Complexos polinucleares com potencial contra o câncer são estudados na UFJF
Estudo possui parceria com pesquisador norte-americano, Nicholas Farrell
A batalha contra o câncer é árdua, envolvendo tanto o físico do paciente (além da doença, há os efeitos colaterais do tratamento invasivo necessário em muitos dos casos) quanto o emocional, com impactos na autoestima em vários níveis, em função da perda de cabelo e das mudanças na pele, por exemplo. Contudo, a ciência está evoluindo e a busca por novas formas de tratamento está acontecendo neste momento, inclusive em Juiz de Fora. O professor da UFJF Luiz Antônio Sodré Costa e dois discentes de pesquisa da Química: Frederico Henrique Ferreira (bolsista do CNPq) e Rivael Francisco da Silveira (bolsista da Capes) estão trabalhando no “Estudo teórico da avaliação da atividade anticâncer de complexos polinucleares de Pt (II)”.
Para compreender a pesquisa e sua inovação na ação contra o câncer é preciso elucidar sobre a doença e os tratamentos usados atualmente. O câncer pode ser definido como uma célula que teve alguma modificação grave no seu funcionamento e começou a agir de forma descontrolada, multiplicando-se exageradamente a ponto de prejudicar as células sadias ao seu redor, levando a graves complicações. O tratamento do câncer busca atuar em duas frentes: evitar que a doença se espalhe por outros tecidos, a metástase, e forçar a morte de tecidos cancerosos, para regredir a doença e curar o paciente.
Frederico Ferreira explica que, em 1978, a Cisplatina, pioneira no uso de complexos metálicos na medicina para tratamento de doenças, foi aprovada para uso clínico em quimioterapia do câncer. Desde então, o foco da comunidade científica tem sido buscar outras drogas com ação similar, tentando manter a mesma eficácia no tratamento e reduzindo os efeitos colaterais provocados pelo uso do medicamento. Assim, outras estruturas sintéticas foram desenvolvidas como é o caso de Carboplatina, Oxaliplatina, Heptaplatina, Nedaplatina e Loboplatina.
Essas drogas focam no bloqueio da estrutura do DNA de células cancerosas, para impedirem que o organismo leia as informações contidas na biomolécula. “O tratamento acaba focando na regressão da doença, matando as células cancerosas e levando o paciente à cura. Esta classe de drogas (cisplatina e análogos) se liga ao DNA, formando uma ligação química”, conta Frederico. Contudo, existem os efeitos colaterais do tratamento, como a perda de cabelo. Isso ocorre porque a droga que combate o câncer não diferencia células sadias de células cancerosas. Como o medicamento atua em células que possuem rápida multiplicação, como as do couro cabeludo, ele acaba causando a perda de cabelo.
Novos compostos em estudo
Os membros do grupo de pesquisa da UFJF estudam um método alternativo ao atual. Em busca de novos medicamentos que possuem menos efeitos colaterais, a ciência descobriu a ação de uma outra classe de compostos, chamada SI-PPCs (sigla em inglês para complexos de platina polinucleares de substituição interna). Os compostos se diferenciam por não se ligarem diretamente ao DNA. A inibição é feita através de interações eletrostáticas, como se fossem imãs, capazes de bloquear as funções da molécula e gerar sinais para matar as células cancerosas. Estes são os complexos que Frederico, Rivael e o professor Luiz Antônio estudam em sua pesquisa.
Conforme a equipe, os complexos polinucleares, junto da biomolécula sulfato de heparano, que atua no processo de reconhecimento celular, conseguem bloquear os sinais que levariam a execução do câncer no organismo e diminuem a chance de atuação em células sadias. Esse bloqueio afeta o desenvolvimento do tumor, evitando assim a metástase. Dessa forma, essa nova classe SI-PPCs pode ser considerada uma droga de ação dupla, por agir como agente antitumoral e antimetastático.
Na UFJF, os pesquisadores realizam extenso trabalho teórico, com simulações, a partir de modelos computacionais, da estrutura química da biomolécula, tanto DNA quanto sulfato de heparano, e das drogas pertencentes à nova classe. “Essas simulações rodam em computadores muito poderosos que se encontram em nossos laboratórios, gerando dados valiosos no que diz respeito aos sistemas estudados”, diz Frederico.
O professor Luiz Antonio explica que a pesquisa em modelagem computacional permite que os pesquisadores experimentalistas possam otimizar processos e planejar de maneira mais racional suas pesquisas, além de terem uma visão do que acontece no nível molecular.
Prática é desenvolvida no exterior
Se a parte teórica é feita no Brasil, a prática é realizada no exterior. A pesquisa é desenvolvida em parceria com o pesquisador irlandês Nicholas Farrell, PhD em Química pela Sussex University. Ele atua nos Estados Unidos como professor da Virginia Commonwealth University. A pesquisa sobre os complexos polinucleares surgiu em um congresso em que os dois docentes se encontraram e começaram a conversar sobre a linha de pesquisa de Farrell. Atualmente, nos EUA, Farrell realiza a síntese, a caracterização e os testes biológicos das drogas em questão de forma experimental.