Insegurança jurídica com a Reforma Trabalhista inibe criação de vagas de emprego em JF

Com proximidade de queda da MP 808/2017, na próxima segunda, setor patronal diz que é preciso aguardar. Trabalhadores vão ao Supremo contra mudanças


Por Fabíola Costa

21/04/2018 às 07h00

Flávio Nunes: “A norma tinha o objetivo de estimular a contratação e formalização de muitas relações existentes e não está trazendo essa resposta positiva” (Foto: Olavo Prazeres)

Cinco meses após a Reforma Trabalhista entrar em vigor e às vésperas de a Medida Provisória (MP) 808/2017 que altera pontos importantes do texto original perder eficácia, a oferta de vagas nas novas modalidades previstas na Lei 13.467/2017 começam a aparecer em Juiz de Fora, mesmo de forma muito tímida. No portal JF Empregos, site de intermediação gratuita de mão de obra, há oportunidades para trabalho em jornada parcial e home office. Já no Seu Emprego JF, site mantido pela Prefeitura com o mesmo objetivo, não há vagas com este perfil.

Em posicionamento unânime, representantes dos setores de comércio, serviços e indústria afirmam que a insegurança jurídica é o principal motivo para que a oferta seja restrita na cidade. Já entidades ligadas aos trabalhadores, que sempre se manifestaram contrários à nova lei, lutam para reverter as mudanças, alvo de vários questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF). Em dezembro, a Tribuna mostrou que as novas regras não estavam sendo aplicadas nas contratações temporárias de final de ano.

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Entre as três oportunidades em aberto, que se enquadrariam nas modalidades oficializadas pela reforma, está a vaga para auxiliar de manutenção, com oferta salarial de R$ 900 para jornada parcial durante a tarde. Há exigências de curso técnico e experiência. Conforme a reforma, o trabalho em regime de tempo parcial passa a ser válido, desde que a duração não exceda 30 horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais. É aceita, ainda, jornada de até 26 horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais. Para home office, há uma oportunidade para advogado, cujo salário não foi divulgado. No JF Empregos, há, ainda, uma vaga para farmacêutico, em jornada de meio expediente: das 13h às 17h. A pretensão salarial também não foi informada.

Abaixo do potencial

Na avaliação da assessora jurídica da Presidência da Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio), Tacianny Mayara Silva Machado, há empresas contratando segundo as novas regras, mas em número pequeno, muito abaixo do potencial. Segundo ela, a falta de perspectiva de aprovação da MP 808/2017 pelo Congresso Nacional até a próxima segunda-feira (23), cria um clima de insegurança jurídica junto ao empresariado. Tacianny explica que a medida provisória visa a preencher lacunas do texto original, relacionadas a contratos intermitentes e aplicação da reforma para contratos vigentes.

Além disso, comenta, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não proferiu uma posição definitiva sobre revisões de súmulas e orientações jurisprudenciais necessárias após as mudanças introduzidas pela reforma. “Até que se tenha definições mais precisas, o potencial de abertura do mercado para as novas modalidades de contratação não segue no ritmo que se espera.” Uma forma de reduzir a insegurança, diz, tem sido negociar para que algumas normas integrem as convenções coletivas. “O que não é um processo tão simples.”

‘Quiseram implementar essa reforma à força’

Presidente da CUT, Watoíra de Oliveira, diz que oferta de vagas com este perfil é pequena (Foto: Felipe Couri)

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) Regional Zona da Mata, Watoíra Antônio de Oliveira, reforça o posicionamento de oposição à Reforma Trabalhista, que, segundo ele, “escraviza o trabalhador”. “Quiseram implementar essa reforma à força, de uma vez. O trabalhador praticamente não vai ter direito a nada.” Na sua avaliação, a oferta de vagas com este perfil na cidade ainda é pequena, o que é motivo de comemoração e alívio.

“Estamos fazendo de tudo para essa lei cair. Acreditamos que vamos conseguir derrubá-la.” A reforma é alvo de 16 questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF). Nas ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) ajuizadas, o trabalho intermitente é objeto de questionamento, assim como o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical. O STF ainda não bateu o martelo sobre o assunto.

Insegurança em pontos importantes e polêmicos

A insegurança jurídica que assombra empregadores desde que a Reforma Trabalhista entrou em vigor, em novembro do ano passado, ganha contornos ainda maiores, com a proximidade do prazo para vencimento da MP 808/2017, na próxima segunda-feira (23). Neste caso, volta a valer o texto original, caindo por terra pontos como a exigência de convenção ou acordo para jornada de 12×36 horas; a proibição de contratos com cláusula de exclusividade; e a quarentena de 18 meses entre a demissão de um empregado e a sua contratação como intermitente pelo mesmo empregador.

A previsão de afastamento automático das gestante de locais insalubres também é citada na MP, que alterou 17 artigos da Lei 13.467/2017. Publicada em novembro, a medida provisória já havia sido prorrogada por mais 60 dias. O prazo inicial de vigência de uma MP é de 60 dias, havendo a prorrogação automática por igual período, caso a votação não tenha sido concluída no Congresso Nacional.

Segundo a advogada trabalhista da Fiemg Regional Zona da Mata, Poliana Martins, não há dados sobre contratações nos moldes previstos pela reforma na cidade. “Percebemos uma certa insegurança das empresas para implementar esse tipo de contrato.” Poliana afirma que a entidade patronal defende o trabalho intermitente como uma modalidade que abre possibilidades, como a de aumentar a formalização em algumas funções. Ela reconhece, no entanto, que, na própria lei, “há diversos pontos que precisavam de maior esclarecimento”.

Prós e contras

Mestre em Direito, Flávio Nunes, professor e advogado estudioso no assunto, avalia os prós e os contras da Reforma Trabalhista. Ele considera positiva a regulamentação de algumas modalidades de contratação, como a intermitente e a possibilidade de contratação de trabalhador autônomo para prestar serviço terceirizado. Em contrapartida, avalia, que a falta de um melhor amadurecimento dos debates e de maior tempo de diálogo entre as bancadas congressistas fez com que o texto aprovado deixasse várias lacunas, gerando insegurança.

Além disso, o professor observa que os tribunais ainda não começaram a apreciar a questão, faltando um posicionamento. “A norma tinha o objetivo de estimular a contratação e a formalização de muitas relações existentes e não está trazendo essa resposta positiva.” Segundo Flávio Nunes, perde a classe patronal, que está deixando de realizar contratações através das novas modalidades, e perdem os trabalhadores, na medida em que não houve redução no número de desempregados, nem a redução da informalidade.

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‘A gente precisa esperar mais um pouco’

Para Emerson Beloti, é preciso cautela diante da insegurança jurídica (Foto: Felipe Couri)

Já o presidente do Sindicato do Comércio (Sindicomércio), Emerson Beloti, diz que o comércio seguiu na mesma linha da indústria, de cautela. Segundo ele, as vagas ofertadas com este perfil são muito pontuais. “É tudo muito novo. A gente precisa esperar mais um pouco.” Na avaliação dele, tão logo a situação esteja pacificada, as grandes empresas começarão a adotar as novas modalidades de contratação, seguidas, posteriormente, pelos médios e pequenos negócios.

O advogado do Sindicato dos Empregados no Comércio de Juiz de Fora, Guilherme Lourenço, afirma que não tem visto, no comércio, ofertas de trabalho intermitente. Ele cita a legislação específica, a Lei 12.790/2013, conhecida como Lei do Comerciário, que estipula jornada de oito horas diárias e 44 horas semanais, condição que só pode ser alterada via convenção ou acordo coletivo. “Temos muitas dúvidas em relação a aplicação no comércio tendo em vista a legislação específica. Entendemos que nem é cabível o contrato intermitente.” Ainda segundo Lourenço, não há previsão de instrumento normativo nesse sentido em Juiz de Fora.

Vagas intermitentes em Minas somam 336 postos

Em Minas, foram criados 336 empregos intermitentes, resultado de 372 admissões e 36 desligamentos no mês de janeiro – o dado mais recente divulgado pelo MTE. Em dezembro, foram abertas 456 oportunidades com este perfil, sendo 467 contratações e 11 demissões. Apesar do pedido formal, o Ministério do Trabalho não divulgou dados referentes ao município. No país, o saldo chegou a 2.461 em janeiro e 2.574 em dezembro. Dentre os setores produtivos, serviços e comércio destacam-se, com a criação de 796 e 768 oportunidades, respectivamente, em janeiro. Em seguida, estão indústria da transformação (425), construção civil (410), agricultura (41) e extrativo mineral (21).

No país, os cargos de assistente de vendas (17,6%), servente de obras (5,7%), embalador à mão (5,4%) e alimentador de linha de produção (4,1%) são os mais demandados considerando o trabalho intermitente. A modalidade caracteriza-se pelo pagamento do salário-hora, que, por lei, não pode ser inferior ao mínimo. Na lista, estão, ainda, faxineiro (3,8%), garçom (2,3%) pedreiro (2%), soldador (1,9%), vendedor de comércio varejista (1,8%) e caldeireiro de chapas de ferro e aço (1,6%). Geralmente homens (71%), com até 49 anos (91%), e escolaridade até o segundo grau completo (75%), são os mais contratados via novas regras, informa o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Quem trabalhar nessas condições tem direito a férias, FGTS, previdência e 13º proporcionais.

 

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