Gilmara Rocha, candidata a Miss Bariátrica, e sua reescrita de si

Ela pesava 123kg, estava adoecida e insatisfeita. Nove meses depois, Gilmara mudou de ofício, emagreceu e é uma das candidatas do concurso Miss Bariátrica


Por Mauro Morais

17/06/2018 às 07h00

Aos 36 anos, Gilmara mudou de vida e espera servir de exemplo para outras mulheres: “A gente tem medo de olhar para dentro de nós, mas é aí que estão as respostas para nossas perguntas” (Foto: Marcelo Ribeiro)

Trinta e oito quilos é muito peso. Era um segundo corpo que Gilmara Delgado Rocha carregava consigo quando, em 7 de setembro de 2016 a filha atirou seu celular no chão e gritou pedindo atenção. Queria estar tão próxima da mãe quanto aquele aparelho e as pessoas que por ele se comunicavam com Gilmara. “Aquilo doeu no fundo do meu peito. Eu estava com 123kg, tinha fibromialgia, depressão, gordura no fígado, pressão alta e muitos outros problemas decorrentes da obesidade. Nunca fui magra, mas nunca extrapolei tanto. Naquele momento vi o que estava fazendo com a minha vida e com a minha filha. Eu vivia para agradar outras pessoas e me esquecia de mim mesma”, conta a mulher, hoje aos 36 anos. “Naquele dia escrevi uma carta com tudo o que eu não queria mais para a minha vida”, recorda-se ela, que chegou a pensar em colocar um ponto final em tudo, mas preferiu reescrever a própria história.

“Por oito anos fui concursada na Cesama, para agradar meu avô. Saí de lá e fui agradar meu marido, abrindo uma pizzaria. Para os meus sonhos: nada. Já tinha feito graduação em administração e pós em gestão de pessoas. Fazia uma consultoria ou outra, mas não era o meu foco”, lembra a mulher, que de estagiária tornou-se efetiva na companhia, após passar em concurso e acabou abandonando para seguir a carreira de empresária. “Eu tinha duas pizzarias e uma lan house. Fiquei cinco anos sozinha, tomando conta de tudo, para o meu marido fazer a faculdade de engenharia”, diz ela, nascida em Lima Duarte e criada em Juiz de Fora, no Manoel Honório, de onde saiu há cerca de dois anos, para morar numa espaçosa casa no Aeroporto. O choro da filha serviu-lhe como um alarme e um pontapé. O peso transformou-se em leveza.

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Gilmara é casada há dez anos e mãe de Maria Fernanda, de 5 anos. (Foto: Marcelo Ribeiro)

Novo texto

“Quebrei e reergui. Cheguei ao extremo e emagreci. Tive dificuldades no meu relacionamento e superei. Tive problemas familiares, achava que era mãe de todo mundo, e encontrei meu papel. Sofri um abuso aos 13 anos e me refiz”, enumera Gilmara, que por anos teve seu desejo pela cirurgia bariátrica reprovado pela psicóloga. Era preciso internalizar a decisão de emagrecer. Em 2016 ela estava absolutamente pronta e disposta a iniciar um processo que a levou não apenas a perder peso, mas, em suas palavras, a se empoderar. “Meu marido não aceitava fechar a outra loja, sendo que fechávamos no negativo todo mês. E para administrar um negócio é preciso agir com inteligência. No nosso negócio havia emoção demais. Quando decidi cuidar da minha saúde, ele aceitou. Ou eu cuidava da minha saúde, ou eu morria. Também falei para ele que iria ficar seis meses estudando para trabalhar com coach para mulher, para mostrar para elas que podemos ser o que quisermos”, orgulha-se. “Ano passado, quando estava de repouso após a cirurgia, vi uma reportagem no programa ‘Encontro com Fátima’ da mulher que tinha ganhado o concurso Miss Bariátrica 2017. Pensei, então, que se eu emagrecesse poderia participar do concurso e trazê-lo para a Zona da Mata, para empoderar ainda mais mulheres. Teve uma madrugada que nem dormi pensando nisso”, lembra, aos risos, diante de uma nova realidade, na qual mantém apenas uma das duas pizzarias. “Hoje faturo mais com uma só loja do que somando as duas.”

Além de vencer o Miss Bariátrica, Gilmara pretende colocar em prática um projeto de seminário que rode o país com palestras para mulheres. (Foto: Marcelo Ribeiro)

Novo corpo

“O carente precisa suprir isso de alguma forma, seja com comida, bebida, drogas, exercícios, sexo ou qualquer outro vício. Eu era viciada em comer. Teve um dia em que discuti com o meu marido e comi, em cinco minutos, um prato que era para dois. Eu não tinha consciência de nada”, recorda Gilmara, casada desde os 26 com Fernando, de quem é namorada há 18 anos e com quem teve Maria Fernanda, de 5 anos. Engenheiro e consultor financeiro, o marido cuida da pizzaria hoje, mesmo tendo optado por fazer a cirurgia bariátrica também, dois meses após a mulher sair do hospital. “Eu mudei a minha mente. Hoje frequento a pizzaria e não como pizza. Se como, é uma fatia apenas”, assegura ela, que nos últimos nove meses perdeu 38kg. “Penso em pesar uns 65kg”, diz a dona de uma rotina que inclui malhação e uma dieta pouco restritiva. A própria mudança serviu-lhe, então, como cartão de visitas para a carreira como coach. “Sempre gostei de lidar com gente. Uma amiga antiga me falou essa semana: ‘Gilmara, esse trabalho que você faz hoje já fazia há muito tempo. Lembro de quando eu terminei com um namorado e você falava para mim que tudo passava, que era para eu me imaginar depois de 30 anos’. Tirei funcionários das drogas. Mas não sabia que era assim. Agora tenho a técnica e a história para servir de exemplo.”

Novo sentido

Do psiquiatra norte-americano considerado pai da hipnose moderna Milton Erickson, Gilmara tira o norte para seus dias: “No veneno está o antídoto”. Com os cursos de master coach e hipnose finalizados, passou a ajudar outras mulheres, como aquela com quem dividia o corpo. “Em março passado, mês das mulheres, fui convidada para fazer cinco palestras, uma delas para 500 mulheres em Ubá. Daí, explodiu”, conta, para logo chegar ao ambicioso projeto de seminário para rodar o país, dividido em dois dias e voltado para um público superlativo de mil mulheres por evento. “Criei o conceito da gaiola emocional: a mulher vive presa dentro dessa gaiola, sem confiança, tem medo do fracasso, medo do sucesso, medo da rejeição. Fora isso tem os problemas físicos, como a depressão, a fibromialgia, pressão alta, pensamentos suicidas”, explica, pegando duas pelúcias que lhe servem como cobaias: “Esse é o nosso consciente, o Self 1, que registra 5% do que acontece com você todo dia. Esse é o nosso inconsciente, o Self 2, que registra 95% do que acontece com você todo dia. Quem tem mais respostas para você? O inconsciente, não é mesmo?! Através de perguntas poderosas é possível descobrir as respostas desse inconsciente. Assim eu me conheço e me empodero. A psicologia e a psiquiatria tratam da saúde mental. Não posso tratar. Atuo em outro campo”, assinala. “A gente tem medo de olhar para dentro de nós, mas é aí que estão as respostas para nossas perguntas.”

Pelúcias: a Self 1 representa o consciente e a Self 2 representa o inconsciente.00 (Foto: Marcelo Ribeiro)

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