Presente e futuro no comércio, na indústria e nos serviços

Imersos na quarta revolução industrial, empresas dos mais diversos ramos investem em tecnologia de ponta para otimizar seus processos


Por Sandra Zanella

04/09/2022 às 07h00

A Tribuna chega aos seus 41 anos em plena era da Inteligência Artificial (IA) e da chamada “quarta revolução industrial”. Cada vez mais presente também no comércio e nos serviços, as novas tecnologias mudam as formas de fazer e pensar, desafiando profissionais das mais diversas áreas. Juiz de Fora, que já foi considerada a Manchester Mineira por seu desenvolvimento industrial, não poderia estar fora dessa “nova onda” e mostra que não só já utiliza IA em empresas, como a MRS Logística, como é responsável por lançar ao mercado profissionais preparados para a indústria 4.0, por meio do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).

O professor da instituição de ensino Daniel de Paula reforça que o desenvolvimento tecnológico sempre afetou a forma como a indústria exerce suas atividades. “Particularmente a terceira revolução industrial, na década de 1970, permitiu que os processos se tornassem automáticos. Ou seja, a partir de sinais advindos de sensores, processadores programados pelo homem já se tornaram capazes de responder e intervir nesses processos. Saímos da era das válvulas para a era dos semicondutores, a microeletrônica nasce a partir daí. E esse cenário foi suficiente, por muitos anos, para aumentar a produtividade das indústrias drasticamente. Mas agora, diante do cenário social e tecnológico mais complexo, com geração de volume de informação gigantesca, esses sistemas automáticos deixam de ser soluções otimizadas, tornando-se necessários sistemas autônomos, capazes de aprender com suas próprias observações, que não sejam totalmente dependentes de uma programação prévia do ser humano.”

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Nesse sentido, Daniel define IA como um universo de tecnologia computacional capaz de exibir informações que remetem à inteligência humana, fazendo com que os sistemas tornem-se efetivamente autônomos. “Na medida em que recebe mais informações, é capaz de se reprogramar para desempenhar tarefas específicas com mais eficiência. Existe uma programação prévia, mas esses algoritmos são capazes de aprender com as próprias entradas e decisões que vão tomando. Já a aprendizagem profunda (“deep learning”) seria um subconjunto dessa aprendizagem de máquina e aprimora, independentemente da intervenção humana, a execução de determinadas tarefas, entregando resultados com excelência”, conclui. “As indústrias entenderam que utilizar IA, com suas variações, nos processos de tomadas de decisões, é o grande passo que a quarta revolução industrial, ou o que chamamos de indústria 4.0, trouxe para nós: o computador é capaz de otimizar as decisões que o ser humano toma e, muitas vezes, de aprender, compreender e perceber detalhes que fogem aos olhos e à percepção do ser humano dada a complexidade e magnitude de dados que temos disponíveis.”

No Senai, tecnologias e conceitos da indústria 4.0 são aplicados em laboratórios para preparar os alunos para que possam implementar novas metodologias no mercado (Foto: Divulgação)

IA está no dia a dia do cidadão comum

Para exemplificar como a IA está presente no dia a dia da maioria das pessoas, o professor do Senai cita o serviço de streaming mais popular: Netflix. “Os sistemas de recomendação são todos embasados em algoritmos de IA. Oferecem 30 dias de uso gratuito da ferramenta e têm esse prazo para te seduzir a adquirir a plataforma. Se indicar filmes do gênero que não gosta, a probabilidade de você aderir vai diminuir exponencialmente. Por isso, cria algoritmos para criar métricas de relacionamentos, os ‘likes e dislikes’, também usados no YouTube, para que a partir desses dados sejam capazes de orientar os sistemas de recomendação mais assertivos diante do seu gosto para que, de fato, consiga te converter como cliente da plataforma.”

A IA talvez seja ainda mais perceptível nas redes sociais, como Instagram, Twitter e Facebook, sendo esse último considerado como precursor nessa área. “É até um ambiente mais desafiador, porque são dados não estruturados. Usam muitos algoritmos de aprendizagem para evidenciar padrões que o próprio olho humano não é capaz de identificar. A grande diferença é a capacidade computacional de processar grande quantidade de dados, os adventos do ‘big data’ e do ‘deep learning'”, comenta o docente.

Para quem precisou mergulhar no mundo da IA para conseguir se manter bem posicionado no mercado, o desafio é constante. Proprietária das lojas de roupa Moda Express, Moda Express Fun e Drop’s Spazio, a empresária Silvana Souza se reinventou na pandemia para manter sua receita, aprimorando os canais de comércio on-line para atender esse público. “Atualmente nossas vendas presenciais tiveram um aumento expressivo, com o retorno das pessoas às lojas físicas. Continuamos com as vendas on-line, só que hoje em proporções menores, totalizando 25%, tanto pelo Instagram quanto pelo WhatsApp.”

Apesar da experiência antecipada pela Covid-19, quando metade dos negócios era feita pelo aplicativo de mensagens e 30% pelo Instagram, Silvana diz ainda estar desbravando o universo da rede social que utiliza IA. “Estamos lutando com os algoritmos do Instagram, que a cada dia passa por atualizações. Precisamos também nos atualizar para tentar acompanhar.” Segundo ela, clientes reclamam de não ver mais o conteúdo das lojas com frequência como era há pouco tempo. “O Instagram tem ‘sabotado’ muito as empresas com essas atualizações, deixando de enviar conteúdos que anteriormente eram vistos por muito mais seguidores, nos obrigando a fazer anúncios pagos para que esse conteúdo que atingia organicamente um público seja visto somente a partir desses impulsionamentos.”

Para a empresária, essa revolução no âmbito virtual ainda é desorganizada. “Estão fazendo testes sempre, não sabem ao certo o que mais funciona, e nós somos as cobaias. Estamos tentando nos adaptar a essas mudanças que são da noite para o dia e tentando correr lado a lado com essa tecnologia que ainda não dominamos. Temos que estar nos atualizando ‘full time’, e isso tem se tornado desgastante.”

Do self-checkout ao sistema de IA para ofertas

Rede Hortifruti Natural da Terra tem caixas de autoatendimento (self-checkout) em todas as suas lojas no país (Foto: Divulgação)

Fora das telas, os juiz-foranos também esbarram em tecnologias quando vão às compras. Na rede Hortifruti Natural da Terra os avanços vão desde os caixas de autoatendimento (self-checkout) até um sistema de IA voltado para ofertas personalizadas. “É uma experiência inovadora que permitiu sermos um dos poucos supermercados no Brasil com todas as lojas tendo self-checkout. Nos próximos anos pretendemos refinar a tecnologia e apostar em outras opções, como lojas autônomas”, revela a gerente de inovação da rede, Fernanda Junqueira.

Segundo ela, a vantagem principal é a conveniência e velocidade para compras de baixo volume. “Para lojas menores esse é o futuro, sem dúvida. Em compensação, para compras maiores ainda é mais rápido passar pelo caixa convencional. Além de que alguns clientes ainda prezam pelo contato humano, a conversa no final da compra, o modo tradicional. Alguns já conhecem as pessoas dos caixas e não trocam essa interação por uma tecnologia.” Questionada sobre a confiança no cliente, que deve ser responsável por passar corretamente os itens e realizar o pagamento, ela pondera haver diversas formas de controle, como câmeras, sensores na balança e os próprios fiscais de caixa. “Estamos sempre em busca da opção que menos atrapalhe o cliente e seja viável para operação rodar.”

Patrícia Carneiro, head de CRM & Analytics do Hortifruti, conta as vantagens de um sistema de IA. “Estamos fazendo ofertas personalizadas utilizando um algoritmo de inteligência artificial que identifica para cada cliente quais são os produtos que ele não compra conosco, mas que tem potencial de comprar. Basicamente, o algoritmo analisa as cestas de compras dos clientes e verifica em cestas similares quais produtos estão faltando, e aí fazemos uma oferta especifica para este cliente neste produto especifico. Essa é uma forma inteligente de aplicar descontos de forma cirúrgica com o objetivo de aumentar a cesta dos clientes e, por consequência, seu ticket médio. Também é uma forma de criar experimentação e atrair novos clientes para categorias especificas.”

Segundo Patrícia, a experiência tem cerca de dez meses e demonstra bons resultados. “Temos conseguido aumentar o volume de itens por ticket dos clientes que compram as ofertas personalizadas. Essa ação possui um excelente retorno sobre investimento e queremos potencializá-la cada vez mais”.

Criando bases de dados

O professor Daniel de Paula comenta que o esforço utilizado por vários setores do comércio para criar lastro de compras, como as farmácias têm feito, também é no intuito de criar bases de dados. “De modo geral, o varejo incorporou bem essa ideia. E o Facebook foi a primeira grande manifestação desse tipo de ação. Desde a sua origem vem com intuito de coletar manifestações de análise de sentimento (likes) para criar grupos e direcionar o mercado, oferecendo os dados a empresas que querem atingir determinado público-alvo. E quem consome essa informação maximiza retorno.”

Para Daniel, a IA, assim como a revolução da indústria 4.0, iniciada a partir de 2010, é o presente sendo construído, porque ainda não chegou ao seu pleno desenvolvimento. “A cada dia que passa esses passos se tornam muito significativos. Tudo é muito rápido com a capacidade de autoaprendizado que as máquinas começam a demonstrar.” Ele reforça que a ideia não é substituir o homem. “O mais correto é pensarmos como um novo modelo de mercado. A grande ideia não é trocar o homem, mas colocá-lo no posto de fazer cada vez mais o uso de suas faculdades intelectuais.”

MRS aposta em IA para otimizar manutenção

Apostando em inovação por meio da compra e do desenvolvimento de novas tecnologias, a MRS Logística é um forte exemplo na cidade de empresa que já aplica a IA. Além da utilização de dados, a concessionária que administra a ferrovia que corta o município rodou recentemente um trem não tripulado e testou manobras de locomotiva via controle remoto, enquanto robôs da indústria 4.0 auxiliam na manutenção de vagões. Por meio do programa de inovação aberta Open MRS, a empresa vai ao mercado colher ideias, inclusive de startups, sobre temas específicos que precisam ser desenvolvidos. De forma democrática, os colaboradores também têm à disposição ferramentas que podem levar à criação de aplicativos, processos e controles automatizados, com o intuito de que usem a criatividade para criar soluções baseadas em dados e automação.

“Estamos muito empolgados com o uso de tecnologias para maximizar resultados, sejam eles de impacto de produtividade ou na comunidade. Há inúmeros ‘cases’ na MRS utilizando os mais diversos tipos de inteligência de dados, artificial, predição, machine learning (aprendizado de máquina), algoritmos de otimização”, destaca o gerente geral de Planejamento e Controle da Manutenção da MRS, Gláucio Marcel.

Ele cita três categorias relacionadas à inteligência de dados. A primeira delas é automação de processos. “Em atividades que dependiam de envio de e-mails, de troca de mensagens por alguma ferramenta, o sistema está nos ajudando a ter processos automatizados. Nos tempos definidos, já requer que a pessoa atualize determinado tipo de informação ou já a busca em algum sistema.” Na predição, muito usada na área da engenharia, “utilizamos dados históricos dos nossos sensores para predizer falhas ou algum impacto operacional, para tratarmos antes que a falha ocorra”. Já a mais utilizada no setor de Planejamento e Controle da Manutenção é a de otimização. “É uma forma de alocar recursos de uma maneira mais inteligente. Temos hoje um conjunto de ativos (vagões, locomotivas e malha ferroviária) muito grande. Cada um tem especificidades, necessidades e escopos de manutenção diferentes, e os locais onde fazemos são dispersos. Precisamos combinar todos esses fatores para otimizar o uso de recursos, ter uma produtividade mais elevada, minimizando impacto operacional, reduzindo custos e aumentando o resultado das nossas atividades.”

Otimização

As socadoras são equipamentos para correção geométrica da malha ferroviária e, na MRS, são alocadas com auxílio de inteligência artificial (Foto: Divulgação)

Dentro do contexto de otimização, Marcel cita dois casos, um deles voltado para os vagões e o outro para a malha ferroviária administrada pela MRS, sendo esta considerada a via permanente de 1.643 quilômetros, por onde o trem circula sobre camadas de trilhos, dormentes e brita (lastro), incluindo as plataformas, sinalizações e a parte de eletroeletrônica. “Para essa manutenção da malha, temos um conjunto de 12 equipamentos para correção geométrica, chamados socadoras.” Os trabalhos são geridos por meio de 20 coordenações e 32 painéis de operação. “Tenho que distribuir essas 12 socadoras, considerando a necessidade do trecho, a característica da máquina e o momento. Então há um conjunto de variáveis nesses 32 locais, para essas 12 socadoras, nas 52 semanas do ano, somando também as variáveis de atividades predecessoras e sucessoras. Contabilizando tudo isso, é um conjunto de linhas que o ser humano não consegue fazer uma locação ideal para maximizar o resultado. Temos muita dificuldade em pegar uma planilha com centenas de milhares de linhas e dizer em que dia determinada máquina vai trabalhar em cada local, considerando a produtividade e a característica técnica.”

A partir dessa questão, a IA surgiu como resposta, na criação do “otimizador de socadoras”. “Especialistas e analistas estudaram uma ferramenta e usamos um algoritmo de programação em conjunto com pesquisa operacional para termos essa otimização. Com ajuda de uma empresa terceira que tem cientistas de dados, esses especialistas desenvolveram esse algoritmo de programação, que combina essas variáveis e sugere a melhor alocação das socadoras. Isso nos trouxe um ganho de, aproximadamente, 10% da nossa capacidade de socaria, o que corresponde a praticamente uma máquina que deixamos de comprar. Fizemos um cálculo em 2021 e, se tivéssemos que alugar uma máquina, teríamos gasto R$ 3 milhões. E esse ganho que tivemos no primeiro ano vai ser recorrente”, comemora Marcel.

O segundo caso de uso de IA na MRS ainda está em desenvolvimento e também é um otimizador, só que referente à destinação de vagões para oficinas. “Temos uma frota hoje de pouco mais de 18 mil vagões na empresa, e cada qual tem uma característica específica, o momento em que realizou a última manutenção e um conjunto de subcomponentes que precisam ser manutenidos, cada um na sua periodicidade. E temos seis oficinas para as quais podemos destinar esses vagões. Da mesma forma, vimos que o ser humano tinha uma dificuldade de programar esses 18 mil vagões, pois se multiplicarmos pelo número de componentes, vamos achar algumas centenas de milhares de linhas para programar para cada uma das seis oficinas. Hoje quem faz isso são pessoas, utilizando planilhas, e elas mesmas estão desenvolvendo um algoritmo de decisão.”

A projeção de ganhos, conforme o gerente, é relacionada à maior disponibilidade dos vagões. “Vão ficar menos tempo em circulação e em uma oficina que, eventualmente, não está pronta para atender.” A economia preliminar estimada gira em torno de R$ 13 milhões, levando-se em conta aquisições de cerca de 20 vagões que deixarão de ser feitas, pelo maior desimpedimento daqueles já existentes. “Reduz o tempo de trânsito e de processamento do vagão na oficina.”

Segundo Marcel, os dois projetos foram viabilizados dentro do Comitê de Inovação. “Estamos na fase de escolha do parceiro, da empresa que vai ajudar com cientistas de dados no desenvolvimento dos algoritmos para otimização.”

IA também permite avanços na medicina

Gustavo Ramalho: “A ética e a moral têm que doutrinar as ferramentas de IA ou de qualquer outro avanço” (Foto: Leonardo Costa)

Apesar de já estar envolvida em alguns tipos de procedimentos médicos, a IA está muito presente na gerência de dados da saúde que podem trazer as mais diversas soluções. “A IA consegue buscar em sistemas que estão sendo desenvolvidos dados de prontuários que vão facilitar o nível de segurança do paciente, por exemplo, sabendo que tipo de evento adverso pode ter acontecido. Com isso é possível otimizar os mecanismos de segurança preventiva dos pacientes internados e definir um perfil epidemiológico claro do tipo de paciente que está sendo admitido em qualquer hospital. Então pode ser uma ferramenta de saúde pública”, avalia o diretor de Novos Negócios do Hospital Monte Sinai, Gustavo Ramalho.

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O cardiologista intervencionista pondera que no Brasil os dados de pacientes não costumam ser estruturados de forma adequada. “A IA é um mundo, um sistema que aprende por si mesmo. Mas é preciso ter dados organizados que vão dar possibilidade de tirar informações.” Outro viés forte na medicina ligado à IA, segundo ele, é relacionado a diagnóstico por tomografia e ressonância. “Um algoritmo consegue detectar alterações que o olho humano não conseguiria. É um olhar criterioso em cima de um diagnóstico, seja por imagem ou vários outros procedimentos na medicina.”

Ele acredita que em pouco tempo a IA na saúde vai tornar realidade o que era possível apenas nos filmes futurísticos. “Você vai olhar no espelho e saber quanto está sua temperatura, taxa de oxigênio, frequência cardíaca, níveis de glicemia e colesterol, apenas por um scanner do espelho em cima do seu corpo.”

Reconstrução de órgãos

Na área da indústria 4.0, Ramalho cita a reconstrução dos órgãos por meio de impressoras 3D e comenta o exemplo ocorrido nos Estados Unidos de transplante de coração feito com o órgão de um porco, que foi descelularizado. Sobre a estrutura, foram cultivadas células-tronco do próprio paciente. “No futuro talvez eu não vá precisar do coração de um porco: eu vou escanear o coração do paciente, construí-lo em impressora 3D, pegar célula-tronco desse paciente e fazer com que cresça sobre aquela estrutura básica.”

Conforme Ramalho, a medicina regenerativa também está sendo muito focada, devido à longevidade. “Existem estudos falando que a pessoa que vai ter 100, 120 anos já nasceu. A tendência é nos tornarmos amortais: vamos morrer de acidentes, mas não mais de doenças.” Ele acrescenta que as cirurgias estão cada vez menos invasivas e mais robóticas. “Existem estudos de aparelhos que fazem angioplastia à distância.”

Sem entrar em detalhes, o diretor de Novos Negócios do Monte Sinai revela que grandes avanços estão para chegar a Juiz de Fora nos próximos meses, nas áreas de robótica, medicina regenerativa e sistemas de IA. “Isso independe de ser hospital de saúde suplementar ou SUS, porque os benefícios vão vir para todo mundo. É só saber extrair o melhor dado e ofertar a melhor ação para aquele grupo de pacientes.”

Telemedicina

Mirando no presente, Gustavo Ramalho aponta para a telemedicina, que ganhou força na pandemia, proporcionando consultas, monitoramentos à distância, troca de informações e de resultados de exames. “Há sistemas de análise de eletrocardiograma com IA. Se eu tenho um paciente onde não há cardiologista, o eletro é transmitido (por celular), uma IA bate o olho e vê se está alterado. Se estiver, aciona o cardiologista para analisar de uma forma emergencial.” Em breve, ele acredita, o próprio laudo poderá ser emitido por meio de IA, com a chancela do médico. “A telemedicina é um caminho para conectar pessoas, e a IA pode estar associada ou não, em termos de fazer diagnóstico e de ver o que nós não temos a capacidade de ver.”

Apesar de tantos benefícios com os incrementos tecnológicos, o médico faz uma ressalva em relação às tecnologias que estão por ser implementadas: “A ética e a moral têm que doutrinar as ferramentas de IA ou de qualquer outro avanço”, considera ele, sobre as mudanças na forma do “pensamento não humano”.

Jovens constroem futuro tecnológico

O analista de tecnologia Carlos Henrique Monteiro, que atua na área de projetos de inovação para a indústria no Laboratório do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai LAB), que funciona na Barreira do Triunfo, Zona Norte de Juiz de Fora, explica por que a chamada indústria 4.0 é a quarta revolução industrial. “A primeira foi a mecanização das máquinas, principalmente com os teares; a segunda, a eletrificação: máquinas e motores elétricos que contribuíram para um avanço tecnológico; a terceira coloca a automação nas indústrias, com os controladores lógicos, sistemas de supervisão e robôs convencionais. De uns anos para cá, começou um movimento (tecnológico) na Alemanha, que se expandiu para Estados Unidos, China e hoje já está praticamente no mundo todo.”

Ele acrescenta que, nesse novo contexto, os profissionais e o próprio mercado estão sendo preparados para fazer a indústria 4.0 acontecer. “O Senai, como apoiador da indústria, tem tentado buscar essa vanguarda, trazer as tecnologias e o conceito da indústria 4.0, aprimorá-lo e instruir os alunos, para que tenham condições de chegar nas indústrias e implementar essa metodologia, fazendo com que cresçam e evoluam.”

Para o professor, sem os avanços tecnológicos da indústria 4.0, o cenário industrial nacional não será concorrente do mercado internacional. “O conceito é produzir cada vez mais, com menos. O principal pilar é a produção enxuta: ter todos os processos otimizados ao extremo, sem desperdício de material, mão de obra, tempo e intelecto.” A partir dos sistemas ciberfísicos, tudo passa a ser conectado. Entre as novidades no Senai LAB estão os robôs colaborativos. “Por normas de segurança, ele tem que trabalhar ‘enjaulado’, com uma grade que o circunda, impedindo que um operador entre e se aproxime, porque pode ter um erro de sensor e de leitura. Como se movimenta muito rápido e com muita força, poderia acabar colidindo com uma pessoa e machucar.” Segundo Monteiro, esses robôs podem colaborar com o trabalho humano, tirando o trabalho repetitivo e deixando a pessoa livre para raciocinar.

Manufatura aditiva e Internet Industrial das Coisas

Senai Lab, na Barreira do Triunfo, Zona Norte de Juiz de Fora, tem um setor de projetos de inovação para a indústria (Foto: Divulgação)

Outra tecnologia estudada no Senai LAB é a manufatura aditiva, que começou com as impressoras 3D. “Já há várias linhas, não só com filamentos, mas com resina e até aço.” As peças já saem no formato final, sem desperdício de material, o que aconteceria em um objeto talhado. Os cortes a laser também são utilizados para garantir precisão. Sobre os dispositivos conectados à internet (IoTs, sigla derivada da expressão “Internet das Coisas” em inglês), a denominação utilizada na indústria, conforme o professor, é “Internet Industrial das Coisas”. “Buscamos a segurança e a confiabilidade, e esses equipamentos podem servir para sistemas de supervisão: como uma máquina está funcionando, qual é a saúde dela, a produção, se vai bater uma meta ou não naquela velocidade em que está produzindo. Podemos controlar os equipamentos à distância e fazer um conversar com o outro (machine to machine) para balancear a produção.”

A partir dos softwares, segundo ele, também é possível conversar com o fornecedor, para combinar prazos e entregas. “Um pilar da indústria enxuta é não ter estoque, não ter almoxarifado, porque é desperdício de espaço e dinheiro. Então eu compro só a quantidade de botões que eu precisar para serem entregues no dia em que eu for fazer aquela camisa”, exemplifica. Daí a importância de toda a produção estar conectada, de forma interna e externa.

O futuro é agora

Monteiro pontua que os sistemas de realidade virtual e aumentada não são mais só futuro. “Começam a ser presente, principalmente para o pessoal da manutenção. Com esses dispositivos, consigo otimizar o treinamento de um funcionário, porque posso criar ambientes de simulação para que ele passe por todas as dificuldades que um dia ele possa ter, sem risco de acidente. Ou, quando ele vai desmontar determinado equipamento através de um sistema de realidade aumentada, ele não vai se perder no meio do caminho ou precisar daqueles manuais enormes. Já estamos nos munindo para isso: temos óculos de realidade aumentada, e o Senai está começando a construir softwares de realidade aumentada e virtual.”

Sobre a IA, Monteiro a conceitua como “algoritmos, que podem utilizar algumas técnicas de “machine learning” ou de redes neurais, para processar informações, que já tenha determinado histórico, para estabelecer a melhor forma de resolver um problema. “Uma mão de obra que já está em falta são os analistas de dados, com formação em estatística e programação, que conseguem fazer e gerir esses algoritmos de análise de dados.” O professor destaca que a IA é uma importante ferramenta para tomada de decisões. “Ajuda a analisar todos os dados e a simular os possíveis casos, em diversas áreas e setores da indústria, desde a logística.”

O docente Daniel de Paula alerta que esse novo cenário traz novos paradigmas não só para a indústria, mas para toda a sociedade. “Assim como o uso do carvão e, posteriormente, da eletricidade, trouxeram seus desafios, esse momento trará, direta ou indiretamente. A cada dia que passa, a indústria 4.0 demanda profissionais cada vez mais qualificados, com habilidades tecnológicas e de gestão em constante desenvolvimento.” O professor enfatiza que o objetivo dessa revolução não é retirar o homem dos processos, apenas colocá-lo em uma posição em que possa utilizar mais suas capacidades intelectuais, no intuito de contribuir com a produtividade e competitividade da empresa onde atue.

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