Alta de preços reduz poder de compra e impacta o dia dia de juiz-foranos

Energia elétrica, combustíveis, gás de cozinha e alimentos estão mais caros e dificultam o equilíbrio financeiro das famílias


Por Gracielle Nocelli

04/07/2021 às 07h00

 

Foto: Jéssica Pereira

O primeiro semestre de 2021 chegou ao fim sem dar trégua aos consumidores. Conta de luz, gás de cozinha, combustíveis e alimentos estão mais caros e desafiam o dia a dia das famílias. Para este segundo semestre, o cenário econômico ainda é incerto. A crise hídrica segue alavancando os custos de produção da energia elétrica, apontada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como a principal responsável por pressionar a inflação.

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Na quinta-feira (1º de julho), a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) abriu consulta pública para decidir se a bandeira tarifária vermelha patamar 2 terá novo reajuste de preços. Na última terça-feira (29), já havia ocorrido o aumento de 52% do valor da cobrança, que passou de R$ 6,24 para R$ 9,49 a cada 100 kWh consumidos.

O sistema de bandeiras tarifárias funciona como uma cobrança adicional que é aplicada às contas de luz quando os custos de produção da energia elétrica estão mais altos. Neste sistema, a bandeira vermelha patamar 2 é a que tem o valor mais alto. “A conta de luz fica mais transparente e o consumidor tem a melhor informação para usar a energia elétrica de forma mais consciente”, afirma a Aneel.

Para o mês de julho já está confirmada a bandeira vermelha patamar 2 com o acréscimo de R$ 9,49 para cada 100 kWh consumidos. Após a realização da consulta pública, a Aneel irá decidir se este valor será mantido ou subirá para R$ 11,50.

Impactos

O encarecimento das contas de luz afeta de forma diferente o dia a dia dos consumidores. “A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE mostra que o peso da conta de luz varia de acordo com as faixas de renda. O impacto da inflação da energia elétrica é muito maior para famílias com menor renda”, explica o mestre em Administração e professor da Estácio Juiz de Fora, Thiago Rocha.

Além de pesar o bolso das famílias, o encarecimento da energia elétrica é capaz de promover um efeito em cascata na economia, afetando diferentes setores. “O aumento também impacta as empresas, que vão repassar esse custo para os seus produtos e serviços, o que contribui para desencadear outras altas de preço”, avalia Thiago, destacando que, quando o empresário não consegue repassar os valores ao consumidor final, há a redução da margem de lucro, o que pode prejudicar a continuidade de muitos negócios.

Inflação de maio é a maior em 15 anos

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 0,83% em maio, conforme publicação mais recente do IBGE. O resultado foi o maior apurado para o mês nos últimos 15 anos. Em 1996, a inflação daquele mês ficou em 1,22%.

“Foi uma conjunção de fatores que levou a esse aumento. Em primeiro lugar, veio a alta da energia e, ao mesmo tempo, houve a volta do aumento da gasolina, que havia caído em abril”, explica o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov.

Outros itens como gás de cozinha, gás veicular, etanol, óleo diesel e os alimentos, sobretudo as carnes, também contribuíram para a elevação do índice mensal. No acumulado de 12 meses, no intervalo de maio de 2020 a maio de 2021, a inflação é de 8,06%.

Aumento da Selic

Considerando que a inflação “revela-se maior do que o esperado”, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central optou por aumentar a taxa Selic na tentativa de controlar a alta de preços. Assim, em junho, ela subiu de 3,5% para 4,25%. A proposta é que o aumento dos juros ocasione a redução do consumo e, consequentemente, a queda de preços.

Gás de cozinha e combustíveis sobem acima da inflação

Em um ano, o gás de cozinha, a gasolina, o etanol e o diesel sofreram uma escalada de preços em Juiz de Fora acima da inflação observada pelo IBGE, de 8,06%. O valor médio do botijão de gás passou de R$ 66,48 para R$ 81,15, uma alta de 22%. Na cidade, o produto é vendido por valores entre R$ 70 e R$ 95, conforme dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP).

Após uma série de reajustes consecutivos realizados pela Petrobras nas refinarias este ano, os combustíveis também estão na lista de itens que encareceram acima da inflação e seguem pressionando o orçamento dos juiz-foranos. Em um ano, o valor médio da gasolina praticado pelos postos da cidade aumentou 44%, indo de R$ 4,29 para R$ 6,18. Ainda de acordo com a ANP, no momento, o litro da gasolina varia entre R$ 5,99 e R$ 6,29 nos estabelecimentos da cidade.

O diesel foi reajustado em 43%, o que elevou o valor médio de R$ 3,17 para R$ 4,54. O produto é comercializado em Juiz de Fora na faixa entre R$ 4,29 e R$ 4,79.

Já o etanol foi o que registrou a maior alta: 60%. Em um ano, o preço médio que era de R$ 2,91 foi para R$ 4,67. O menor preço praticado é o de R$ 4,63. Já o mais caro é de R$ 4,79.

Reação ao dólar

A especialista em finanças, controladoria e auditoria e professora da Estácio Juiz de Fora, Mayanna Marinho, explica que os reajustes da Petrobras se devem à política de preços indexada ao petróleo internacional. “Com isso, os valores do mercado externo impactam diretamente o interno. Além disso, temos uma alta constante do dólar, o que também prova a desvalorização do Real e contribui para alta de preços.”

O encarecimento dos combustíveis tem efeitos similares na economia ao da energia elétrica, sendo capaz de desencadear outras altas de preços. Na avaliação da especialista, os reajustes simultâneos de produtos e serviços essenciais promovem a redução do poder de compra das famílias. “Diretamente afetadas, elas abrem mão do consumo de determinados itens em favor de outras necessidades primárias.”

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Juiz-foranos relatam dificuldades para equilibrar as contas

Há mais de um ano em home office, a administradora Mariana Rosa viu as despesas da família aumentarem consideravelmente nos últimos meses. “Estamos todos trabalhando ou estudando em casa, o que faz a gente gastar mais com energia elétrica e alimentação. Recentemente, estas despesas ficaram bem mais caras.”

Segundo ela, o preço do gás de cozinha foi o que mais a assustou. “Quando telefonei para a distribuidora que costumo comprar e me falaram que o botijão estava quase R$ 100, eu agradeci e desliguei”, relembra. “Peguei o telefone de outros lugares e fui me dando conta que havia encarecido muito mesmo.”

Mariana destaca a dificuldade de substituição do produto. “Não dá para querer economizar o gás e usar um microondas ou forno elétrico porque sobrecarrega a conta de luz.”

Na família da técnica em enfermagem Wildania Maia, o aumento da energia elétrica foi o que mais surpreendeu. “Na minha casa, moramos eu e minha filha. A conta passou de R$ 45 para R$ 130, sendo que não usamos muitos aparelhos e, nos dias em que eu tenho dois plantões, tomo banho no trabalho”, relata. “A conta de luz da minha mãe, que mora na casa do lado, deu R$ 180. É um valor muito alto para só uma pessoa.”

No supermercado, Wildania diz que observou a alta de preços de arroz, feijão, óleo e carne. “Passamos a fazer substituições de produtos e marcas para sobrar algum dinheiro. Se não, a gente vai trabalhar só para comer e pagar conta.” Outra alternativa estudada por ela é substituir o automóvel por uma moto. “A gasolina também está muito cara.”

Foto: Jéssica Pereira

Comércio

Proprietário da Padaria Center Pão e vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Panificação e Confeitaria de Juiz de Fora (Sindipan/JF), Adilson Leite observa os impactos da inflação em casa e no trabalho. “Gás de cozinha, energia elétrica e os insumos aumentaram muito de preço. As vendas já estão baixas por causa da pandemia, e não podemos repassar esses custos ao consumidor.”

Para minimizar os efeitos da inflação, ele conta que busca economizar o gasto de energia elétrica nos horários de pico e negociar na compra de produtos. Já para atrair as vendas, a solução é a reinvenção. “Nós nos adaptamos ao delivery, criamos promoções e outros atrativos. No momento, estamos com a barraquinha de produtos juninos. A ideia é incentivar o consumidor a comprar na padaria.”

Com alimentos em alta, salário deveria ser de R$ 5.351,11, diz Dieese

Os alimentos também têm pressionado a inflação. De acordo com o IBGE, itens como feijão, macarrão, fubá, farinha de trigo, açúcar, tomate, cenoura, alface, repolho, brócolis, morango, goiaba, ovos, carne de boi, queijo, manteiga e óleo de soja integram uma vasta de lista de produtos que elevaram o IPCA de maio.

Os preços praticados nos supermercados de Juiz de Fora não puderam ser analisados pela Tribuna porque, desde março, a Prefeitura interrompeu a divulgação das pesquisas Guia do Consumidor e Cesta Básica.

Considerando o panorama nacional, que também reflete a economia local, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) verificou alta de até 33% no valor da cesta básica no país. “Comparando o custo entre maio de 2020 e maio de 2021, o preço do conjunto de alimentos básicos subiu em todas as capitais que fazem parte do levantamento”, informou a assessoria.

O valor da cesta básica na Região Sudeste varia entre R$ 616,96 e R$ 636,40. “Quando se compara o custo da cesta com o salário mínimo líquido, ou seja, após o desconto referente à Previdência Social, verifica-se que o trabalhador remunerado pelo piso nacional comprometeu, em maio, na média, 54,84% do salário mínimo líquido para comprar os alimentos básicos para uma pessoa adulta.”

De acordo com o Dieese, para arcar com os custos, o salário mínimo no Brasil em vez de R$ 1.100 deveria ser de R$ 5.351,11.

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