Últimos instantes


Por Tribuna

21/09/2016 às 07h00- Atualizada 21/09/2016 às 08h29

“Se tiver que amar, ame hoje. Se tiver que sorrir, sorria hoje. Pois o importante é viver o hoje. O ontem já foi, e o amanhã talvez não venha.” Não irei pesquisar a autoria dessa frase. Registro apenas que ela estava tatuada nas costas de uma menina de 18 anos, uma das mais de 200 vítimas fatais da tragédia em uma boate da cidade de Santa Maria. Uma menina com toda uma vida pela frente, com sonhos, com projetos, com desejos. Tudo isso se foi em apenas alguns instantes, tudo enterrado com muita dor e muito sofrimento, um ponto final em um livro com muitas páginas em branco.

É de se pensar, caro amigo, quando nos deparamos com situações assim. O que estamos buscando para nossas vidas? Pelo que, exatamente, vale abrir mão de prazeres, em prol de um futuro que a gente não sabe se vem, quando vem, como vem? Ao nos depararmos com um fim de uma vida como esse, temos a certeza da nossa fragilidade e perecidade neste mundo. Independentemente de crenças, vivemos aqui um breve momento, uma vida que passa em um piscar de olhos, isso quando ela segue seu curso normal, com a morte ao envelhecer. Imagine, então, um cessar da vida tão repentino como o dessa tragédia?

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Abrimos mão de muitas coisas baseados em conceitos morais, em economia que beira a mesquinhez, em preocupação com opiniões alheias. “O medo é o pai da moralidade”, já dizia Nietzsche. Vivemos, em muitos casos, uma vida medíocre por medo, medo de receber críticas, medo do que irão achar, medo de ser estigmatizado negativamente. Passamos anos e anos reprimindo sentimentos, nos abstendo de ser um pouco mais felizes, tudo isso em nome de uma ordem moral, de um conceito criado por sabe-se lá quem. E aí ela chega, a dona morte, levando tudo o que ficou preso, levando toda a vontade de fazer, levando todos os “nãos” que deveriam ter sido ditos, todos os “sins” que ficaram apenas em nosso pensamento.

Não é uma apologia à anarquia, não é isso. O limite deve ser sempre em não se fazer maldade com as outras pessoas, em não incomodar a ponto de causar irritação, de causar grandes desavenças. Mas agir sempre de acordo com o que o outro quer é se limitar demais, impedir criações, descobertas, experiências. Há um preço que se paga por ser livre, e muita gente não está disposta a pagar por ele, já que costuma ser um valor alto. Dar o grito de independência, muitas vezes, implica abrir mão de conforto, de segurança, de mimos. Ponderar entre essas duas coisas não costuma resolver. Não se é totalmente livre, não se é totalmente dependente. Viver em cima do muro é lamentável, vive-se uma vida incompleta, inconsistente, ou seja, não se vive.

É isso.

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