coronavírus”, afirmou em entrevista à Tribuna.

Por sua vez, a Uber afirma que possui um protocolo específico de prevenção ao coronavírus, com a recomendação de que os usuários deem preferência a capacetes próprios. “Entre as recomendações que serão informadas aos usuários e parceiros estão a limpeza de mãos e superfícies da moto com álcool em gel, que os usuários levem seus próprios capacetes, ou que capacetes extras sejam higienizados com produtos específicos e usados com toucas higiênicas – que podem ser fornecidas pelos condutores e reembolsadas pela Uber”, afirma a empresa.

Mais segurança
Para além da pandemia, o representante dos motoristas autônomos que prestam serviço de transporte individual de passageiros por aplicativos em Juiz de Fora pediu ao Município uma maior atenção com relação à segurança nas vias públicas de Juiz de Fora. “A gente espera que as autoridades municipais, como a Prefeitura e a Câmara, possam fazer algo para trazer segurança a esses profissionais da motocicleta, que, infelizmente, também sofrem muito com a insegurança das nossas rodovias, com muitos buracos. Eu já cansei de ver acidentes com moto nas ruas de Juiz de Fora por conta dos buracos. Espero que a gente possa avançar em leis para trazer, minimamente, segurança para esses profissionais. A Fama está aberta para estar ao lado desses profissionais na luta por melhorias em suas condições de trabalho”, afirmou Sóstenes.

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