Nova alíquota deve elevar preços


Por GRACIELLE NOCELLI

08/03/2015 às 06h00

Em meio a um cenário de queda na criação de vagas, os setores produtivos do país convivem com a possibilidade de aumento de custos com mão de obra ainda este ano. Na tentativa de reequilibrar as contas públicas, o Governo Federal pretende reduzir a desoneração da folha de pagamento para as empresas. A decisão foi publicada por meio da Medida Provisória (MP) 669/15 no dia 27 de fevereiro, mas foi rejeitada pelo Senado quatro dias depois. Diante do impasse, a presidente Dilma Rousseff substituiu a MP, que tem caráter imediato, por projeto de lei de mesmo conteúdo, mas com prazo de 90 dias para ser avaliado. Caso seja aprovada, a nova legislação entra em vigor em junho e deve causar impactos como alta de preços para o consumidor e paralisação de obras da construção civil.

A política de desoneração da folha de pagamento teve início em 2011 e foi ampliada em 2014 com o objetivo de melhorar o fluxo de caixa das empresas e contribuir para a manutenção dos empregos. Com o benefício, os setores deixaram de pagar 20% de contribuição sobre a folha de salários para pagarem alíquota de 1% ou 2% sobre o faturamento anual da empresa.

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A nova proposta do Governo prevê aumento destas alíquotas. Os setores que arcavam com 1% passam a pagar 2,5%, e aqueles com percentual de 2% sobem para 4,5%. As novas alíquotas correspondem a altas de 150% e 125%, respectivamente. No entanto, diferente de quando a política de desoneração foi criada e as empresas tiveram que, obrigatoriamente, optar pelo pagamento da contribuição sobre o faturamento anual, a nova proposta dá ao empresário a alternativa de pagar 20% de contribuição sobre a folha de salários, caso seja mais vantajoso.

Na última sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff declarou que todas as políticas de ajuste fiscal visam à manutenção de programas sociais, como “Minha Casa, Minha Vida” e Pronatec, e a possibilidade do país continuar investindo. No caso da desoneração da folha de pagamento, o Governo tem batido na tecla de que não se trata do fim de um benefício, apenas de uma “redução necessária”. No entanto, os setores garantem que a aprovação da medida irá trazer impactos negativos para as empresas e o consumidor final.

Para a construção civil, a redução do benefício será um “transtorno”, conforme analisa o presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil de Juiz de Fora (Sinduscon-JF), Leomar Delgado. “Há empresas em que os custos com mão de obra representam 50% do gasto total, então o aumento das despesas será muito impactante.” No caso do setor, a alíquota sobe de 2% para 4,5%.

Leomar teme que a aprovação da medida possa inviabilizar obras que estão em andamento. “Os contratos da construção civil são longos. Os empresários fizeram orçamento há mais tempo, embasados em uma legislação vigente. Se, no meio do jogo, as regras mudam, a situação fica muito complicada. Prejudica o andamento e pode até inviabilizar o trabalho. Isso tudo só mostra a total insegurança jurídica que nós temos”, analisa.

Impactos também atingem consumidor

O reflexo do aumento do custo de mão de obra para os setores de comércio, serviços e indústria será percebido no bolso do consumidor. A preocupação das entidades representativas é que a elevação de preços de produtos e serviços reduza ainda mais a demanda.

Na avaliação do presidente do Sindicato do Comércio de Juiz de Fora, entidade que representa os setores de comércio e serviços, Emerson Beloti, é preciso prudência por parte do Governo na hora de realizar as medidas de ajuste fiscal. “Comércio e serviços estão sofrendo várias medidas de uma vez só. Antes foi a decisão da empresa arcar com o auxílio doença do trabalhador, agora mais um aumento da tributação. Desta forma, corremos o risco de desestimular a economia.”

Beloti destaca que, caso a medida seja aprovada em junho, os consumidores irão conviver com encarecimento. “O comércio pode conseguir segurar a princípio, mas o setor de serviços vai ser imediato, já que a mão de obra representa cerca de 30% do faturamento dele.” As novas alíquotas para comércio e serviços serão de 2,5% e 4,5%, respectivamente.

O coordenador do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Juiz de Fora (SHRB-JF), Rogério Barros, teme o futuro da área de hotelaria. “O setor veio de um 2013 muito ruim e passou por um 2014 difícil. Avistamos muitas dificuldades no horizonte”, conta. “Estamos estupefatos com a redução da desoneração da folha de pagamento. As empresas programaram um quadro tributário para 2015 que, agora, dobrou.”

Para a indústria juizforana, os impactos serão menores, conforme explica o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) regional Zona da Mata, Francisco Campolina. “A maior parte das nossas indústrias é composta por pequenas empresas, que já possuem uma tributação diferenciada. O maior impacto será para as indústrias de grande porte, como é o caso daquelas que compõem o polo moveleiro de Ubá.” Ele explica que o polo possui em torno de 500 estabelecimentos que empregam em torno de 13 mil pessoas. “Nas empresas de maior porte, o aumento do custo da folha de pagamento implicará em elevação de preços do produto final. Mas também não será um impacto tão grande para assustar o consumidor.”

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Especialista orienta empresários

A aprovação da redução da desoneração da folha de pagamento exigirá dos empresários a reformulação do planejamento feito até agora. O economista da Fiemg Regional Zona da Mata, Matheus Santana, orienta que as empresas coloquem as contas na ponta do lápis para evitar grandes transtornos. “O ideal é que o empresário sente ao lado do contador e veja todas essas despesas.”

Ele explica que, desta vez, o Governo dará a possibilidade de o empresário optar pelo pagamento da contribuição sobre o faturamento anual com as novas alíquotas ou 20% de contribuição sobre a folha de salários. “Em 2011, não foi dada essa alternativa. Agora, a empresa poderá optar por qual forma é a mais vantajosa, por isso, a importância de se fazer todos os cálculos.”

O especialista explica que a escolha pela forma de pagamento vai depender do faturamento anual, de quanto ela gasta com mão de obra e de qual setor a que ela pertence. “Cada caso será um caso. Haverá situações em que ambas as formas de pagamento darão o mesmo valor, assim, a empresa terá que analisar os gastos com obrigações acessórias para definir qual é a melhor opção”, exemplifica.

Matheus não acredita que a medida possa afetar a empregabilidade nos setores. “Este tipo de alteração modifica a estrutura interna da empresa e influencia o mercado, se vai vender, investir ou exportar mais. Os empregos não são afetados.” Ele salienta que as medidas de ajuste fiscal realizadas pelo Governo só reforçam a necessidade de realização de uma reforma tributária adequada no país.

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