Mulheres representam 33% das candidaturas por JF
Para especialista, número reflete atuação de ações afirmativas que buscam maior participação de mulheres na política, mas não diz nada a respeito do sucesso eleitoral dessas candidatas
Nas eleições de 2022, o número de candidaturas femininas em todo o país disputando cadeiras nas esferas federal, estadual e distrital bateu recorde com 33,8% de representantes. Em Juiz de Fora não foi diferente. Das 74 candidaturas a deputado estadual e federal com domicílio eleitoral na cidade, 25 são de mulheres, o que representa também aproximadamente 33,8%. Os números fazem parte de um levantamento realizado pela Tribuna com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Embora haja aumento, a representatividade ainda é baixa em relação às candidaturas masculinas e, principalmente, quando olhamos para o número de cargos políticos ocupados por mulheres.
Para a professora de ciência política da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Christiane Jalles de Paula, a proporção de mulheres candidatas em Juiz de Fora deixa claro a importância das cotas, porém, não diz nada a respeito das chances de sucesso eleitoral dessas candidatas. Atualmente, a legislação determina que pelo menos 30% das vagas dos partidos políticos devem ser preenchidas por mulheres. As cotas eleitorais de gênero garantem o percentual mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. No entanto, a ação afirmativa é para preenchimento de candidaturas e não de vagas, ou seja, isso não significa que serão 30% de mulheres eleitas. “De modo geral, as cotas ampliaram a presença de candidatas, embora ainda permaneçam os obstáculos partidários para que elas sejam competitivas e, portanto, eleitas”, aponta.
No total, Juiz de Fora tem 39 candidatos ao cargo de deputado estadual; destes, 12 são mulheres. No que diz respeito à autodeclaração de cor e raça, entre as candidatas, oito se autodeclararam brancas, três pretas e uma parda. Já na disputa pela vaga de deputado federal, 35 pessoas se candidataram pelo município, e o número de representantes mulheres é 13, sendo sete brancas, quatro pretas e duas pardas. “A sub-representação de pretos e pardos, ainda que timidamente tenha aumentando, mostra que são essenciais a adoção de incentivos seletivos para que tenhamos uma representação mais plural nos poderes do Brasil, com maior participação das minorias políticas”, afirma Christiane.
Distribuição desigual do financiamento de campanha
A cientista política analisa que a sub-representação de mulheres é anterior à eleição. “Os estudos indicam que as estruturas partidárias (especialmente os cargos de direção dos partidos) são pouco acessíveis às mulheres.” Entre as questões que dificultam uma maior presença de mulheres na política está o financiamento de campanhas. “As regras internas dos partidos para distribuir os recursos para seus candidatos são variadas, mas, de modo geral, as mulheres recebem um quinhão muito menor de recursos”, explica Christiane.
Em abril de 2022, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional 117, que obriga os partidos políticos a destinar no mínimo 30% dos recursos públicos para campanha eleitoral às candidaturas femininas como medida de regularização do financiamento para evitar fraudes. A distribuição deve ser proporcional ao número de candidatas. Porém, até o momento, essa emenda não tem sido colocada em prática. De acordo com os dados informados pelas campanhas ao TSE, candidatos homens gastaram cerca de 88% a mais em suas campanhas eleitorais que as candidatas.
Neste quesito, Juiz de Fora se distancia do cenário nacional. Para se ter uma ideia, os candidatos locais já levantaram juntos R$ 19 milhões de receitas de campanha. Os candidatos a deputado federal foram os que mais arrecadaram, somando R$ 13,7 milhões. Dentre os 35 nomes que têm domicílio eleitoral na cidade, 31 declararam receitas de campanha, e os recursos a que as mulheres tiveram acesso correspondem a 33,9% do total levantado. Em número exatos, de R$ 13,7 milhões arrecadados, R$ 4,6 milhões foram arrecadados por campanhas de mulheres. Os dados foram atualizados pela reportagem no último domingo (25). Vale ressaltar que a maior parte destes valores vêm de recursos públicos por meio do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário.
“Sem poder de decisão nas instâncias partidárias e sem dinheiro para viabilizar a candidatura, a mulher que se lança na política tem algumas rotas, como a herança familiar – casos em que a política é uma atividade na família -, militância em sindicatos, associações, igrejas, que permitem um nicho eleitoral, para aumentar as suas chances eleitorais”, observa Christiane.
Violência política de gênero dificulta presença feminina
Apesar de as mulheres representarem mais da metade da população brasileira (51,13%), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e serem 53% do eleitorado do país, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, menos de 15% dos cargos eletivos são ocupados por elas. Um dos principais fatores que afetam a maior participação delas na política, aumentando os obstáculos para permanecerem nos cargos após eleitas, é a violência política de gênero.
Conforme explica a cientista política, a degradação do ambiente democrático vem acontecendo desde 2010 e impacta no crescimento de casos de violência política que historicamente tem números muito altos no país. “Em relação à violência política de gênero, o efeito perverso da maior presença das mulheres na política é que múltiplas formas de violência têm sido praticadas contra as representantes políticas seja por meio das palavras, seja por meio de ações como ameaças e assassinato”, evidencia Christiane, que acredita que as soluções punitivas já existentes não são eficazes sozinhas. “É preciso educação política e de cidadania para constituirmos uma nova cultura política no país, que seja efetivamente democrática.”
A eleição de 2022 será a primeira com uma lei sobre violência política de gênero em vigor. No ano passado foi aprovada a lei 14.192 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14192.htm), que determina crime eleitoral assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar uma candidata, com menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou ainda à sua cor, raça ou etnia com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo. A pena é de um a quatro anos de prisão e multa. Caso a violência aconteça pela internet e em redes sociais, a punição pode chegar a até seis anos.
Para denunciar casos de violência política de gênero, o Tribunal Superior Eleitoral disponibilizou dois canais: a Ouvidoria da Mulher e o Sistema de Alerta de Desinformação, além do Ministério Público Eleitoral de cada estado.