Diálogo com Moraes Moreira


Por Gabriel Ferreira Borges

15/04/2020 às 07h14- Atualizada 15/04/2020 às 07h39

Besta é tu, besta é tu. Besta é tu, besta é tu. Besta é tu, besta é tu. Besta é tu, besta é tu. Besta é tu, besta é tu. Por que não viver nesse mundo? Se não há outro mundo? Ah, Moraes Moreira, pois está rigorosamente difícil viver nesse mundo, como tu mesmo sabias. Tu mesmo dissestes que o Brasil não está somente descendo a ladeira na bola, no samba, na sola e no salto, mas, sim, está “pior que no tempo da ditadura”. E nos encontramos atônitos em um estado de sítio sem qualquer previsão de gozo. Perdão pela distorção ideológica, sabemos que, bem da verdade, é por uma causa nobre. Mas é que torcer e distorcer são imperativos nestas épocas. Lá vem o Brasil descendo a ladeira. E na banguela.

E pra ter outro mundo é preci… necessário viver contanto em qualquer coisa. Olha só, olha o sol. O Maraca domingo! E quando tu fostes pela última vez no Maracanã domingo, Moraes? Completamente tomado por rubro-negros? Mas de geraldinos e arquibaldos, daqueles saudosos do Galinho. Duvido que tenhas ido neste Maraca. Tu foste? Aposto que quase morreste de desgosto como flamenguista fanático que eras. Ao menos viveste em tempo de ver outro escrete rubro-negro pintando o 8, como Adílio, hein? Até o meu pai, louco com a geração de 1981 que o é, confessara pra mim esses dias. Ah, mas não é que o Gérson é bola que nem o Adílio, Moraes. Mas é tão rubro-negro tanto quanto. O prazer de vestir o Manto se mostrava nos seus pés, lembra? Conquistamos a nossa América do Sul tão combalida novamente. Fora tua última catarse em vida, não fora? E foi um português que tocou pandeiro pra gente sambar.

PUBLICIDADE

Mas eu estava pensando ainda ontem, Moraes… qual foi a última vez que encontrara o Galinho? O Zico estava desnorteado anteontem. Teu amigo, confessou que tua música fora das maiores homenagens musicais por ele recebidas. Ah, mas isso a torcida inteira do Flamengo sabia, não? Nenhum rubro-negro conseguiria contar tão bem a perda de Zico em 1983 como tu cantaras. De certa maneira, é como tenho me sentido. Agora como é que me vingo de todas as derrotas da vida se a cada gol do Flamengo me sentia um vencedor? Já vamos para mais de mês sem Flamengo no Maracanã. Se fico assim, imagina o povão, baiano? Mas o Galinho voltara por mais carinho e dengo, não é? O nosso Flamengo voltará. Mas sem você, Moraes? Disseram-me que deixaste composições inéditas. Ora, alguma delas é sobre a apoteose de Lima? Me diga! Não sei qual era a tua relação com este futebol industrializado, enrustido… aposto que, se pudesses, teria disputado uma pelada com Gabriel, Bruno Henrique e Éverton Ribeiro no Jacarepaguá.

Sabe, Moraes, sinto falta de alguém que cante futebol como Jorge Ben e tu faziam. Ah, claro que não é tão somente por serem rubro-negros como eu. Vai, como João Nogueira… ele também era rubro-negro, não é? Como Pixinguinha! Ou Demônios da Garoa! Lembrei! Samuel Rosa também, mas, sabe como é, queria um sambinha. Só para escutá-lo tomando umas e outras. É que o futebol está tão entranhado em nossa brasilidade que sinto que simplesmente pecamos em documentá-lo em nossa música popular, entende? Ah, Moraes, enfim, vamos um dia assim, um dia assado, no duro tinindo trincando mesmo. Ó, depois nos falamos. Deixei umas panelas no fogo.

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.