Epidemia oculta
Pandemia exige atenção permanente à saúde psíquica e emocional, principalmente dos trabalhadores da área de saúde
A matéria que a Tribuna publica nesta edição mostra a exaustão e o cansaço físico sentidos por profissionais de saúde que atuam na linha de frente de combate ao coronavírus. Nas ambulâncias do Samu, nas portas de entrada das unidades de saúde e dentro dos hospitais, os relatos apontam para uma realidade de estresse diário, sobrecarga de trabalho, contato permanente com dor e perdas, medo do contágio e da morte.
Vários são os trabalhadores que estão com problemas emocionais por estarem lidando com a doença há tanto tempo. Desde março, são quase nove meses de enfrentamento à Covid-19 num cenário adverso, já que a lotação nas unidades de saúde é cada dia maior. Muitos profissionais, inclusive, acabam não suportando a pressão e pedem desligamento de seus postos, conforme relata o sindicato da categoria.
Profissionais da área de psicologia e psiquiatria destacam, contudo, que os afastamentos não podem ser considerados fraqueza profissional. Em geral, os trabalhadores de saúde são treinados e preparados para lidar com situações emocionais limites, mas, quando elas se postergam por muito tempo, é preciso criar mecanismos extras de proteção e cuidado.
Para além das unidades de saúde, já há estudos apontando a existência de distúrbios emocionais e psiquiátricos em outros grupos sociais. Um estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Unicamp, revelou que quase metade dos adolescentes pesquisados, com idades entre 12 e 17 anos, estavam nervosos, ansiosos e de mau humor. Outros 24% apresentavam problemas para dormir. A falta da escola, a reclusão dentro de casa, a interrupção das atividades físicas e esportivas, a distância dos amigos e o uso cada vez maior de computador estariam contribuindo para o novo estado de ânimo dos adolescentes.
Outra faixa etária que causa grande preocupação é a dos idosos. Além de estarem no grupo de risco, as pessoas com mais de 60 anos podem ter seu estado emocional agravado pelo isolamento social de longo prazo a que estão submetidos. Muitas acabam tendo que ficar longe da família, aumentando o sentimento de solidão. O ser humano, em sua essência, precisa desse contato com outro, do lugar do encontro, da interação. Por isso especialistas recomendam que os familiares, mesmo que a distância, mantenham-se em contato uns com outros, expressando afeto e solidariedade. É preciso cuidado, pois há temor de que uma epidemia oculta, trazendo uma segunda onda de sofrimento aos brasileiros, surja no pós-pandemia.