Carlos Bracher inicia série sobre JF com performance no Central

Carlos Bracher pintará dois quadros diante do público – um dentro e outro fora do Cine-Theatro


Por Júlio Black

01/09/2022 às 07h00

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Carlos Bracher, 81 anos, inaugura série de pinturas sobre Juiz de Fora com performance no Cine-Theatro Central (Foto: Fernando Priamo/Arquivo TM)

Um dos mais importantes artistas plásticos brasileiros contemporâneos, Carlos Bracher não vê seu ofício como um exercício solitário. Ele diz gostar da experiência colaborativa, da presença do público, da troca de energia enquanto cria seus quadros. E é o que ele vai fazer nesta sexta-feira (2), quando vai pintar, ao vivo, dois quadros no Cine-Theatro Central, que serão o ponto de partida para um projeto que acalenta há anos: a série “Juiz de Fora: Um tributo à terra natal”, que deve ter cerca de 25 quadros de diversos cenários importantes da cidade.
A performance do artista juiz-forano será dividida em duas partes. A primeira tem início às 13h, quando ele vai se reunir na Praça João Pessoa com estudantes da rede municipal de ensino e pessoas atendidas por instituições sociais para pintar a fachada do Cine-Theatro Central. Mais tarde, às 18h30, ele vai fazer outra pintura ao vivo, agora do interior do Central e do público, acompanhado pela Orquestra Sinfônica Pró-Música, comandada pelo maestro Victor Cassemiro. No repertório, composições de Mozart, Bach, Haendel, Puccini, Enio Morricone e Carlos Gardel. A entrada para o evento noturno é gratuita, e os ingressos (dois por pessoa) podem ser retirados das 9h ao meio-dia e das 14h às 17h.

Uma nova série de Bracher

Ao conversar com a Tribuna, Bracher explica que a performance acaba por unir dois desejos do artista: realizar, enfim, a série sobre sua terra natal, e repetir em Juiz de Fora o projeto que foi convidado a fazer em maio, em Brasília, quando pintou ao lado de 80 pessoas cegas e surdas, a exemplo do que fará na Praça João Pessoa. Ele destaca que ainda foi convidado, na sequência, a pintar um quadro do prédio da embaixada italiana na capital federal, a pedido do embaixador Francesco Azzarello – o que fez – e ainda que retornasse ao Distrito Federal nos últimos dias, agora para participar do lançamento do livro sobre a embaixada da Itália no Brasil, que teve seu quadro reproduzido na capa.
“Essa ideia foi tão bonita que quase não tenho palavras. Foi lindo ver o empenho daquelas pessoas, fossem os jovens, os adultos; foi a expressão do sentimento por meio da arte, e vice-versa, É comovente ver isso, a essência que há em cada um, retomando a si mesmo na sua organicidade, como algo salvador de si”, relembra. “Eu pintei chorando, vi diante de mim essa coisa coletiva de lágrimas trocadas.”
Ainda marcado pelo que viveu em Brasília, Bracher decidiu repetir a experiência para marcar o início de sua nova série. “Eu já tinha feito séries como ‘Homenagem a Van Gogh’ (1990), ‘Do ouro ao aço’ (1992), ‘ Bracher/Brasília’ (2007), ‘Petrobras’ (2012) e ‘Tributo a Aleijadinho’, em 2014. Agora, em função desses quadros que fiz em maio em Brasília e também pela minha idade (81 anos), vi que chegou a hora de fazer a série sobre a minha terra”, explica o pintor, que adianta alguns dos pontos que deverão ser retratados, entre eles os prédios da Prefeitura e da Câmara Municipal, a Praça da Estação, a antiga Fábrica Mascarenhas, Parque Halfeld, a Catedral Metropolitana, a Igreja da Glória e a cidade vista a partir do Morro do Cristo. “O Museu Mariano Procópio também está nos meus planos, talvez repita lá a performance que farei no Central. Minha ideia, a princípio, é pintar todos os quadros diretamente no local, para que o público possa acompanhar ao vivo.”

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Criação coletiva

Decidido a fazer o casamento entre performance e sua nova série, foi a vez de buscar a viabilização do projeto. “Nós pensamos em conjugar essas entidades para a realização da performance. Fizemos a proposta para a UFJF, entramos em contato com a orquestra – que aceitou o convite – e conversei com o maestro Victor Cassemiro sobre qual seria o tipo ideal de música. Quanto à Prefeitura, ela vai oferecer transporte e lanche para as crianças, cobertura para a performance da tarde, além de mesas e cadeiras para quem for trabalhar conosco.”
Carlos Bracher comenta, ainda, sobre como repetir o projeto que tanto o emocionou em Brasília tem a ver com sua trajetória. “Sou um cara muito coletivo. Aprendi isso na minha casa, o Castelinho dos Bracher, em que eu e artistas como Dnar Rocha e Ruy Merheb, entre tantos outros, pintávamos em conjunto. Na época, havia o polo da Sociedade Antônio Parreiras e do Castelinho, que era uma espécie de anexo do Parreiras. Era uma casa coletiva, que recebia muitos artistas e pessoas diariamente, e aprendi a ter a criação como um processo aberto, a trabalhar com outras pessoas, organizações. Passou a ser uma coisa natural e necessária – e de inclusão social também, que é uma coisa muito importante.”
“Acho até muito melhor essa coisa ser coletiva, porque você tem a energia dos demais seres envolvidos no processo”, prossegue. “Cada um tem o seu processo vibratório, a sua energia, sejam as pessoas que vão trabalhar comigo ou o público em geral. Obviamente, consigo captar isso, que bate em mim e me acelera. É algo muito maior e muito além, é fantástico, e a Praça João Pessoa é um espaço perfeito para se realizar esse projeto.”

Lembranças que emocionam

Falar do Castelinho dos Bracher, aliás, faz com que o artista plástico – radicado em Ouro Preto desde 1971 – dê vazão a inúmeras lembranças, que o emocionam e até deixam a voz embargada enquanto fala de sua vida e trajetória. “A série será sobre o meu grande amor à minha terra. Eu nasci na Rua Frederico Lage, a quatro ruas do Museu Mariano Procópio. Depois, fui criado na Rua Bernardo Mascarenhas, e aos 12 anos mudamos para o Castelinho. São muitas lembranças: dos meus pais, meus irmãos; aquele Castelinho tem algo que nunca mais vi na minha vida, foi uma coisa maravilhosa, de uma fraternidade, amor e acolhimento a qualquer ser humano. Que experiência foi aquela, era um negócio profundo!”
Ainda emocionado, ele contou que a família pretende transformar o Castelinho dos Bracher em um centro cultural, que teria o nome de Memorial dos Amigos. Para o próximo ano, ele pretende fazer uma grande exposição no Museu Mariano Procópio, que reuniria as pinturas da série que se inicia e quadros do início de sua carreira, nos anos 1960, também sobre a cidade. Entre eles estariam “Chegada à estação”, de 1961, e “Igreja da Glória”, de 1965. “Pensando bem, a série sobre Juiz de Fora começou em 1961, e agora inicio a sua segunda fase”, encerra.

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