A despedida do Midnight Oil, John Frusciante de volta ao Red Hot e Eddie Vedder com um senhor álbum
Oi, gente.
Os primeiros meses de 2022 apresentaram alguns ótimos lançamentos na seara musical e confesso que estou bem atrasado em comentá-los por aqui, mas nunca é tarde quando se tem uma coluna sem a obrigação de correr atrás dos algoritmos, likes e outras paradas. Sendo assim, vamos compartilhar nossas considerações consideráveis sobre dois discos lançados em fevereiro e outro lançado no primeiro dia de abril.
A começar pelo Midnight Oil, claro, a maior banda australiana de todos os tempos e uma das favoritas da casa há mais de três décadas, desde o dia em que assistimos na MTV BR o videoclipe de “Blue sky mine”. “Resist”, 13º álbum do grupo, chega quase dois anos depois do lançamento do EP “The Makarrata Project” e duas décadas após o último álbum “cheio” dos Oils, “Capricornia”. O trabalho ainda traz as últimas gravações com o baixista Bones Hillman, que morreu devido a um câncer em novembro de 2020.
De acordo com a banda, “Resist” vem acompanhado pela turnê de despedida do grupo, que após uma série de shows na Austrália e Nova Zelândia vai rodar a América do Norte e Europa. Eles, porém, não descartam voltar a gravar juntos – e, se depender do que ouvimos nas 12 faixas do mais recente disco, só nos resta torcer para continuarem “queimando o óleo da meia-noite” – tradução livre do nome da banda, expressão em inglês para a turma que costuma trabalhar até muito tarde.
Se não repete os momentos mais furiosos do Midnight Oil ouvidos em álbuns como “Redneck Wonderland” (1998), “Resist” é uma excepcional coleção de canções no melhor estilo da banda, a maioria delas compostas pelo guitarrista Jim Moginie. São músicas em que as críticas aos políticos, a preocupação com a preservação do meio ambiente, continuam na ordem do dia, porém com o acréscimo de críticas a temas que entraram recentemente em pauta, como o negacionismo.
Se existe uma mudança no tom do discurso, ela vem do pessimismo de quem sabe que os alertas já se tornaram realidade, como canta o vocalista Peter Garrett na faixa de abertura, “Rising seas”, reconhecendo que a luta contra a devastação do nosso planeta está sendo perdida – e que nós, os mais velhos, perdemos o timing da mudança, encorajando os mais jovens a assumirem nosso lugar.
“Resist” ainda tem outras ótimas faixas, como “Tarkine”, “Last frontier”, “At time of writing”, “To the ends of the Earth” e “The Barka-Darling River”, e ficamos na torcida para que o Midnight Oil mantenha-se em atividade por muito tempo em estúdio. Se não acontecer, pelo menos a despedida foi em grande estilo.
Um momento muito aguardado foi o segundo retorno do guitarrista John Frusciante ao Red Hot Chilli Peppers. Ele voltou a sair da banda em 2009 e foi substituído por Josh Klinghoffer, e reassumiu as guitarras do quarteto uma década depois. Porém, a pandemia fez com que “Unlimited love”, 12º álbum do RHCP – e o primeiro com Frusciante desde “Stadium Arcadium” (2006) – chegasse ao mundo apenas em 1º de abril. O trabalho também marcou o retorno da parceria entre o grupo e o produtor Rick Rubin, que esteve nos maiores sucessos comerciais dos Peppers.
Quando o single “Black summer” foi lançado, a banda afirmou que “Unlimited love” seria “o passeio que é a soma de todas nossas vidas”. Álbum lançado e ouvido, podemos afirmar que o Red Hot Chilli Peppers realmente passeia por vários momentos de sua discografia, e que a presença de John Frusciante cria a sensação de que temos mais uma vez o RHCP que tanto aprendemos a admirar.
Há várias músicas para atestar a afirmação, como “The heavy wing”, “These are the ways”, “Here ever after”, “Aquatic mouth dance”, “White braids & pillow chair” e “Black summer”. “Not the one”, por outro lado, é uma das poucas novidades sonoras. Se existe um porém em “Unlimited love”, ele fica por conta do excesso de músicas e duração: com 17 canções em 73 minutos, o trabalho poderia cortar umas quatro ou cinco faixas para ficar mais enxuto e não dar aquela sensação de “mas ainda tem mais?”.
Por fim, precisamos citar (e recomendar) a belíssima surpresa que é “Earthling”, segundo álbum solo de Eddie Vedder – isso se descontarmos a trilha sonora de “Na natureza selvagem” (2007). Enquanto “Ukelele songs” (2011) era um disco totalmente fora da curva, o novo trabalho do vocalista do Pearl Jam é um senhor álbum de rock, country, folk, punk e baladas de estádio, do tipo que vai agradar em cheio aos fãs de sua banda, o Pearl Jam; nem é de se espantar de alguns considerarem que “Earthling” é melhor que muita coisa lançada pelo grupo em mais de três décadas de carreira. Até a influência do mestre Neil Young está lá.
Direto ao ponto com suas 13 faixas em 48 minutos, “Earthling” é tão bom que fica difícil destacar apenas três ou quatro faixas. O disco já começa em grande nível graças a “Invincible”, e assim segue com “Power of right”, “Long way”, “Brother the cloud”, “Good and evil”, “Picture”, “Mrs. Mills” e “On my way”, para não citarmos todas.
Além das letras peculiares e do vozeirão de Vedder, o novo álbum solo do frontman do Pearl Jam é abrilhantado pela banda que o acompanhou na empreitada: Chad Smith (Red Hot Chilli Peppers) na bateria, o ex-RHCP Josh Klinghoffer na guitarra e o produtor Andrew Watt na guitarra e contrabaixo na maioria das faixas. As participações especiais são estelares: o beatle Ringo Starr toca bateria em “Mrs. Mills”, Abe Laboriel Jr. (baterista da banda que acompanha Paul McCartney) marca presença em “Picture”, que ainda tem sir Elton John dividindo os vocais com Eddie Vedder. E Stevie Wonder manda ver no solo de gaita em “Try”, outro belo momento desse senhor álbum, que merece um lugar antecipado entre os melhores do ano.
Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.