Deu ruim, Obi-Wan Kenobi

Por Júlio Black

30/06/2022 às 15h00 - Atualizada 30/06/2022 às 14h12

Oi, gente.

PUBLICIDADE

Quando a Disney comprou a Lucasfilm, em 2012, a notícia dividiu opiniões. Muitos acreditavam que a nova dona do pedaço iria dar o que os fãs queriam, principalmente mais filmes de “Star Wars”, e o anúncio foi acompanhado pela notícia de que uma nova trilogia sairia do papel; outros, porém, temiam que a Disney, tão preocupada em fazer produções “para toda a família”, fosse descaracterizar o universo criado por George Lucas. Quase uma década depois, podemos dizer que os dois lados estavam certos e errados: se “O despertar da Força”, “Rogue One”, “Os últimos Jedi” e (principalmente) “The Mandalorian” deixaram a maioria dos fãs felizes, “Han Solo”, “A ascensão Skywalker” e “O Livro de Boba Fett” estão entre os piores momentos da saga passada há muito tempo em uma galáxia muito distante.

“Obi-Wan Kenobi”, minissérie que acabou de encerrar sua jornada no Disney+, infelizmente entra para o time cada vez mais crescente das decepções. Anos atrás, a Lucasfilm anunciara que seria feito um filme sobre o cavaleiro Jedi no período entre os episódios III e IV de “Star Wars”, mas “Han Solo” flopou de forma tão espetacular que os planos mudaram, e o que seria um longa-metragem transformou-se em uma meia dúzia de episódios para turbinar o então vindouro serviço de streaming da Disney. Mesmo assim, as expectativas eram altas, afinal teríamos Ewan McGregor novamente a empunhar o sabre de luz como o personagem-título, Darth Vader com o vozeirão de James Earl Jones e… tá bom, Hayden Christensen andando pra lá e pra cá com a famosa capa e capacete negros do vilão.

Para quem já leu alguma coisa do canônico universo expandido e da linha “Legends” (todos os livros e quadrinhos lançados antes da aquisição pela Disney) sabe que “Guerra nas Estrelas” tem muita coisa legal em seus spin-offs – “Phasma”, “Legado de sangue” e “A Resistência renasce” são ótimos exemplos. Por isso, já era de se esperar que “Obi-Wan Kenobi” seguisse a linha de aventuras isoladas dentro de um universo maior. Até aí tudo mais ou menos bem, o problema fica por conta da execução que dinamitou praticamente todas as expectativas positivas.

A história se passa dez anos após os eventos de “A vingança dos Sith”. Obi-WanKenobi – agora conhecido por Ben – vive escondido em Tatooine, vigiando Luke Skywalker à distância e à espera do momento em que o moleque possa ser treinado para se tornar um cavaleiro Jedi. Ao mesmo tempo, Darth Vader tem empreendido uma caçada aos jedis remanescentes – em especial seu antigo mestre – por meio de seus Inquisidores. Uma das integrantes do grupo, Reva Sevander (Moses Ingram), tem uma obsessão em capturar Kenobi tão grande quanto a de Vader, e por isso é capaz de desobedecer às ordens de seu superior. Ela chega a contratar um grupo de mercenários – incluindo o personagem interpretado por Flea, baixista do Red Hot Chili Peppers – para sequestrar a princesa Leia Organa (Vivien Layra Blair), a fim de tirar o Jedi fugitivo da toca.

(Pois é, lá vamos nós assistir a mais uma história com os Skywalker, mesmo que o sequestro da garota seja uma boa justificativa para tirar o herói de Tatooine. Mas até quando “Star Wars” vai viver apenas em torno dessa família desestruturada?)

“Obi-Wan Kenobi” é, basicamente, uma minissérie sobre o acerto de contas entre o cavaleiro Jedi e o lorde Sith, a culpa que Obi-Wan sente por acreditar que falhou com seu pupilo – e uma possível redenção – e o desejo de vingança por parte de Vader. A esses elementos podemos juntar a parte de aventura representada pela missão de resgate da princesa Leia. Quem acompanha o universo de “Star Wars” pelos filmes, séries e livros está acostumado com tramas parecidas, seus clichês e soluções fáceis dos problemas, como os mocinhos conseguirem invadir instalações do Império ou da Primeira Ordem para resgatar os amigos e tudo dar certo. Usando a suspensão da descrença, dá para curtir as aventuras dos heróis numa boa.

Nesse ponto, era o que esperávamos de “Obi-Wan Kenobi”, mas, para isso, é preciso não ofender nossa inteligência abusando de soluções ridículas ou cenas constrangedoras. Porém, os produtores não têm vergonha de entregar uma história em que os péssimos roteiros não oferecem chance de salvação. O quarto episódio, então, está entre uma das piores coisas já produzidas no universo de “Guerra nas Estrelas”; num primeiro instante, você pode até pensar “ah, mas isso sempre acontece em ‘Star Wars'”, mas a fuga de Kenobi e Leia da fortaleza dos Inquisidores é tão ofensiva, mas tão ofensiva em sua resolução que quase esquecemos que a rebelde Tala (Indira Varma) derruba um stormtrooper com um tapa no capacete (!).

Além de diálogos rasos como pires (o que não é novidade em “SW”, mas…), a história exagera nos clichês, como o do vilão que, ao invés de “girar a faca”, como se diz, pensa “ah, ele está praticamente morto, posso ir embora sem ter certeza que morreu”; sério, se Darth Vader tem tanto ódio assim por Obi-Wan, por que não mata o cara quando tem o sabre de luz e o queijo na mão, e vice-versa? Outra: já que decidiu que desceria sozinho ao planeta para enfrentar o antigo mestre, por que diabos Vader não mandou o destroier seguir atrás da nave dos rebeldes no último episódio?

A maioria das cenas de luta e batalha quase nunca empolgam (o que foi aquele tiroteio entre os 200 stormtroopers e duas dúzias de rebeldes, também no último episódio?), e alguns momentos são constrangedores ao extremo no quesito vergonha alheia, como a princesa Leia conseguir escapar de vários marmanjos na corrida, apesar de só ter dez anos. E não é questão de ser nerd pentelho, é questão de pensarmos que essa é uma série produzida no século XXI, em que dúzias de produções de sci-fi apresentam roteiros que mandam a preguiça pra lá de Mustafar.

O conteúdo continua após o anúncio

A minissérie até apresenta bons personagens novos, como Reva e Tala, mas “Obi-Wan Kenobi” é incapaz de desenvolvê-las de forma satisfatória. A “Síndrome de Phasma” (criar ótimos personagens que são subaproveitados), ao que parece, continua a marcar presença em “Star Wars”. Das poucas coisas que se salvam na série estão as atuações de Ewan McGregor e Moses Ingram, além do momento no terceiro episódio em que Darth Vader chega ao planeta em que Obi-Wan está escondido e sai matando geral na linha “sou mau porque eu quero”. Convenhamos: é muito pouco para uma minissérie que prometia tanto.

“Star Wars”, infelizmente, tem vivido de boas surpresas quando aposta em personagens novos, como o Mandaloriano Djin Darin e o baby Yoda Grogru, mas decepciona quando retorna a personagens queridos pelos fãs como Obi-Wan Kenobi. A Disney tem apostado forte na nostalgia, e não tem dado certo.

E, por favor: CHEGA DE SKYWALKERS.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

Júlio Black

Júlio Black

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade pelo seu conteúdo é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir postagens que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.



Leia também