Bata, filho, eu te ensino como é


Por Daniela Arbex

16/12/2018 às 08h50

Émile Durkheim, o criador da sociologia da educação, sempre defendeu que a socialização da jovem geração é feita pela geração adulta. Para o francês, o papel da ação educativa é formar um cidadão que tomará parte do espaço público. Considerado um dos mentores dos ideais republicanos de uma educação pública e laica, o sociólogo falava sobre o peso da escola na formação da criticidade do aluno. Parceira fundamental no processo de aprendizagem, a escola ajuda a construir caminhos, mas não conseguirá ensinar sozinha os valores que a criança não aprendeu em casa.

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A cena na qual um pai no Distrito Federal segura um menino de 6 anos para que seu filho possa bater nele chocou o país pelo tamanho da covardia. No episódio, registrado por câmeras de segurança, os dois meninos jogavam bola juntos, quando um deles – o que seria obrigado a se tornar agressor -, cai sozinho durante um drible e bate o queixo no chão. Machucado, o garoto deixa a quadra e relata para o pai a sua versão da história. Em alguns minutos, um homem visivelmente alterado entra na quadra, segura o garoto e determina que o filho o agrida. A esposa desse homem também invade a quadra e empurra o menino, após gritar com ele.

O que chama atenção nesse flagrante doloroso de desamor não é apenas o uso desigual e irracional da força, mas o simbolismo no gesto de um pai que não está ali para “defender” um filho, mas para ensiná-lo que não há limites e que a saída para qualquer dificuldade é a violência. Quando crianças se tornam agressivas, arrogantes e desconfiadas, é preciso analisar o ambiente em que elas vivem. Ensinar um filho a se defender na vida não exige dominar técnicas de ataque, mas instrumentalizá-lo para que aprenda a ser justo, íntegro, bom. Mostrar como se bate é a tarefa mais fácil. Difícil é exemplificar a cordialidade, a solidariedade, a ombridade, o espírito esportivo em momentos de vitórias e de derrotas.

Quando a gente olha um gesto desses consegue compreender de onde saíram pessoas que se comportam feito pitbuls diante daqueles que consideram diferentes. Consegue enxergar como nasce a falta de crítica em relação à comportamentos socialmente equivocados de seres humanos que são incapazes de aceitar algum tipo de não. O triste nessa história é que filhos de pais assim poderão aprender da pior forma que não se conquista nada no grito. Quanto mais força a gente emprega ao jogar uma bola contra a parede, com mais força ela voltará, certeira, na nossa direção. Não se trata de mais sorte ou azar. Ação e reação é lei da vida.

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