Forever alone


Por Júlia Pessôa

24/07/2016 às 07h00

Como você e todo mundo, tenho um grupo no WhatsApp com algumas das minhas melhores amigas para discutirmos sobre tudo. Tudo mesmo. Há questões amplas e dignas de textão, como feminismo, ameaça terrorista no Rio, impeachment e violência urbana. Tem as consultas sobre passos que pretendemos dar na vida e precisamos daquela invariável forcinha. Obviamente, existem as piadas internas, os prints de fotos, textos e conversas; indicações e resenhas de séries; e assuntos bestas, com a intenção inequivocável de conversa fiada. Foi assim que começamos a falar sobre Pokémon GO.

Se você não sabe o que é, não se aperreie. Com a chegada do aplicativo no Brasil, muito em breve multidões estarão nas ruas, celular em riste, buscando os bichos que piraram a cabeça da garotada lá pelo fim dos anos 90 ou início dos 2000. Agora a onda é “caçar”, os Pokémons mundo afora, por meio de um sistema de realidade virtual bastante do genial. Com isso, centenas de pessoas saem correndo pelas ruas atrás dos personagens que a tela do celular exibe. Não estou exagerando. Pra você ter uma ideia, o Justin Bieber saiu em busca de umPokémon para chamar de seu numa aglomeração e não foi reconhecido. (Batedores de smartphone já comemoram a vida brasileira do app).

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No nosso grupo, logo a conversa virou Pokémongate. Eu e a Dida, alheias ao universo gamer-pokemônico, achamos uma bobagem sair atrás de bichos virtuais com o celular na mão. Tatá, descolada, disse que não encara, mas destacou o brilhantismo do sistema. A Fefê explicou o processo evolutivo dos Pokémons ao grupo majoritariamente ignorante, mas completou dizendo que é rabugenta demais pra joguinhos. A Lara, incapaz de falar mal de qualquer coisa ou pessoa, achou graça, e sei que não vai embarcar porque correria não condiz com a sua calmaria. Mas a Mari não. A Mari, antenadíssima com a cultura geek e japonesa, disse que ama, conhece tudo, e que vai caçar os dela sem qualquer sombra de dúvida ou constrangimento.

Não demorou e o papo evoluiu para a piada clássica que viralizou na internet : coisas que queríamos que um aplicativo localizasse pra gente. Money GO, mostrando o caminho “de la plata”. Vinho barato GO, porque já viu que absurdo está o preço? Treta GO, para não perder uma chancezinha de problematizar o status quo. Semiconhecidos GO, dando a localização de forçadores de amizade, para que possamos evitá-los. Férias GO; Feriado GO; e, de outro lado, Trabalho GO. Demos nossas risadinhas, desenrolamos mais umas bobeiras, e encerrou-se o Pokémongate.

Passou um dia e o app  já podia ser baixado, na maracutaia, aqui no Brasil. No Twitter, uma ansiosa Mari reclamava de estar, nas próprias palavras, “forever alone” no mapa de usuários. Dei um sorrisinho e pensei que precisávamos hoje é de um Empatia GO. No massacre do “farinha pouca, meu pirão primeiro”, ninguém se importa com a dor logo ao lado. “Dane-se quem vive opressões, tristezas e angústias que não me atingem”, eis o mantra da ordem. “Mais amor, por favor”, desde que seja só em imagem cafona do Instagram, nunca um meio de se doar ao outro, ou, ao menos, sensibilizar-se. No mapa virtual do Empatia GO fictício, tenho a impressão de que estamos, cada vez mais, como a Mari na busca de Pokémons: absolutamente solitários e correndo atrás de algo que não existe.

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