Exposição on-line “Seres políticos, seres plurais” tem abertura nesta sexta-feira

Memorial da República Presidente Itamar Franco apresenta em galeria virtual reflexão sobre a relação entre política e coletividade


Por Júlio Black

16/07/2021 às 07h00- Atualizada 16/07/2021 às 18h35

Exposição terá galeria virtual com fotos, textos e reproduções de jornal, entre outros, que poderão ser expandidos para visualização (Foto: Reprodução)

Mais de 500 anos após a chegada de Cabral e quase 200 anos depois da proclamação de sua independência em relação a Portugal, o Brasil ainda é um país em processo de construção de uma “paisagem” mais plural e que precisa lutar pela manutenção do que já se conquistou. E é a partir das décadas mais recentes de nossa história, tendo como base o movimento pela redemocratização, a Constituição de 1988 e tudo que veio a seguir, que a exposição on-line “Seres políticos, seres plurais”, que o Memorial da República Presidente Itamar Franco abre nesta sexta-feira (16), busca levar o público à reflexão sobre a relação entre política e coletividade a partir do argumento de que a política é um exercício coletivo.

A partir das 18h desta sexta-feira, o público poderá conferir a exposição, que prossegue até setembro na galeria virtual projetada pelo programador Rodrigo Duque. Por meio de um ambiente virtual, o público poderá conferir fotografias, textos, charge, cartazes, vídeos e recortes de jornais oriundos do acervo da instituição e de outros locais, como o Centro de Conservação da Memória, que cuida do acervo do DCE da UFJF; o Arquivo Nacional, a partir do projeto “Memórias reveladas”; e do Centro de Conservação da Memória dos Movimentos Sociais da Unesp. Será possível também agendar visitas mediadas virtuais para grupos, pelo e-mail educativo.memorial@ufjf.edu.br.

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A exposição busca, ainda, relembrar a atuação dos movimentos sociais na luta por democracia, igualdade e justiça social, questões que foram garantidas graças à Constituição de 1988, mas que prosseguem sendo demandas _ em muitos casos _ que não chegaram a toda a população. É lembrada, também, a importância do ex-presidente _ e então senador _ Itamar Franco para a consolidação da nova Constituição e seu compromisso com o movimento pela redemocratização.

Ao traçar essa trajetória entre o passado recente com os dias atuais, a mostra propõe, ainda, uma reflexão sobre como podemos alcançar um futuro melhor, e para isso a exposição conta ainda com um playlist no Spotify _ homônima à exposição – com músicas brasileiras representativas do contexto do país nos últimos 50 anos, além de um questionário e cartilha com material extra.

Quem também participa do projeto é a artista visual Iúna Mariá, com cinco trabalhos na seção “Corpos políticos, corpos plurais”, em que as imagens construídas digitalmente pela artista reivindicam escuta para vozes ainda hoje marginalizadas, dentro da proposta da exposição de lembrar que há muitas vozes que, mesmo hoje, ainda não encontram espaço no contexto geral de nossa sociedade.

Entre o material da exposição estão imagens que fazem parte do acervo da própria instituição (Foto: Reprodução)

Pluralidade em constante conquista

“Seres políticos, seres plurais” tem curadoria de Mauro Morais, do setor de Difusão Cultural e Educação do Memorial, que trabalhou na pesquisa do projeto durante três meses com seis bolsistas do Programa de Treinamento Profissional da UFJF. Ele conta que, como a instituição tem por compromisso debater a República e o legado de Itamar Franco, eles tomaram a Constituição Federal _ da qual o ex-presidente participou -, marcada pela pluralidade, para celebrar essa pluralidade do povo brasileiro.

“Pontuamos que essa pluralidade foi conquistada com a redemocratização e a Constituição, mas não é uma conquista que se encerrou, muito pelo contrário: a pluralidade segue uma luta contínua”, afirma. “Por isso, mostramos na exposição como os movimentos sociais foram importantes para a conquista da democracia e das causas identitárias, um dos motivos para incluirmos o trabalho da Iúna Mariá, que mostra que o Brasil ainda carece de abrir espaço para outros corpos, pensamentos e discursos.”

“O país sempre foi muito plural, com muitos corpos atuando no espaço público, o que não temos ainda é espaço para todos esses corpos”, argumenta Morais, que por isso mesmo discorda de quem defende que faltam vozes: para ele, o que é preciso é escutá-las. “A ditadura tinha por princípio escutar um padrão de voz, enquanto a redemocratização traz muitas outras vozes; porém, em 2021 percebemos muitas vozes que ainda não são escutadas, que é o que falta para termos uma noção real de Brasil. Por isso o título da exposição é esse, não há como fazer política sem pensar no coletivo. Ainda que o voto seja individual, ele é individual num contexto coletivo.”

Mauro Morais lembra que a exposição destaca quatro movimentos em especial: feminista, negro, estudantil e operário, porém ciente de que havia outros movimentos na redemocratização, e muitos outros hoje, como o movimento dos sem-terra. “Há muitas outras vozes a serem ouvidas e que já se articulam e se organizam. O grande equívoco do pensamento da ditadura é pensar que houve um momento de silêncio extremo, pois sempre tivemos manifestações, mesmo que pequenas ou grandes. O que aconteceu é que o retorno à democracia ganha força quando conseguimos articular uma pauta macro, que era a democracia, com pautas identitárias de pequenos grupos.”

 

Trilha sonora de um país

Por meio da exposição, é possível ter contato ou relembrar histórias que mostram um país em que os movimentos sociais precisavam lutar da forma que era possível pelo retorno à democracia, seguindo pelas décadas seguintes e assim traçando paralelos com a situação atual. Para Mauro Morais, a playlist no Spotify – que tem músicas como “Apesar de você” (Chico Buarque), “Que país é este” (Legião Urbana), “Tô feliz (Matei o presidente)” (Gabriel o Pensador) e “Diário de um detento” (Racionais MC’s) – é a parte importante da exposição para se fazer uma reflexão mais profunda desse cenário.

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“A playlist traz as músicas de forma cronológica, anteriores ao período da redemocratização, durante e depois. Então você tem um cenário (antes da redemocratização) com canções com muitas metáforas e um discurso complexo, e nos anos 90 as músicas têm um discurso direto e objetivo, com caraterísticas de afirmação”, diz, dando como exemplo “O canto da cidade”, de Daniela Mercury.

“Ela é um símbolo do movimento LGBTQIA+ que foi possibilitado por essa abertura. É importante pensarmos: por que uma música lançada há 25 anos segue sendo um hino ainda hoje? Será que construímos novos hinos ou ainda estamos num cenário em que essa música se faz necessária e atual?”

Artista visual Iúna Mariá participa com cinco obras, dentro da seção “Corpos políticos, corpos plurais” (Foto: Reprodução)

Aprendizado contínuo

Ao se dedicar com as bolsistas à pesquisa para a exposição, Mauro Morais teve a oportunidade de refletir sobre o caminho que o país tomou até chegar ao momento atual. Para ele, os tempos da redemocratização têm muito a nos ensinar e carecem de mais pesquisas e atenção por parte da sociedade. “Esse período mostra que essas lutas são contínuas e que precisamos estar alertas o tempo todo, pois a perda de direitos é algo iminente. Precisamos conquistar mais direitos e manter o que já conquistamos; é um ato que deve ser continuo”, alerta, citando o trabalho de Iúna Mariá.

“O trabalho dela é a nossa forma de retratar o presente, pois mostra como o corpo trans ainda carece de ser ouvido, compreendido e incluído, como não fizemos uma inclusão total. Esse é o território que devemos colocar em debate, trabalhar para conquistar a inclusão dos mais diferentes tipos e demandas do nosso fazer social.”

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