O que aconteceria se… ‘What if…?’ aproveitasse todo seu potencial?

Por Júlio Black

20/10/2021 às 07h00 - Atualizada 19/10/2021 às 14h17

Oi, gente.

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A turma que lê os quadrinhos da Marvel desde os anos 80 com certeza se lembra da série “O que aconteceria se…?”. Lançada em 1977 nos Estados Unidos e publicada por aqui nos formatinhos da Editora Abril na década seguinte, “What if…?” (título em inglês) tinha como proposta mostrar versões alternativas para alguns dos momentos mais importantes do Universo Marvel. Eram histórias que mostravam, por exemplo, o que aconteceria se o Wolverine matasse o Hulk, se a Fênix não tivesse morrido, o Capitão América presidente dos Estados Unidos, se Conan fosse transportado para os anos 70, se o Demolidor matasse o Rei do Crime ou os Novos X-Men morressem em sua primeira missão. Havia também uns “What if…?” bestas, do tipo “O que aconteceria se o Fera realmente se tornasse uma fera?”.

Porém, apesar de vários grandes nomes terem passado pelo título (Roy Thomas, John Buscema, Marc Silvestri, Carmine Infantino, John Byrne, Kurt Busiek) e algumas histórias (Jane Foster como Thor) tenham sido posteriormente adaptadas para o cânone da chamada Terra-616, a maioria das tramas ficava no terreno das boas ideias que viravam uma porcaria no papel. Uma das poucas exceções foi o “O que aconteceria se o Mercenário não tivesse matado Elektra?”, escrita e desenhada por Frank Miller. Quem procurar por “What if…?” no Marvel Database vai encontrar a ficha técnica de todas as edições.

Enfim, toda essa enrolação foi necessária para justificar nosso misto de alegria e desconfiança quando o Marvel Studios anunciou, em 2018, que a primeira animação do MCU (Universo Cinematográfico Marvel) seria justamente “What if…?”, que apresentaria – assim como nas HQs – realidades alternativas ao que acompanhamos no cinema desde o primeiro “Homem de Ferro”, em 2008.

Com a primeira temporada exibida no Disney+, podemos afirmar que o projeto tem muitas qualidades, e entre elas está a qualidade da animação nas cenas de batalha e ação. Porém, ela repete alguns dos defeitos dos quadrinhos, principalmente quando o assunto é levar as infinitas possibilidades das realidades alternativas para a TV – e um dos motivos é que a série, anunciada como uma antologia de episódios fechados em si, na verdade era uma trama com todas as histórias interligadas. Por isso, ficamos com a impressão/certeza de que esses multiversos conectados poderiam ser melhor explorados se as suas premissas fossem totalmente independentes.

Dos nove episódios da primeira temporada (seriam dez, mas um não ficou pronto a tempo por causa da pandemia), três estão acima da média. O melhor deles tem o Doutor Estranho como protagonista: incapaz de lidar com a dor da morte da razão de seu afeto, Stephen Strange é corrompido a ponto de provocar uma tragédia de dimensões universais. Em seguida temos a história que mostra o que aconteceria se T’Challa, o Pantera Negra, se tornasse o Senhor das Estrelas no lugar de Peter Quill. É uma trama leve e divertida, bem diferente do estilo “todo mundo morre” que havia nas HQs, e que ainda dá aquele aperto no coração por ser o último trabalho de Chadwick Boseman para o Marvel Studios. O pódio é completado pelo episódio em que Peggy Carter recebe o soro do supersoldado no lugar de Steve Rogers; mesmo que seja quase um “copia e cola” do primeiro filme do Capitão América, é uma história bem redondinha.

Alguns episódios, por outro lado, lembram as HQs no que tinham de pior: ótima premissa, mas péssima execução. Um deles é o que mostra o que aconteceria se todos os futuros Vingadores (menos o Capitão América) fossem mortos antes da formação da equipe. A história tinha tudo para ser um ótimo thriller de suspense, mas o roteiro – além de preguiçoso em sua resolução – é tão apressado em mostrar tantos eventos em meia hora que ninguém tem tempo de se importar com os personagens quando eles morrem.

A trama que mostra o que aconteceria se Killmonger salvasse Tony Stark do ataque visto em “Homem de Ferro” sofre do mesmo problema. Morre gente a cada três minutos e parece que ninguém se importa com isso, o negócio é acelerar a história para mostrar qual a próxima artimanha do vilão para conquistar Wakanda. Esses dois competem fortemente com a trama dos Zumbis Marvel na categoria “pior episódio da temporada”.

Outro concorrente de peso é o season finale, em que o Vigia reúne os “Guardiões do Multiverso” para enfrentarem Ultron depois do vilão robótico ter derrotado os Vingadores no (bom) episódio anterior e conseguir todas as Joias do Infinito, que permitiram a ele descobrir a existência do Vigia e do Multiverso.

Quanto ao episódio do Thor badernista, odiado por uma turma considerável, ele não é lá grandes coisas, porém é tão bobo quanto divertido. A graça do negócio é colocar o Deus do Trovão como um personagem daquelas comédias dos anos 80 em que alguém dava uma festa de arromba e depois tinha que arrumar tudo antes da chegada dos pais. Comparações com “Curtindo a vida adoidado” também fazem sentido.

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Entre altos e baixos, o saldo de “What if…?” ainda é positivo, quem der nota 7 para a série não pode ser chamado de marvete safado. Todavia, o Marvel Studios precisa corrigir os deslizes que acompanhamos neste primeiro ano, principalmente o desenvolvimento de roteiro. Dessa forma, dá para aproveitar todo o potencial do Multiverso e suas realidades alternativas – incluindo aí transformar os X-Men num time de basquete.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

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Júlio Black

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