Me apaixonei de novo


Por Daniela Arbex

09/07/2017 às 06h00- Atualizada 10/07/2017 às 13h18

Depois de seis meses longe dessa coluna, retorno a esse espaço narrando uma experiência pessoal…

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Dia desses, fui surpreendida com uma orientação médica: precisava levar meu fillho de 6 anos para fazer exame de sangue. A notícia foi recebida lá em casa com uma boa dose de drama. Diego não queria saber de ser picado. Chorou muito. Prometeu “fugir de casa” se eu deixasse que fizessem com ele “tamanha maldade”. Aquilo foi um sofrimento. Tentei explicar que o exame era importante para sua saúde. Disse que não era tão doloroso quanto parecia e que ficaria tudo bem. Mas ele não quis saber de conversa. O jeito era falar a verdade: a decisão não dependia dele. Demonstrei firmeza, mas, por dentro, estava morrendo de pena de ver sua aflição. O medo é algo compreensível em qualquer pessoa. Conheço muito adulto que treme ao ver agulha. Eu mesma presenciei um pai levar o filho para a coleta e, na hora H, desabar diante dele e da seringa. Literalmente. Primeiro, o homem saiu correndo da sala. Estava branco. Depois, ele despencou da própria altura. Quando percebi, o caboclo de quase dois metros já estava no chão ensanguentado, após desmaiar no laboratório e bater a cabeça na quina da parede. O filho, tadinho, ficou lá, apavorado, enquanto o Samu rebocava o sujeito para o hospital. Quase pareceu engraçado, mas quem podia rir depois da notícia de que a vítima precisou levar 20 pontos na cabeça?

Quando o dia fatídico chegou, lá fomos nós. Meu marido acordou Diego e juntos tentamos distraí-lo no trajeto. Pouco adiantou. O pequeno estava nervoso demais com o exame. Logo que entramos no prédio, pegamos nossa senha e esperamos o momento de preencher a ficha. Quando nossa vez chegou, Diego foi chamado para colocar o dedo indicador sobre o equipamento que o credenciaria a usar o plano de saúde. Empolgado após ter a digital do dedo indicador escaneada, ele perguntou em voz alta:

– Mamãe, o exame já acabou?

Todos riram na sala de espera .

– Infelizmente, não, filho. Mas, no futuro, quem sabe, a gente vai tirar sangue assim?

Quando o nome dele foi chamado na recepção, Diego voltou a chorar.

Dentro da cabine, ele pediu calma. Avisou que não estava “preparado” para a agulhada. Dissemos que seria rápido e, que, ao final, ele receberia um honroso certificado de coragem. Ele não estava nem aí para o título. Queria salvar a própria pele. Magoado por ter sido pego à força, meu filho continuou a chorar. No caminho para o carro, avisou que iria vomitar. Dito e feito.

Seguimos na direção da padaria, onde faríamos um lanchinho depois de um jejum de 12 horas, mas nada fazia Diego parar de chorar. Já estávamos sentados olhando o cardápio, quando meu marido desapareceu do imóvel. Saiu tão rápido da mesa que nem consegui ver em qual direção ia. Dez minutos depois, ele voltou com um pacote nas mãos. Estava esbaforido. Entregou para o filho a embalagem de presente improvisada. Quando Diego abriu, fui eu quem ficou surpresa.

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Como Marco tinha conseguido achar um dos personagens preferidos do Diego em uma região cujo comércio para o público infantil era tão incipiente? Confesso que nunca fiquei tão feliz em ver o Bob Esponja Calça Quadrada, o personagem mais politicamente incorreto da TV. A série de animação que é febre entre a garotada e narra as aventuras vividas pelo personagem na subaquática Fenda do Biquíni é, na minha opinião, pouco educativa, apesar das quinze indicações ao Emmy Awards. Naquele instante, porém, não era hora de criticar o Bob Esponja. Diego abraçou aquela criatura amarela e nariguda como se quisesse contar a ela tudo que viveu minutos antes.

Já eu, olhei para o Marco agradecida por ser um pai tão presente, por sempre dividir comigo todas as tarefas da nossa casa, por conseguir ser uma presença capaz de nos acalmar mesmo nos momentos mais difíceis. Naquela hora, sentada à mesa da padaria, eu me apaixonei por ele de novo e me senti feliz por ter escolhido a pessoa certa para nossas vidas.

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