Onde está Carlos Henrique?


Por Michele Meireles

21/01/2017 às 07h00

Era início da noite de um sábado, dia 23 de julho de 2016, quando a família de Carlos Henrique Leandro o viu pela última vez. O pedreiro de 51 anos, natural de Matias Barbosa, foi deixado às 18h40 no Hospital João Penido, depois de ser transferido para Juiz de Fora, vindo da policlínica de sua cidade natal. No dia seguinte, os parentes de Carlos Henrique retornaram à unidade de saúde no horário de visitas, porém, para o espanto deles, o homem havia desaparecido. Já são 180 dias de angústia e buscas. Cento e oitenta dias sem uma resposta do que houve com o pedreiro. “Quando fomos conversar com o diretor do hospital, ele nos disse que este não era o primeiro e nem seria o último caso de desaparecido lá. Saiu de lá como? Ninguém sabe, ninguém viu”, desabafou uma das irmãs do pedreiro, Maria José Leandro.

Quando desapareceu, Carlos Henrique vestia um casaco de moletom escuro, calça de moletom cinza e chinelos azuis. Ele não portava documentos (Foto: arquivo pessoal)
Quando desapareceu, Carlos Henrique vestia um casaco de moletom escuro, calça de moletom cinza e chinelos azuis. Ele não portava documentos (Foto: arquivo pessoal)

Desde a constatação do desaparecimento, a família deu início a uma peregrinação, que inclui a rota de Juiz de Fora e de cidades vizinhas. Mesmo tendo se passado seis meses, o sumiço ainda envolve uma série de questões mal explicadas. A Polícia Civil apura o caso e ainda não encontrou materialidade de crime, mas já constatou que o homem não tinha nenhum desafeto.

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Conforme Maria José, o irmão, apelidado de Leão pelos amigos, estava internado na unidade de saúde de Matias desde o dia 21 de julho. Ele vinha tendo crises convulsivas repetitivas em casa e precisou ser hospitalizado. Segundo ela, nos dois dias em que esteve na unidade em Matias, o homem apresentou melhoras no quadro. O pedreiro viria para Juiz de Fora fazer exames. “Não foi permitido que ficasse uma acompanhante com ele, já que ele ainda não tinha 60 anos. Porém, estava muito agitado, nervoso. Em momento algum foi avaliado se necessitava de companhia. Ele ficou em um quarto junto com um paciente muito grave e chegou a pedir a uma irmã minha que estava com ele para tirá-lo de lá”, disse.

Segundo a irmã do desaparecido, o hospital não fez nenhum tipo de contato após a internação. “Estávamos preocupados com ele, mas, como não nos procuraram, achamos que estava tudo bem. Quando minha mãe, de 77 anos, e minha outra irmã chegaram no quarto, por volta das 14h do dia 24, é que viram que ele não estava. A bolsinha com as roupas dele, um marmitex e o café da manhã estavam no quarto, intactos”, disse. Maria José disse que foi aí que o hospital se deu conta do episódio. “Ninguém tinha dado falta dele, ninguém o viu. Ainda nos pediram para esperar até o fim da visita, às 17h, porque ele podia aparecer. O curioso é que, para entrar para a visita, você precisa deixar até documento. Como um paciente some assim e ninguém sabe?”, questiona.

Peregrinação em busca de notícias

Desde a constatação do desaparecimento, a família deu início a uma peregrinação em busca de qualquer notícia de Carlos Henrique. Ainda no dia 24, a PM foi acionada para registrar a ocorrência do fato. “Ligamos pedindo a viatura às 19h45, às 21h os policiais chegaram. Até hoje não entendemos, mas o primeiro boletim de ocorrência foi registrado como atrito verbal. Só conseguimos arrumar a ocorrência para desaparecimento três dias depois”, disse Maria José. O Corpo de Bombeiros também foi acionado, e deu início às buscas nas imediações do hospital.

Na época, a corporação comunicou à imprensa o sumiço, e os militares procuraram o homem por dias. “Na segunda-feira, dia 25 de julho de 2016, nós voltamos ao hospital e conseguimos, depois de um jogo de empurra, falar com a diretoria. Fomos ironizados e subestimados”, comentou Maria José, destacando que sequer uma sindicância interna foi aberta para apurar o episódio e que nunca mais o João Penido procurou pela família.

Mesmo com dificuldades, a família se reuniu, juntou dinheiro e começou as buscas por conta própria: foram feitas panfletagens em toda a cidade e colocados banner nos vidros traseiros de coletivos. Os parentes de Carlos Henrique estiveram em clínicas, hospitais, albergues e no Instituto Médico Legal (IML). As ruas de Juiz de Fora foram vasculhadas em busca de alguma notícia. “Buscamos em cidades vizinhas também, mas nada até agora. Recebemos algumas ligações, mas nenhuma nos levou a algo concreto. Já são seis meses de angústia, quando está frio, chovendo, ficamos imaginando se ele não está na rua, passando fome. Queremos saber o que houve, não se deve desistir nunca. Quanto vale uma vida humana? “, disse emocionada.

Inquérito investiga responsabilidades

O caso é apurado pela 4ª Delegacia de Polícia Civil. A delegada que preside o inquérito, Carolina Gonçalves Magalhães, disse que já foram ouvidos representantes do hospital e familiares, mas, até o momento, não há materialidade que prove que houve crime. “É importante deixar claro que as investigações não estão fechadas. Ainda falta ouvir algumas pessoas, entre elas, funcionários do hospital. Já ficou claro que este homem não tinha desafetos ou inimigos. Nossos investigadores estiveram em campo, entrevistaram diversas pessoas, entre elas, uma enfermeira que pode ter sido a última pessoa a vê-lo.” De acordo com o relatório enviado pelo hospital, no dia 24 de julho, às 6h, uma equipe médica esteve no quarto e checou seus sinais vitais. Às 8h, o laboratório de análises clínicas iria colher sangue do paciente, porém, ele já não estava no leito. Nas buscas pelo hospital, ele foi encontrado na ala feminina, e uma enfermeira, já ouvida, pediu que saísse. Ainda de acordo com a delegada, o relatório apontou que ele teria histórico de fuga de uma unidade de saúde de Matias. O Instituto Médico Legal (IML) foi oficiado para saber se tinha algum corpo desconhecido.

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Segundo a delegada, está sendo questionado como ele deixou a unidade. “O hospital tem responsabilidade sob a tutela do paciente. Já pegamos relatórios sobre sua internação. Pode ser que, ao fim do inquérito, que dever ser concluído em 30 dias, alguém seja responsabilizado.” O desaparecido foi incluído no programa Alerta Minas, da Polícia Civil, no qual um banco de dados cadastra todos as pessoas sumidas.

Na tarde de ontem, a assessoria de imprensa da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, a qual pertence a unidade do Bairro Grama, informou que o hospital tem dialogado com a família.

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