Grandes poderes vêm com grandes responsabilidades.

Desde que a internet se tornou colaborativa ou, se preferir, desde a web 2.0, que deu poderes de emissor ao receptor, estamos vivendo uma verdadeira revolução no processo de comunicação.


Por Marcos Villas Boas, Sócio da República Comunicação, Professor do curso de Publicidade e Propaganda e tenista nas horas vagas.

01/04/2018 às 09h47

Desde que a internet se tornou colaborativa ou, se preferir, desde a web 2.0, que deu poderes de emissor ao receptor, estamos vivendo uma verdadeira revolução no processo de comunicação. A verdade nua e crua é que nunca na história desse planeta, o consumidor teve tanto poder em suas mãos, desde que elas estejam próximas de um computador ou celular, ambos com conexão à World Wide Web. Todos nós, conectados, somos “Willian Bonners” em potencial. Geramos conteúdo, curtimos, comentamos, somos ativos, podemos ajudar a construir ou destruir uma marca. E mais: temos amigos, curtidores, seguidores, fãs. Enfim, o que falamos tem ressonância.

Essa história de internet e poder, me faz lembrar de um amigo de Caxambu, capital do Sul de Minas. Desde que criou seu perfil no Facebook, se encheu de coragem e ousadia, se tornando um grande especialista em generalidades. Para tudo tem uma teoria, um comentário, uma análise. E em tempos de muita opinião e pouca reflexão, vem postando atrocidades incríveis. A sorte é que, como não é muito adepto das novas tecnologias, não percebeu que suas postagens não estão em modo público. Ou seja, seu pensamento abstrato só chega à esposa e a alguns amigos, que com discernimento, nunca compartilharam seus posts.

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Para Martha Gabriel, um dos pensadores digitais mais influentes do Brasil e uma das maiores autoridades do país no assunto, estamos vivendo a Inversão do Vetor de Marketing, um fenômeno de mudança na comunicação entre anunciantes e consumidores. No marketing tradicional, de massa, a comunicação sempre se deu no sentido da marca para o consumidor, porém, com a evolução da internet e os mecanismos de pesquisa, a comunicação passa a ser direcionada do consumidor para a marca: é ele que diz o que, quando e onde quer algum produto ou serviço. E também, o que não quer ver ou ouvir. É aqui que as marcas vêm sofrento bastante. Quaisquer discursos, enganosos ou oficiais, são destruídos por milhares de compartilhadores ferozes. Criterioso, detalhista, cheio de propósito, de crenças, de mimimi, em alguns casos, e extremamente poderoso: este é o consumidor de hoje, que vem tirando o sono dos profissionais de marketing.

Exemplos, temos aos montes. A campanha “Viva Redondo” da Skol, para o carnaval de 2015, que continha frases como “Deixei o não em casa” teve, em um dia, quase 5 mil compartilhamentos acusando a marca de apologia ao estupro. O resultado foi imediato: toda a campanha foi reformulada. A Santher – Fábrica de Papel Santa Teresinha S/A, dona do Papel Personal Vip Black, recebeu muitas críticas e foi acusada de racismo por usar como slogan, o nome de um movimento negro: Black is beautiful. O boicote ao Santander no caso Queermuseum; ao Boticário pela campanha “Dia de todos os namorados”; o recente boicote à Netflix em função da série Mecanismo são outros bons exemplos do poder dos consumidores quando conectados.  Esse caso da Netflix merece até um comentário a mais. Se a série irritou os simpatizantes da esquerda, a resposta dada pela empresa de streaming a Flávio Bolsonaro – “ Você está louca, querida.” – foi uma forma irreverente e inteligente de tentar reverter este quadro.

Na nossa terrinha, já tivemos alguns momentos assim, onde memes piporacam no JF da Depressão para alegria ou desespero de algumas marcas. Agora, com certeza, o maior de todos foi protagonizado por Tarcísio Dalpra e sua equipe, da então Pinball Propaganda. Seu anúncio para o Moviecom Cinemas, divulgando o filme Golpe Duplo, com Rodrigo Santoro, fez um estrondoso barulho nas redes sociais. O título -“Um filme repleto de golpes e falcatruas tinha que ter um brasileiro no meio.” – veiculado em 2016, revoltou bastante os mais patriotas. Provavelmente, se fosse veiculado hoje, estaria divulgando algum documentário.

Em alguns casos, a revolta é justa e necessária. Em outros, um mimimi sem sentido que vem deixando a propaganda muito chata. Aliás, a Pepsi Twist fez um comercial abordando exatamente este excesso de policiamento dos atuais consumidores e, acreditem, recebeu enxurrada de críticas nas redes sociais e processo no Conar – Conselho de Auto Regulamentação Publicitária. Mas, isso é assunto para outra coluna. Hoje, vamos finalizar com um conselho de Stan Lee, que se encaixa perfeitamente neste momento feliz e importante de consumidores empoderados: with great power comes great responsibility. Em inglês, que publicitário adora.

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