Um país sério
Desde que eu era pequena, meu pai, sempre alfinetador dos acontecimentos do mundo e, principalmente, de nossa terrinha, repetia a história de um francês, que disse, em 1962, visitando nosso país, que “O Brasil não é um país sério”. Contava o causo sempre ilustrando alguma das muitas tramoias e falcatruas que sucedem por aqui, claro que adaptando mais ou menos o tom, de acordo com meu grau de percepção da vida, do mundo e de nosso complicado país tropical. De qualquer jeito, a frase sempre me traz a lembrança do humor ácido do meu velho, e quando me sentei para escrever esta coluna, não conseguia tirar o eco da cabeça: “O Brasil não é um país sério”.
Não que o fato em si seja lamentável. É reconfortante não se deixar sugar pela seriedade em alguns momentos. Tomar uma cerveja com gente querida e falar amenidades da vida em vez de discutir política, pra expurgar estes tempos difíceis, por exemplo, parece quase sempre uma opção sã. O problema neste impasse de ser sério ou não é a pretensão de sê-lo, mesmo quando não se encontra sequer rastro de seriedade.
É aquele amigo de Facebook não se contentar só em achar graça de meme político, mas crer que isso embasa, de fato, qualquer argumento mais elaborado que “temos que acabar com a corrupção”. Aquela tia, novata nas redes sociais, se apavorar quando um membro do Estado Islâmico diz que “o Brasil será o próximo”, mas compartilhar dizeres carregados de eugenia de uma página chamada “Bolsomito”. É a Justiça manter preso, há três anos, um homem que cometeu o hediondo crime de portar “Pinho Sol”, enquanto juízes e políticos corruptos ganham honrarias de heróis justiceiros de uma nação “perdida”.
Qual não foi a ironia do destino quando, pesquisando sobre a frase tão repetida pelo meu pai, soube que ela não é de Charles de Gaulle, mas do embaixador brasileiro Carlos Alves de Souza, dita em conversa informal do último com o francês, ao falar sobre a inabilidade da diplomacia brasileira (então nos idos dos 1960). Vejam só: o Brasil é tão pouco sério que nem a emblemática frase que versa sobre o assunto foi dita por quem a atribuem historicamente. É tão pouco sério que há muitos que aplaudem um processo de impeachment aprovado quase exclusivamente por políticos denunciados por – adivinhem – corrupção. E é quase risível este nosso país, quando pensamos que há quem creia piamente que “varrer” tal corrupção possa acontecer em cenário político com Temer como presidente e Eduardo Cunha (bate na madeira) como vice.
Certa da falta de seriedade dos tempos atuais, mas ainda estarrecida demais para achar graça, tenho esperança no futuro e na sabedoria popular: “Depois que passa, a gente ri.”