Enquanto é tempo
O combate à inflação deve ser cobrado dos candidatos à Presidência, mesmo num cenário em que a situação global tem forte influência nos estados nacionais
Nos tempos de inflação, ir às compras era um exercício de adivinhação, já que não havia meios de se saber o preço exato dos produtos. A figura mais comum nos supermercados era a do marcador de preços. Com suas maquininhas de etiquetar produtos, ficavam espalhados pelas lojas, atualizando preços. E isso acontecia por mais de uma vez ao dia. Os “fiscais do Sarney” ficaram famosos por suas tentativas de fechar mercados que faziam tal operação – alguns até tentaram a carreira política – mas também foram atropelados pela inflação e pelo fracasso do plano do presidente que emprestava o nome. O overnight – uma operação de câmbio – tornou-se a moeda de negócios para quem tinha lastro, já que seus dividendos eram pagos da noite para o dia. A inflação ficava acima dos 80% ao mês, algo impensável nos tempos de hoje e desconhecido da maioria da população com idade abaixo dos 30 anos.
O Plano Real, instalado na gestão Itamar Franco, mudou a história e trouxe o país para uma versão também desconhecida, com preços estáveis, garantindo a possibilidade de investimentos de médio e longo prazos. No entanto, num mundo globalizado, houve solavancos, mas insuficientes para atrapalhar a economia brasileira que se tornou sólida.
Os efeitos da pandemia, que comprometerem a produção nos últimos dois anos, e o dado mais recente envolvendo as comodities, fruto da guerra na Ucrânia, reviveram o fantasma da inflação. No último domingo, a principal matéria da Tribuna destacou a disparada dos preços dos hortifrutis em Juiz de Fora. “Hortaliças e frutas estão mais caras nas gôndolas. Valor da cenoura fica quatro vezes mais alto em um ano”, levando o consumidor a reduzir a quantidade de alimentos ou trocá-los por preços mais em conta.
Esse é um velho filme que precisa ser combatido enquanto “trailler”, pois não há espaço para esperar. A inflação tem que ser combatida na sua matriz, a fim de garantir que não irá adiante. É fato que tal fenômeno não é uma exclusividade brasileira. Tendo o dólar ainda como moeda de referência global e com o impasse econômico a partir da ação dos tropas russas, os custos de produção aceleram, sobretudo quando a questão passa pelos combustíveis. O preço dos derivados do petróleo, indexados à moeda norte-americana, sobem frequentemente e o reflexo, sobretudo quando é para subir preço, chega imediatamente às bombas.
E aí começa um dos problemas da cadeia produtiva, pois todos os produtos sofrem algum tipo de repercussão. Os insumos sobem, o frete muda de patamar e o trânsito das mercadorias da fonte até o consumidor final passa por diversas alterações. Assim, não há surpresa quando o preço da cenoura fica quatro vezes mais alto.
O grave desse processo é a incapacidade de os salários acompanharem os custos da produção. Uma inflação de dois dígitos só é compensada pelo serviço público – cuja reposição ficou em torno de 10,06% no estado e no município – com exceção da Educação -, enquanto a iniciativa privada fica totalmente impedida de fazer o mesmo. Essa disparidade leva não só ao descontentamento, mas também à redução drástica do consumo. E é aí que a situação se agrava. O desafio a ser apresentado aos pré-candidatos à Presidência da República é saber deles o que deve ser feito (e como) para o país voltar aos trilhos de uma economia em ascensão.