Ocupação do Teatro Paschoal Carlos Magno ainda será definida

Edital será aberto após fase de teste do espaço, que será inaugurado daqui a três dias; aluguel para eventos não está descartado


Por Carime Elmor e Mauro Morais

27/02/2018 às 07h00- Atualizada 01/03/2018 às 14h26

ATO III
“A ocupação é uma incógnita”

Quando as cortinas se abrirem, não se encerrarão as dúvidas acerca do futuro do Teatro Paschoal Carlos Magno. Conformarão novas questões e uma crescente expectativa. É justamente no vaivém da cortina que a Prefeitura espera encontrar saídas para uma proposta de tamanho ineditismo num mundo que cerra as portas de cinemas e teatros mundo afora como se fossem triviais lojas. “A ocupação é uma incógnita”, reconhece o superintendente da Funalfa Rômulo Veiga, que se prepara para receber o espaço em cerimônia nesta sexta (2), quando a Secretaria de Obras repassará a tutela do bem. “Não queremos cometer o erro de não mensurar o potencial do teatro”, responde o gestor ao ser perguntado sobre o modelo de gestão da nova casa. Após uma ampla vistoria, promete Rômulo, será liberado o edital de ocupação, a ser validado com o Conselho Municipal de Cultura (Concult), com prazo de 30 dias para inscrição e alcance de até seis meses. Durante esse tempo, o teatro não contará com um diretor, mantendo-se sob a coordenação do diretor de cultura da Funalfa, o ator e produtor Zezinho Mancini.

Artistas e produtores se reuniram para debate na Tribuna: (da esquerda para direita) Hussan Fadel, Toninho Dutra e José Luiz Ribeiro (de pé), Marcos Marinho, Carú Rezende, Gueminho Bernardes, Henrique Simões, Sandra Emília e Tarcízio Dalpra Jr. (sentados) (Foto: Marcelo Ribeiro)

“É importante entender que talvez o modelo que deu certo na Praça CEU e no Teatro Municipal do Rio de Janeiro não dê certo no Teatro Paschoal Carlos Magno”, aponta Rômulo, referindo-se à gestão por organização social (OS), praticada com o programa municipal Gente em Primeiro Lugar e com complexo esportivo e cultural na Zona Norte, ambos geridos pela Associação Cultural Arte e Vida (Acav), que recebe verba municipal para a manutenção e custeio das atividades. “Uma OS consegue fazer compra de equipamentos e serviços com três orçamentos. Já a administração direta exige licitação, mas permite uma ocupação de artistas locais com maior facilidade”, pondera o superintendente, destacando, ainda, modelos como o de espaços comandados por cooperativas, residências, convênios com Sistema S e parcerias público-privada.

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Neste fim de semana, serão oferecidas visitas guiadas às dependências do teatro, apresentações de artistas locais no foyer e a exibição de um musical carioca. Em seguida, a Funalfa prepara uma agenda de ocupação até finalizar o processo do edital público, que promete se aproximar à simplicidade do edital do Cine-Theatro Central. O aluguel do espaço para eventos como cerimônias institucionais, de formatura e palestras não está fora dos planos da fundação. “Mas a prioridade é para produtos culturais locais. Pensamos que, se numa sexta-feira à noite não tiver nada, é melhor que haja um evento que capitalize”, ressalta Rômulo, afirmando a necessidade de que o local sobreviva de forma sustentável e garantindo que há anos o espaço marca presença na dotação orçamentária do município, além de atualmente ser contemplado com um emenda parlamentar para compra de equipamentos.

ATO IV
O sentido é fazer sentido

Em 1990, o diretor teatral Henrique Simões escreveu um artigo apontando para o que considerava ser um exagero no projeto do Teatro Paschoal Carlos Magno. “Dizia que ele era muito caro, suntuoso e que não servia aos grupos da cidade”, recorda-se, aos risos, ao constatar que as questões retornam à cena num momento em que a continuidade ou não da obra é assunto vencido. Para o veterano artista, é urgente reconhecer soluções modestas para uma expressão que carece de maior aproximação do público. “A principal maneira de o Paschoal Carlos Magno dar certo é servindo ao objetivo de desenvolver o teatro na cidade, com um custo, gastando dinheiro, investindo”, defende o diretor, ator e dramaturgo Gueminho Bernardes.
Num cenário de retração – com a principal ferramenta de fomento local, a Lei Murilo Mendes, tendo sido cancelada em 2017 – e de ausências – com teatros fechados ou parcialmente interditados -, a existência do Paschoal Carlos Magno exigirá um tanto de pertencimento e outro tanto de reivindicações de uma classe que deve, necessariamente, expressar-se unida. O cenário, contudo, é outro. A baixa mobilização nos fóruns setoriais que fortaleceriam o Conselho Municipal de Cultura desenha um panorama de decrescente participação. A própria alteração na lei de incentivo cultural municipal, inicialmente a cargo dos representantes de cada área, acabou redigida pela Funalfa.

“Foram poucas as pontuações que não deram subsídio para a construção de um novo edital. Por fim, esse novo edital será uma proposta que faremos para os artistas. Não houve a ampla participação que esperávamos. As reuniões acontecem com quórum mínimo”, lamenta o superintendente. “Temos uma grande participação das pessoas nas redes sociais, mas, na prática, onde o mundo real acontece, há pouca participação”, acrescenta, demonstrando que, enquanto as cortinas vão e vêm, os holofotes estarão voltado para a plateia e também para o palco.

ATO V
“Não basta abrir o espaço”

“O Teatro Paschoal Carlos Magno será inaugurado, mas nenhuma das pessoas que fazem teatro na cidade sabia disso. Eu acho que isso é muito sintomático”, aponta Gueminho Bernardes, diretor teatral na segunda matéria da série “Atos de um teatro”. Todos estão ansiosos para saber, ao menos, quais serão as apresentações do fim de semana de abertura, entre os dias 2 e 4 de março. A Tribuna entrou em contato com a Funalfa, mas, segundo assessoria, a programação ainda está sendo fechada a três dias da abertura. A volta da pauta do Teatro Paschoal Carlos Magno, em 2018, não é como nos últimos 37 anos. Agora o espaço, mesmo que readaptado e menor, será inaugurado na noite desta sexta-feira, 2, em uma cerimônia oficial, com uma plateia de figuras políticas e públicas. Representantes do teatro local, reunidos a convite da Tribuna no último dia 21, reivindicam não somente a falta de informação sobre o momento, mas a exclusão de quem produz teatro do processo de restabelecimento para o início do funcionamento.

Pronto para a inauguração nesta sexta-feira, Teatro vai receber visitas guiadas, apresentações de artistas locais no foyer e a exibição de um musical carioca no fim de semana (Foto: Olavo Prazeres)

As idas e vindas do teatro, que permaneceu com obra parada desde o início dos anos 1980, chegam ao fim, mas ao mesmo tempo ao início de uma discussão ainda mais necessária, e que talvez gire em torno de toda a especulação que o espaço causa, sobretudo em quem produz teatro. “É um projeto que precisa ser consistente. Não basta abrir o espaço e esperar os grupos ocuparem. É preciso saber se haverá um espaço de formação, o que eu acredito que acontecerá, e se haverá oportunidade para os grupos da cidade que estão organizando várias oficinas”, reflete Hussan Fadel. O pesquisador e diretor teatral é de uma nova geração que produz teatro na cidade, além de administrar, com o grupo Corpo Coletivo, o espaço cultural OAndarDeBaixo, na Rua Floriano Peixoto. Ele acredita na demanda de ocupação para formação, relembrando o extinto curso de teatro do CCBM.

“Quando a Funalfa criou o curso do CCBM o impacto foi quase imediato. Henrique Simões e Marcos Marinho deram aula lá, José Luiz Ribeiro fez palestras, Gueminho e Hussan ofereceram módulos. Se olhar para as pessoas que fazem teatro hoje, mesmo que experimental ou pequeno, elas foram diretamente influenciadas por este curso”, defende a atriz Carú Rezende, corroborando a ideia de que é urgente haver um espaço de formação de artistas. Cursos técnicos de som e iluminação também são pouquíssimos ofertados na cidade. Consequentemente há um baixo número de capacitados para os bastidores do setor.

ATO VI
Casa de aluguel?

“Para ter mercado e formação de público, é necessário ter fontes de financiamento, porque nós, que fazemos teatro e vivemos disso, temos que botar do bolso. E quase nunca temos dinheiro. Fazemos um empréstimo aqui, uma gambiarra ali e, na maioria das vezes, ainda temos prejuízo. Isso não é sustentável”, discute Gueminho, dizendo que é uma ilusão pensar que o teatro público será oferecido sem custos aos artistas e sugerindo para a administração que crie um banco de projetos para a ocupação do teatro ao longo do ano.

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Um receio unânime por parte dos interessados é que o Teatro Paschoal Carlos Magno se torne uma casa de aluguel. O diretor teatral José Luiz Ribeiro está motivado com a abertura do teatro público, porém considera que ele chegou algumas décadas atrasadas: “Você convida alguém para sua festa quase 40 anos depois?”. “A gente tem um teatro que há quatro décadas já era ultrapassado. É possível que haja essa efervescência cultural agora? Pode ser que sim, mas será preciso gerar muita energia, muita força, muito investimento”, complementa Gueminho. Toninho Dutra, produtor cultural, que na época do restabelecimento das obras era superintendente da Funalfa, diz que a retomada do Teatro foi uma questão de se pensar no aproveitamento de um espaço nobre e central que estava “perdido e desocupado”, apenas sendo usado como depósito. Acreditando nas oportunidades que aquele novo espaço causaria, ele reforça: “Eu tenho certeza que estes 400 lugares serão ocupados. Se não for para produção teatral local, será ocupado para outra coisa”.

ATO VII
A experiência do novo

De toda forma, há sim o desejo por parte da classe do teatro de experimentá-lo, arriscando novas formas de se usar o espaço. “É capaz de eu querer colocar cadeira de espectador em cima do palco para poder apresentar no formato de arena”, diz Hussan. Marcos Marinho planeja retomar no final de março a peça “Meu dia perfeito”, que estreou em 2009, e já cogita poder fazer montagens teatrais no Paschoal Carlos Magno. “Um teatro esteticamente intimista pode ser apresentado em um teatro maior, se houver esse interesse. ‘Meu dia perfeito’ é assim, apresentei o espetáculo em teatros grandes fora daqui, com até mil lugares. Eu quero levar para o Paschoal, não importa se vou ter 400 espectadores ou 30, é uma questão de escolha”, reforça Marinho, reconhecidamente independente, na expectativa de que as produções locais possam ser acolhidas em sua originalidade.
“Acredito que quando o Paschoal for inaugurado, vai haver aquela experiência do novo, de querer ver o que vai acontecer. Ele terá uma força muito grande sustentada por apresentações de balé e teatros de escolas. Agora, neste teatro, a cenografia, a iluminação terão um gasto multiplicado. Indiscutivelmente vai aparecer uma tendência para o Paschoal, as pessoas vão fazer um, dois espetáculos”, conclui, entre o irônico e o profético, José Luiz Ribeiro.

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