Lei proíbe carona paga, mas usuários defendem prática


Por MARCOS ARAÚJO

03/11/2015 às 07h00- Atualizada 03/11/2015 às 09h21

Sem considerar os riscos, cada vez mais pessoas aderem à prática de viajar utilizando “caronas” pagas oferecidas em grupos do Facebook. As viagens são feitas em carros particulares e, muitas vezes, por motoristas sem experiência com o trânsito nas rodovias. Por outro lado, o condutor também não tem garantias sobre quem irá acompanhá-lo. Todavia, motorista e carona defendem que a prática traz economia e comodidade. Portanto, não concordam com as proibições e regulações da prática. Este tipo de transporte que ganha cada vez mais adeptos com as redes sociais é considerado ilegal e já representa um desafio para as empresas de transporte de passageiros, que precisam lidar com a concorrência.

De acordo com o Sindicato das Empresas do Transporte de Passageiros (Sindpas/MG), o sistema regular de transporte de passageiros acumulou prejuízo que ultrapassa 35% do serviço devido ao transporte ilegal, que é aquele que ocorre sem autorização do Poder Público e é realizado por veículos particulares, vans e ônibus que fazem linhas irregulares, sob o nome de fretamento ou locação; e veículos de municípios destinados ao transporte escolar ou de saúde, empregados para fins diversos. O sindicato denuncia que, no Norte de Minas, por exemplo, empresas de vans, escondidas sob pretexto da “carona solidária”, fazem o transporte de passageiros, oferecendo vagas nas redes sociais.

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Tudo seria encarado dentro da normalidade se o transporte fosse gratuito. Todavia, não é isso que acontece, pois são cobrados valores fixos de passageiros. Há condutores no Facebook que cobram dos juiz-foranos R$ 40 para uma viagem ao município do Rio de Janeiro e entre R$ 20 e R$ 50 para a capital mineira e outras cidades do estado. Conforme dados do Departamento de Estrada de Rodagens de Minas Gerais (DER/MG), até o dia 31 de agosto deste ano, em todo o estado foram aplicadas 11.383 multas e efetuadas 611 apreensões, em 4.502 ações de combate ao transporte irregular.

Para a Polícia Militar Rodoviária (PMR), motoristas e passageiros devem pensar na segurança antes de optar pela “carona solidária”. De acordo com o comandante do Grupo Tático da PMR, subtenente Júlio César de Almeida, o condutor precisa saber quem vai no carro dele. “Em muitas ocasiões, ele desconhece a índole da pessoa, se ela tem más intenções. Ele coloca em risco a sua segurança e até de sua família quando leva alguém junto com familiares”, afirma o policial, acrescentando: “É importante lembrar que, quando esse motorista é abordado numa fiscalização e constata-se que ele está recebendo algum tipo de vantagem para realizar o transporte, pode ter o veículo apreendido e pagar multa”.

No caso do passageiro, o subtenente Almeida alerta que o carona pode deparar-se com um motorista que não tem a prática de dirigir na estrada. “Como não é profissional, não tem o curso específico para este fim, colocando em risco a segurança dos ocupantes. Além disso, o automóvel pode não ter passado por uma inspeção veicular adequada pelo DER ou pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O melhor é que este tipo de prática seja evitada.”

A Lei nº 19.445/11 pune esse transporte com apreensão do veículo, multa de R$1.361,45 (dobrada na reincidência), além do pagamento de taxas, despesas com transbordo dos passageiros, remoção e estada do veículo.

‘Economizo a metade da passagem’, diz caroneira

Apesar da ilegalidade, os adeptos da “carona solidária” têm outra visão sobre esta modalidade de transporte. Há um ano oferecendo vagas no seu carro, um servidor público, de 37 anos, que mora na capital mineira, conta que, além da economia, a experiência tem lhe rendido amizades e boas histórias para contar. “Procuro dar carona para gente conhecida, porque não sabemos o que o carona pode estar transportando. É um risco sim, sei das minhas responsabilidades e dou manutenção periódica no veículo”, garante. Ele faz a rota Juiz de Fora/Belo Horizonte/Juiz de Fora todo fim de semana, mas também viaja para o Rio esporadicamente, sendo que pede a ajuda de R$ 50 para BH e R$ 40 para o Rio.

O servidor admite que nunca enfrentou um momento de risco, mas de tensão. “A PM do Rio me pediu que parasse na Linha Vermelha, e eu estava com três caronas. Foi tenso, mas, graças a Deus, foi só uma abordagem de praxe.” Ele relata que não sabe dizer o quanto economiza, mas, se não fosse pelas caronas, não conseguiria vir para Juiz de Fora, onde mora sua família e sua namorada, todos os finais de semana. “Não é propriamente uma atividade lucrativa, mas ajuda bem. Deixo o pessoal em casa. Sai elas por elas. Não lucro, mas também não saio no prejuízo”, conclui, acrescentando: “O pessoal reclama dos ônibus demais. O preço é quase o dobro, e o tempo da viagem de ônibus também é maior. Toda semana tem três, quatro na lista de espera. Meu carro tem ar, ouço MPB, e eles adoram. Fiz amizades, tem sido uma experiência incrível”, diverte-se.

Na opinião de quem senta no banco ao lado do motorista, a praticidade e a economia falam mais alto. Uma mestranda da UFJF, de 24 anos, pega carona pelas estradas desde a faculdade e, na maioria das vezes, com pessoas desconhecidas. “Economizo a metade da passagem e nunca tive problemas e nem uma situação de apuro”, comemora a estudante que faz as rotas Juiz de Fora/Três Corações, Juiz de Fora/Rio, Juiz de Fora/Barbacena e Juiz de Fora/BH. Quando questionada sobre os riscos, ela disse que não pensa neles. “Porque nos grupos há sempre indicações e, quando há incidentes, costumam relatar por lá mesmo. São pessoas que frequentemente dão carona e já fazem a rota há muito tempo.”

Fiscalização e ações educativas

O DER/MG informou que realiza ações rotineiras de fiscalização no combate ao transporte irregular de passageiros em consonância à Lei Estadual 19.445/2011, que proíbe qualquer tipo de transporte remunerado de pessoas que não seja autorizado por ele ou pela Secretaria de Estado de Transporte e Obras Públicas (Setop). O órgão ainda salientou que, por meio de ações educativas, faz alertas dos perigos de quem faz a opção de realizar viagens em veículos irregulares. Durante as abordagens, já foram flagrados veículos com pneus deteriorados, manutenção precária, motoristas alcoolizados e realizando tráfico de drogas e contrabando.

Já o Sindicato das Empresas do Transporte de Passageiros (Sindpas/MG) afirmou que a realização de qualquer transporte remunerado depende de prévia autorização do Poder Público. Logo, a prática de oferecer caronas pagas trata-se de uma atividade ilegal.

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Danos

Conforme o Sindpas, o transporte ilegal deve ser tratado como ofensa a toda coletividade, pois prejudica a arrecadação de tributos, reduz a oferta de empregos formais, provoca a decadência ou paralisação do serviço público, causa prejuízos aos consumidores, fortalece o poder paralelo e a prática de atividades criminosas conexas ao serviço, aparentemente inofensivo.

Quanto aos usuários das “caronas” pagas, o Sindpas afirma que é importante que reflitam sobre os riscos e danos irreversíveis que poderão sofrer, uma vez que colocam em risco a própria vida, já que nem sabem se terão assistência em caso de acidentes.

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