JF é a segunda cidade do estado com maior taxa de violência doméstica contra a mulher
Dados foram levantados por pesquisador a partir de análises das ocorrências registradas pela Polícia Civil; para discutir essa e outras questões relativas à sobrevivência das mulheres, Fórum 8M-JF organiza marcha e festival cultural
O dia 8 de março é marcado pelo Dia Internacional da Mulher e pela luta pelos direitos femininos. Apesar de avanços, contudo, chama a atenção um estudo feito pelo pesquisador da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Wagner Batella, a partir de análises das ocorrências registradas pela Polícia Civil. A pesquisa mostra que Juiz de Fora foi a segunda cidade do estado de Minas Gerais com maior taxa de violência contra mulheres nos primeiros semestres de 2018, 2019 e 2020. Para discutir essa e outras questões relativas à sobrevivência das mulheres na sociedade atual, o Fórum de Coletivos e Mulheres Feministas de Juiz de Fora (Fórum 8M-JF), com representantes de mais de 50 organizações, realiza uma marcha e um festival cultural na data com o tema “Pela vida das mulheres, em defesa da democracia, dos direitos e contra a fome! Sem anistia!”, na próxima quarta-feira (8).
(Correção: O estudo do pesquisador Wagner Batella leva em consideração os casos de violência doméstica, e não de feminicídio, como havia sido equivocadamente divulgado)
A pesquisa foi desenvolvida no livro “Crime e Território: Estudos e Experiências em Políticas de Segurança Pública”, que discutiu como a violência doméstica e a quarentena se relacionaram. Nesse processo, foram mensurados os índices de violência doméstica entre diferentes bairros, regiões, raças e níveis de escolaridade, por exemplo. As principais denúncias foram relativas a ameaças e lesões corporais. Já o estupro de vulnerável teve variação ascendente, com aumento de 450% no período de 2020 em relação ao ano anterior – foram nove registros em 2020, e dois em 2019 e 2018. Na maioria dos casos, os agressores são os maridos, namorados ou ex-companheiros.
Os dados se repetem quando se analisa o panorama nacional. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houve uma média de quatro casos de feminicídio por dia no primeiro semestre de 2022. Este índice representa um número ainda maior que o total registrado no primeiro semestre de 2021, quando 677 mulheres foram mortas. Desse total de vítimas, 62% eram mulheres negras. De acordo com o fórum, o Brasil também é o país do mundo com mais mortes de mulheres trans e travestis.
Além dos índices de feminicídio, a jornalista Leiliane Germano, integrante do “Coletivo Subverta” e Fórum 8M-JF, destacou, em nota, que a marcha e o festival cultural são oportunidades de enfrentamento a outros desafios impostos às mulheres trabalhadoras, inclusive relativos à diferença salarial. “A precarização do trabalho se intensificou na pandemia de Covid-19. Esse é um dos principais desafios encontrados pelas mulheres trabalhadoras na atualidade. Vejo isso como uma questão nacional. Estamos cada vez mais sobrecarregadas, com duplas e triplas jornadas, recebendo remuneração ainda inferior à remuneração da maioria dos homens e lidando com o desemprego que atinge em sua grande maioria mulheres negras da periferia”, diz.
Evento para discutir questões
O Fórum 8M-JF esclarece que a intenção é valorizar as experiências das mulheres trabalhadoras pertencentes às organizações feministas, aos sindicatos e, também, das mulheres independentes presentes nas reuniões. A militante do Coletivo Pretxs em Movimento e Fórum 8M-JF, doutoranda em Serviço Social na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Lucimara Reis, esclarece que o evento foi construído de forma coletiva.”Foi um chamado aberto, para que todas as mulheres que tivessem interesse em construir essa luta por direitos, contra o capitalismo, antirracista, estivessem presentes nessa construção. O mote foi uma decisão coletiva. Há nele abertura para conversas sobre várias opressões e explorações que o sistema coloca sobre as mulheres”, explica. Também diz que há várias vivências diferentes que foram trazidas para discussão. “O mote contempla um pouco de cada experiência do que é ser mulher no Brasil hoje”, diz.
A assessora de políticas para pessoas com deficiência e vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Rita de Cássia Petronilho Barbosa, esclarece que, para isso, é preciso construir uma luta que seja realmente coletiva e abarque olhares diversos. “É fundamental trazer as pautas das mulheres com deficiência para as discussões dos movimentos feministas, para que juntas possamos buscar e lutar por direitos, mostrando a condição na qual as mulheres com deficiência vivenciam as discriminações, os preconceitos e o capacitismo, que acha que somos incapazes de decidir por nós”, diz.
A artista Adryana RyalPuri, integrante da diretoria da Associação de Produtores de Artes Cênicas de Juiz de Fora (APAC-JF), do Biné Instituto de Arte e Cultura e do Movimento de Retomada Puri Zona da Mata Mineira, acrescenta que esse olhar para a diversidade também deve combater ataques que ocorrem de formas diferentes dentro de vários recortes. “Uma mulher indígena vive sob constante ataque de diversas formas. Quando você acha um coletivo das lutas feministas que te apoia e no qual você é vista não só como mulher, mas como mulher indígena, mulher Puri, e você tem o direito e o poder de falar e dar voz, é mais do que importante. É necessário para a sobrevivência humana”, diz. Para ela, é sempre importante que as mulheres andem juntas nessa luta. “A caminhada não se constrói sozinha. Às vezes, você está sozinha numa caminhada, mas ela não se constrói sozinha. O caminho é lapidado dentro de um coletivo. O coletivo feminista faz isso, permite que a caminhada seja contínua.”
Marcha e eventos culturais
A marcha organizada pelo Fórum de Coletivos e Mulheres Feministas de Juiz de Fora vai percorrer diversas vias do Centro da cidade, partindo da Avenida Rio Branco e seguindo pela Rua Mister Moore e Avenida Getúlio Vargas, com concentração às 17h. Ao final da caminhada, vai retornar ao Parque Halfeld, onde vão acontecer as manifestações culturais feitas pelo Coletivo Resistência Puri, dos grupos Muvuka, Ingoma, XotaEfe e Charmosas do Tamborim. Além disso, também estão confirmadas as artistas Sandra Portela e Ciça Liberdade, Mcs e as poetas Sophia Bispo, Jyce Mirella e Nalu.
A organização do evento, ainda, afirma que “todas, todes e todos estão convidados a participar”. As ações realizadas, como explicam, querem alertar a sociedade juiz-forana sobre “o cenário de violências e a necessidade de organização coletiva para transformar essa conjuntura” no que se refere à vida das mulheres.