Não é estar, mas chegar

Os instintivos desmarques para criar espaços dão a harmonia do Atlético de Cuca


Por Gabriel Ferreira Borges

31/08/2021 às 07h00

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Nacho Fernández faz jus ao clássico “toco y me voy” da escola argentina (Foto: Pedro Souza/Atlético/Divulgação)

Aos 24 minutos, Paulo César Vasconcellos, na transmissão de Red Bull Bragantino e Atlético, relembrou-se de Gentil Cardoso. “Quem desloca, recebe. Quem pede, tem preferência”, dizia o técnico. Gentil comandou a Seleção Brasileira no Sul-Americano Extra, em 1959. Ele ainda dirigiu uma série de clubes, como Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama, entre as décadas de 1930 e 1960. A organização do Atlético em campo, ali, aos 24 minutos, lhe remetia a Gentil Cardoso. Gentil que precisou de apenas duas sentenças para cunhar o inventário do instinto do futebol brasileiro.

Àquela altura, o Atlético até já ensaiava subir para o ataque como um bitrem desgovernado, mas o Red Bull Bragantino havia largado na frente do placar. Colado na linha lateral, Guilherme Arana tinha nos seus pés a bola, e, no seu pescoço, Artur. Quando Arana levou a bola e, claro, Artur para o meio-campo, Hulk ao mesmo tempo lançou-se nas costas de Ramires em direção à área. Ele até recebeu o passe, mas, sem equilíbrio e ângulo, finalizou sem sequer incomodar Cleiton. Nenhum atleticano provavelmente lembrará do lance ao fim do Campeonato Brasileiro. Entretanto, o instinto de Hulk explica, em certa medida, a harmonia do Atlético em ter a bola nos pés.

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Reunir ‘Nacho’ Fernández, Eduardo Vargas, Jefferson Savarino e Hulk por si só justifica muitas coisas, é verdade – e chamar Arana e Matías Zaracho de coadjuvantes seria leviano. Só que o mais vistoso é a evolução do Atlético em campo como se estivesse sob julgamento na Marquês de Sapucaí. O time até parece desajustado, mas a assimetria é uma condição para enfileirar chances com uma naturalidade invejável, sem muitos esforços. Eles buscam uns aos outros para encontrar justamente os espaços, o que, irremediavelmente, lembrou a Paulo César de Gentil Cardoso.

Os desmarques para criar espaços são quase inatos aos jogadores brasileiros. Não à toa o gol de Carlos Alberto Torres na final da Copa do Mundo de 1970 é um dos mais cultuados. Jairzinho, Tostão e Pelé roubam a atenção dos italianos quando Carlos Alberto aparece em uma carreira livre pela direita. Afinal, não é necessariamente estar, mas chegar. É como se a busca fosse sempre por liberdade.

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