Microcefalia é ‘ponta do iceberg’ de danos causados pelo zika, diz estudo


Por Carla Duailibi

23/08/2016 às 20h56- Atualizada 24/08/2016 às 08h17

Reprodução
De acordo com o estudo, os crânios dos bebês frequentemente tinham aparência “desmoronada”

Um novo estudo liderado por cientistas brasileiros mostrou que a microcefalia é apenas uma entre várias alterações cerebrais provocadas pela infecção congênita pelo vírus zika. O estudo, publicado na revista científica Radiology, descreveu com precisão as áreas do cérebro mais afetadas e o grau de severidade dos danos. De acordo com os autores, o estudo, que incluiu 45 bebês nascidos no Brasil infectados com zika, é a maior coleção de imagens dos danos causados pelo vírus além da microcefalia. Os crânios dos bebês frequentemente tinham aparência “desmoronada”, “com suturas sobrepostas e dobras redundantes na pele”, segundo o artigo.

A pesquisa foi realizada por cientistas do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor), com sede no Rio de Janeiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Instituto de Pesquisa Professor Amorim Neto (Ipesq), em parceria com a Universidade de Tel Aviv (Israel) e do Hospital Infantil de Boston (Estados Unidos).

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Usando tomografia computadorizada, imagens de ressonância magnética e ultrassom, o estudo avaliou mulheres grávidas, fetos e recém-nascidos infectados pelo vírus da zika, de acordo com a autora principal do artigo, Fernanda Tovar-Moll, pesquisadora do Idor e da UFRJ. Segundo ela, o estudo foi “essencial para identificar a severidade das alterações neurológicas induzidas pela infecção viral no sistema nervoso central em desenvolvimento”. “Nós estamos desenvolvendo um estudo de seguimento para investigar como a infecção congênita pelo vírus da zika pode interferir não apenas no período pré-natal, mas também na maturação pós-natal do cérebro. A microcefalia é apenas a ponta do iceberg”, disse Fernanda.

Outra autora, Deborah Levine destacou a importância de descrever diferentes más-formações causadas pelo vírus da zika nos cérebros dos fetos e dos bebês recém-nascidos. “O primeiro trimestre é o momento no qual a infecção parece ser mais arriscada para a gravidez. Do ponto de vista das imagens, as anomalias no cérebro são muito severas em comparação a outras más-formações congênitas”, disse Deborah.

Ao contrário do que se observa em outras infecções como toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus e herpes, os cérebros dos fetos e bebês infectados pela zika apresentaram más-formações corticais e modificações localizadas na junção da massa branca e da massa cinzenta do cérebro. Os cientistas também identificaram a redução do volume cerebral, anomalias no desenvolvimento cerebral e ventriculomegalia – um problema caracterizado quando as cavidades do cérebro, preenchidas por fluidos, são maiores que o normal.

Embora quase todos os bebês avaliados no estudo tenham apresentado anomalias na circunferência da cabeça, casos de circunferência normal também foram registrados em bebês com ventriculomegalia severa. Os resultados indicaram também anomalias no corpus callosum – um feixe de fibras nervosas que permite a comunicação entre os hemisférios direito e esquerdo do cérebro -, afetando a migração neuronal, isto é, fazendo com que os neurônios não se movessem para a destinação correta no cérebro em formação.

De acordo com o artigo, de junho de 2015 a maio de 2016, 438 pacientes deram entrada no Ipesq com erupções na pele durante a gravidez ou suspeitas de anomalias no sistema nervoso central dos bebês. Nesse grupo, os cientistas identificaram 17 fetos ou recém-nascidos de mulheres que tinham feito exames de imagem no Ipesq e com infecção por zika detectada nos fluidos ou tecidos. Outros 28 fetos ou recém-nascidos apresentavam diagnóstico presumido de zika e tinham calcificações intracranianas.

Entre os bebês com zika confirmada, 94% apresentavam anomalias no corpus callosum. No grupo com diagnóstico presumido de zika, 79% apresentavam esse problema. “A severidade das más-formações corticais associada às alterações nos tecidos e a localização das calcificações na junção entre massa branca e massa cinzenta foram os achados mais surpreendentes da nossa pesquisa”, disse Fernanda. A equipe de pesquisadores realizará mais estudos, que vão correlacionar as modificações morfológicas observadas no estudo aos dados clínicos e imunológicos e às informações sobre o ambiente onde as mães foram infectadas.

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