A medida da indignação


Por Wendell Guiducci

31/01/2017 às 07h00

No intervalo do crossfit, dois fortões conversam na academia.

– Você viu o Eike?

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– Vi. Esse país não tem jeito não. Esse shake seu aí é de morango?

– Morango com coco. Bom pa rai. Rapaz… dezesseis milhões só pro Cabral. Já pensou?

– Esse que é o problema do Brasil. Mas o cheiro desse shake seu é muito bom, cara.

– É importado. Um bróder meu tem um esquema em Miami. Traz uns shakes. E uns comprimidinhos. Mas se foi dezesseis só pro Cabral, você imagina onde mais ele botou dinheiro…

Eles viram uns pneus, sacodem umas cordas e retomam a conversa, catedráticos que são em matéria de corrupção, tanto ativa quanto passiva.

– O problema é a burrice desse povo. O cara não consegue tirar só cem mil. Tem que tirar logo milhões. Se ele tira cem mil, ninguém percebe. Obra de metrô? Tira cinquentão, oitentão. Obra de estádio? Tira cenzão… de grão em grão… Mas não, tem que meter logo milhões. Aí dá no que deu. Você me arruma um shake desse aí?

– Semana que vem ele chega com mais e eu trago pra você.

– Se seu bróder não ficar na alfândega…

– Ali não tem errada. Ele não é Cabral. Nem Eike.

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– Esses caras são uma vergonha.

– Eu fico indignado.

– Eu também.

E vão-se embora para o vestiário, indignados e convictos de que vergonha no Brasil não é roubar, mas roubar e não poder carregar.

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