Jogo jogado

Escolha do presidente não indica, necessariamente, que ministro do STF deva seguir a sua linha ideológica. Há experiência em contrário no Tribunal


Por Tribuna

06/10/2020 às 06h58

Quando a população passou a conhecer de cor o nome dos ministros do Supremo Tribunal Federal, foi dada a senha para uma discussão sobre o papel dos ministros na vida nacional. Foram raros os momentos em que o tribunal teve tanta visibilidade, a despeito de ser a última instância do Judiciário. A partir do mensalão, até a indicação de nomes saiu dos bastidores e virou tema da rotina das ruas. Na gestão Lula, ganhou destaque a indicação do primeiro negro, o ministro Joaquim Barbosa, que presidiu o STF e marcou seu mandato por uma série de políticas oriundas de sua rigidez nos julgamentos. Na mesma gestão, foi nomeado o ministro Dias Toffoli, que não tinha passado por qualquer órgão de grande relevância até virar advogado-geral da União, tendo sido, antes, advogado do Partido dos Trabalhadores.

Com a aposentadoria do ministro Celso de Mello, o decano do STF, o presidente Jair Bolsonaro ganha a primeira chance de indicar um nome de sua predileção. Não há lista tríplice, como em outras instâncias, mas já há ruídos. O novo ministro é uma surpresa coletiva, tirado da manga do presidente, que antes tinha prometido um ministro tremendamente evangélico para o cargo. O desembargador Kassio Nunes, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, é católico e não tem qualquer ligação com instâncias bolsonaristas.

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A prerrogativa do presidente pode até ser questionada, mas é do jogo. E pode surpreender. Os ministros – pelo menos em tese -, após a posse, perdem o vínculo político e agem de acordo com o livre convencimento, independentemente do viés ideológico. As exceções confirmam a regra. Joaquim Barbosa capitaneou as ações de desmanche do mensalão, enquanto o próprio Toffoli, a despeito da origem petista, tem se mostrado próximo do Governo. No sábado à noite, recebeu não só o novo ministro como o próprio presidente Bolsonaro, com quem trocou um afetuoso abraço. Nas suas decisões, tem sido próximo do que pensa o Governo.

A politização do debate também faz parte do processo, como ora também ocorre nos Estados Unidos. Com a morte, aos 87 anos, da juíza progressista Ruth Bader Ginsburg, no mês passado, o presidente Donald Trump indicou a conservadora Amy Coney Barret, na tentativa de energizar sua base às vésperas das eleições. O presidente quebrou regras tácitas da política americana ao fazer uma indicação às vésperas do pleito.

Em 2016, quando tinha o direito de indicar um ministro, o então presidente Barack Obama viu sua pretensão ser barrada por conta de estar no final do mandato e com uma eleição à frente. O Congresso entendeu que a escolha deveria ser feita pelo sucessor. A maioria Republicana garantiu a rejeição, mas não fez o mesmo esforço, agora, para adiar o preenchimento do cargo. Ilegal, não; imoral, talvez.

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