A tecnologia como aliada na batalha contra o Aedes aegypti

Produção de mosquitos transgênicos é uma das armas para combater o aedes, transmissor da dengue, zika e chicungunya. Mas não pode ser a única: é necessário um grande esforço coletivo para a eliminação dos criadouros


Por Tribuna

22/12/2017 às 07h00- Atualizada 22/12/2017 às 07h23

Produção do Aedes do Bem, na fábrica da Oxitec em Piracicaba. (Foto: Alexandre Carvalho/Oxitec)

Na luta contra a proliferação do Aedes aegypti, mosquito responsável pela transmissão de doenças como dengue, zika e chicungunya, toda a ajuda é bem-vinda. Incluindo a da tecnologia. A experiência bem-sucedida em outras cidades brasileiras, como Jacobina e Juazeiro, na Bahia, e Piracicaba, em São Paulo, que registraram queda de até 99% na redução da população selvagem do mosquito está servindo como referência para o trabalho que começou a ser realizado em Juiz de Fora, pela prefeitura, no final do mês passado, nos bairros Vila Olavo Costa, Santa Luzia e Monte Castelo.

Conhecida como Aedes do Bem, a iniciativa visa introduzir na natureza, mosquitos machos, geneticamente modificados, que em contato com as fêmeas selvagens transmitem aos filhos o gene autolimitante, levando-os à morte antes mesmo de atingirem a idade adulta. O próprio reprodutor também tem sua vida encurtada. Na alteração genética a que é submetido, o mosquito passa a produzir uma proteína que ele não dá conta de consumir e morre pelo excesso da dose autogerada. O único antídoto é uma substância conhecida pelo seu emprego como antibiótico – a tetraciclina. Os pesquisadores, no entanto, afirmam que como ela não está disponível na natureza, o mosquito geneticamente modificado não tem chance de sobreviver.

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Desde o final de novembro, vêm sendo liberados, nos três bairros participantes, 2 milhões de Aedes do Bem, três vezes por semana. “Parece muito, mas não é uma liberação concentrada. Percorremos 75 quilômetros, nessas três áreas, fazendo a soltura ao longo do percurso, a cada 50 metros. Também é preciso lembrar que ele, por ser macho, não pica”, afirma a gerente de produção e distribuição da Oxitec, empresa que detém a tecnologia do Aedes do Bem, Karla Tepedino. A frequência, segundo ela, se deve ao fato de que o mosquito modificado tem vida curta, de dois a quatro dias. Outro fator que interfere no planejamento da quantidade e frequência de liberação, é que o mosquito não voa muito, variando a distância percorrida de 50 a 100 metros. Daí a distribuição controlada no perímetro.

 

De barriga cheia

2 milhões de mosquitos transgênicos estão sendo liberados, três vezes por semana, nos bairros Monte Castelo, Santa Luzia e Vila Olavo Costa. (Foto: Alexandre Carvalho/Oxitec)

Em seu curto período de vida, o Aedes do Bem tem apenas uma missão: a reprodução. A outra necessidade – o alimento – a Oxitec garante antes da soltura para que o mosquito não perca o seu foco. “O macho só come água com açúcar e o grande objetivo dele é encontrar a fêmea selvagem e reproduzir. Ele tendo comida, pois a gente o libera com a barriguinha cheia, vai direto procurar a fêmea, reproduzir e a acabou”, resume a gerente.

 

Monitoramento

Antes de iniciar o trabalho nos três bairros, a Oxitec instalou ovitrampas – armadilhas para a coleta dos ovos, a fim de estabelecer um parâmetro da população de mosquitos existente nas áreas selecionadas pela prefeitura. A medida se repete agora, depois de iniciada a liberação, para avaliar a eficácia do projeto.

O que garante à empresa o sucesso nos resultados, com a efetiva diminuição da população do aedes selvagem, também é a tecnologia. “Nós colocamos dois genes nele. Um é esse letal, autolimitante, para que não chegue na fase adulta, se não receber o antídoto. O outro é o gene de fluorescência. A larva do meu mosquito, sob uma luz ultravioleta, brilha. Então eu garanto que ela é filha do meu”, explica Karla Tepedino.

As primeiras larvas fluorescentes já devem aparecer para os pesquisadores, trinta dias após a liberação. Como a armadilha precisa ficar por uma semana no campo para a captura dos ovos, a análise tem um delay devido ao prazo necessário para a captura, recolhimento, envio das paletas para o laboratório e a análise propriamente dita do ovo e também do mosquito. “Dentro do primeiro ano, já poderemos observar a redução na população”, afirma a gerente. A prefeitura receberá relatórios mensais para acompanhar a evolução.

 

Uma luta incansável

Uma das grandes batalhas a ser vencida com relação ao Aedes aegypti é que seu ovo é viável por até um ano, mesmo sem a presença de água. “Se a pessoa só joga fora a água do vasinho de planta, sem lavar, tendo ovo, um ano depois, ainda pode virar mosquito quando cair água ali. Temos um banco de ovos na natureza que a gente desconhece o tamanho. É impossível saber. Está escondido”, lembra Karla Tepedino.

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Segundo ela, o Aedes do Bem ajuda muito, mas não é mágica. “Os dez minutos contra a dengue continuam valendo. Estamos há mais de um século combatendo o mosquito e estamos atrás na corrida. É necessário que todos façam um grande esforço. Caso contrário, vamos continuar perdendo vidas e produzindo outras sequelas graves como zika e chincungunya”, conclui.

 

Controle biológico

Estabelecer um processo de controle biológico do vetor é, segundo Michele Freitas, gerente do Departamento de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde, uma boa justificativa para o emprego da tecnologia do mosquito transgênico, no município, evitando, inclusive, a utilização intensiva de inseticida, que pode gerar uma seleção de mosquitos resistentes a eles. “O Aedes do Bem é um controle biológico. O inseticida nem é tão eficiente porque vai atuar nos mosquitos adultos e não elimina os ovos que vão eclodir e originar novos insetos alados. O controle biológico é bem mais interessante para o meio ambiente e para a saúde”, defende Michele Freitas.

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