Além do papel
Já dizia o escritor e poeta argentino Jorge Luis Borges: “Sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de biblioteca”. Fosse vivo, Borges talvez ficasse maravilhado com a contemporaneidade, ao perceber que sua ideia de paraíso cabe, literalmente, na palma da mão. Com a ampliação do acesso aos tablets e readers, aparelhos para a leitura de livros digitais, milhares de obras podem ser armazenadas e acessadas a qualquer momento, permitindo que os usuários tenham à disposição onde quer que estejam.
Pouco a pouco, os e-books vêm ganhando mais adeptos no Brasil. Segundo dados da Câmara Brasileira do Livro (CBL), o mercado no Brasil movimentou, em 2013 R$ 12,7 milhões, contra R$ 870 mil reais em 2011. O número de títulos disponível cresceu muito também: há dois anos, eram cinco mil. Agora, são mais de 30 mil. Ainda assim, os livros digitais representam apenas 2,3% de todo o mercado editorial brasileiro, o que corresponde praticamente a dizer que só um a cada 40 livros vendidos é digital.
De acordo com o consultor editorial Carlo Carrenho, este crescimento significativo em um curto espaço de tempo se deu porque, antes, o mercado de e-books nacional era praticamente inexistente. “O catálogo digital ainda cresce muito devagar, mas de forma contínua. O e-book veio para ficar e a curva ascendente que o formato vem fazendo no Brasil se parece muito com a trajetória que ele teve nos Estados Unidos, onde hoje 40% dos livros são digitais.”
Em um estudo com foco no público universitário, apresentado em um congresso internacional em Singapura, a pesquisadora Renata Prado aponta que o perfil específico do leitor juiz-forano acompanha os hábitos de leitura dos brasileiros. “Esta pesquisa revelou que 40% dos estudantes leu menos de quatro livros em 2013, dado compatível com uma grande pesquisa nacional, “Retratos da leitura no Brasil”, divulgada em 2013. Quando perguntados se preferem livro impresso ou digital, apenas 10% alegaram a preferência pelo formato digital. Em minha análise, esse dado é compatível também com o tamanho do mercado nacional de livros digitais, menor que 4%”, aponta Renata.
Futuro ligado ao tablet
Para Carlo Carrenho, um crescimento expressivo no número de leitores de e-books deverá estar ligado ao consumo deles nos tablets, e não nos readers, aparelhos especializados. “O Brasil tem poucos ‘heavy readers’, leitores aficionados, que investiriam em um dispositivo específico para leitura. Por outro lado, brasileiro adora um tablet, há uma previsão de que, em 2014, se venda cerca de 109 milhões de tablets no país”, compara o especialista, em opinião compartilhada por Renata Prado. “Concordo que os tablets tenham mais atrativos para os brasileiros, já que a média de leitura aqui é a menor entre os Brics (agrupamento econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). No entanto, penso que, para a promoção de hábitos de leitura, o uso de readers, que são equipamentos dedicados, seja mais eficaz”, pondera a pesquisadora.
Carlo Carrenho destaca que, nos últimos anos, o investimento das livrarias neste tipo de aparelho demonstra um comprometimento com o mercado de e-books no Brasil. Entre as principais opções de mercado estão, atualmente, o Kindle, da Amazon (pioneiro e até pouco tempo líder do setor), o Kobo, da Livraria Cultura e o recém-lançado Lev, da Saraiva. “Isso sinaliza uma intenção de que haja também um investimento nos acervos, na acessibilidade aos livros, enfim, em um crescimento expressivo dos e-books no país”, destaca o consultor editorial.
Para a pesquisadora Renata Prado um dos fatores que pode impulsionar o aumento do consumo dos livros eletrônicos no Brasil é a associação deste tipo de leitura ao uso de mídias sociais. “O brasileiro se destaca há muito pelo uso intenso de redes sociais online. Muito tem se falado sobre a TV social, ou seja, o uso de mídias sociais enquanto se assiste TV. Tenho pesquisado sobre uma nova forma de leitura, também social, que pode integrar a prática de leitura à troca de informações e opiniões sobre os livros.” De olho nesta tendência, o kobo, da Livraria Cultura, possui a ferramenta Kobo Reading Life, que permite interação entre os usuários, faz estatísticas de leituras e é integrado a várias redes sociais.
Tablet ou reader?
Comparando os dois tipos de aparelho, tablet e reader, independentemente das marcas, o consumidor deve observar as características que mais se adquem ao seu perfil de leitura. Leitores ávidos, que passam muitas horas lendo, podem ver no conforto visual do e-reader um aliado, principalmente se somado à autonomia das baterias – também um ‘plus’ para quem tem o hábito de ler em viagens . A leveza dos dispositivos também é vantajosa em relação ao tablet. No entanto, se a prioridade não for a leitura, é melhor esquecer o e-reader, que só serve para esta função.Para quem é superconectado e não consegue se desligar da internet, o tablet pode ser uma opção melhor, ainda que as diversas funções do aparelho possam ser uma distração da leitura em si.
Políticas públicas
Um fator que deve impactar positivamente as vendas de e-books diz respeito ao seu tratamento em políticas públicas voltadas para a leitura, como a aprovação de modificações na Lei nº 10.753/2010, que institui a Política Nacional do Livro. Uma das propostas é a inclusão de “equipamentos cuja função exclusiva ou primordial seja a leitura de textos em formato digital” na lista de isenções da lei, que já desonera livros físicos. A aprovação da medida tende a ser significativa caso se concretize, já que, conforme relatório da empresa de consultoria alemã Rüdiger Wischenbart, os impostos sobre as importações de eletrônicos chegam a 60% de seu preço.