Tiago Sarmento lança álbum em inglês mirando mercado estrangeiro

Cantor e compositor juiz-forano gravou ‘Ye Olde Road to Reyourselfing’, sexto trabalho de estúdio, em Portugal


Por Júlio Black

04/10/2020 às 07h00

Depois de rodar por alguns países da Europa, Tiago Sarmento voltou com um novo álbum, desta vez em inglês (Foto: Nathália Pacheco/Divulgação)

O cantor e compositor juiz-forano Tiago Sarmento pegou a mochila e deu um giro pela Europa em 2019 – e voltou do Velho Continente com “Ye Olde Road to Reyourselfing”, seu sexto álbum, lançado em 25 de setembro nas plataformas digitais. O trabalho também é o primeiro totalmente composto em inglês pelo artista, com 12 das 13 músicas de sua autoria – a exceção é “Stop talking to me”, da norte-americana Sonia Kreitzer, que havia sido lançada como single em julho.

“Ye Olde Road to Reyourselfing” foi gravado em agosto de 2019 no estúdio Haus, em Lisboa, com produção do próprio Tiago e Pedro Ferreira como engenheiro de som. A mixagem foi feita em Los Angeles, nos Estados Unidos, por Nando Costa. No estúdio, Tiago Sarmento foi acompanhado por Rodolfo Krieger, ex-baixista da Cachorro Grande, e Gui Amaral na bateria.
“A Maísa Cachos, do site ‘Folk the World’, está morando em Portugal, e quando falei que decidi gravar um disco ela me passou o contato do Rodolfo, que também estava por lá. Ele topou na hora e me indicou o estúdio, pois já tinha gravado lá”, relembra. “Falei com o Rodolfo que precisava de um baterista, e ele disse que conhecia um (o Gui). Ao mesmo tempo, por uma coincidência bem juiz-forana, encontrei em Lisboa alguns amigos que foram por conta do aniversário do meu pai, além do pessoal da ETC e o Vovô (vocalista da The Barrels). Uma dessas amigas, a Marina Hespanhol, disse que conhecia um baterista que também estava por lá. Calhou que os dois bateristas eram um só, o Gui Amaral, que achou que ia gravar dois álbuns.”

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Catarse em terra estrangeira

Sobre a experiência de gravar em país estrangeiro, Tiago diz que, além da novidade, passou a ser “mais um tijolo na parede da experiência”. “Cada vez que você entra em um estúdio diferente não sabe como vai ser, ainda mais com músicos diferentes. Mas é uma novidade controlável, que te deixa fascinado para fazer melhor. E é interessante ver as gírias de gravação em Portugal.”
Pelo histórico da produção, percebe-se que Tiago não foi para a Europa com a ideia de gravar um álbum. Ele confirma que o período “mochilando” pelo continente é que despertou esse desejo. “O primeiro lugar que visitei foi Madri (Espanha), e pela língua não notei muita diferença. Mas depois fui para a Islândia por cerca de dez dias, e foi lá que o inglês começou a me consumir na hora de compor. Foi um momento de muita reflexão, pois foi um grande desejo realizado fazer a viagem para a Islândia. Não foi emocionalmente tranquilo, foi bem catártico”, afirma.

Tiago Sarmento não pretende mais lançar álbuns em português (Foto: Nathália Pacheco)

Ele acrescenta, aliás, que foram três os momentos catárticos que culminaram no disco. “Um foi ao levantar voo da Islândia, só parei de chorar dentro do avião; o outro aconteceu quando coloquei os pés no anfiteatro de Pompeia, e comecei a chorar ouvindo (a música) ‘Echoes’, do Pink Floyd; e quando estava em Liverpool, antes de ir para Nottingham. Toquei em um piano que estava em um calçadão, assim como fiz numa estação de trem em Roma, e isso me deu um pouco mais de autoconfiança. Também em Liverpool, eu estava no Cavern Club (local de alguns shows do início da carreira dos Beatles) e não esqueço do senhor que encontrei lá e ele, um pouco ébrio, falou ‘your song is really great’ (‘sua música é ótima’). Depois eu fui para o hotel e chorei pela terceira vez”, conta.

“Pensei, ‘bicho, eu tenho que tentar, mesmo que seja só mais um disco gravado para uma meia dúzia de pessoas ouvir”, prossegue. “Já sei o que é o fracasso, eu já fracassei antes de fazer sucesso, tenho cinco discos que mostram o que é não fazer sucesso. Um disco a mais ou a menos não vai fazer diferença. No dia seguinte, já em Nottingham, na Ye Olde Trip to Jerusalem (a autoproclamada mais antiga taberna do mundo), sentei lá por dois dias e juntei as mais de 30 letras que tinha.”

Ainda em desencanto

Quando conversou com a Tribuna, em julho, sobre o lançamento do single “Stop talking to me”, Tiago Sarmento revelou sua desilusão com o mercado brasileiro, em geral, e o local, em particular, o que também serviu de incentivo para produzir seu primeiro álbum em inglês. Apesar de o número de ouvintes locais ter aumentado, ele mantém a opinião expressa anteriormente.

“O mercado (musical) juiz-forano não deve servir de base para nada, e já não mais faço parte dele. Não conheço ninguém na Dinamarca, mas mesmo assim tenho mais ouvintes lá que em Juiz de Fora. Tenho 36 anos, nascido, crescido e ‘morrido’ na cidade, tenho ‘vários amigos’ – mais de três mil pessoas no Facebook -, e tenho mais ouvintes em outro país. Nem minha mãe está me ouvindo aqui, na maior plataforma de streaming que temos no momento”, desabafa.

“Ao mesmo tempo, vários estrangeiros elogiam minha música na Europa, mesmo sendo em português, tendo que traduzir ali, na hora… ‘Por que não?'”, argumenta. “Já estou fracassado, já fracassei na música, não vai ter um fundo do poço musical; o que acontecer a partir de agora é vitória, renascimento. Pelo menos 90% das casas noturnas de Juiz de Fora são violão e voz. Autoral? Nem se fala. Se você toca folk e se permite um outro diálogo, a galera acha que pode ficar com raiva de você se não tocar o Djavan que pedem. Há vários músicos muito melhores que eu e que tocam Djavan, provavelmente no bar ao lado; se não quiser pagar meu couvert, sem problema. Estou fazendo uma música diferente.”

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Por conta disso, Tiago não pensa em gravar álbuns em português no futuro – mesmo tendo, como diz, “letras para lançar dois álbuns” -, ainda mais com o retorno que diz que passou a ter com “Ye Olde Road to Reyourselfing”. “Nem aqui em Juiz de Fora estava sendo ouvido, e com poucos dias o novo álbum superou as músicas em português em velocidade e porcentagem de crescimento. E agora a cidade apareceu entre as primeiras da lista… Qual é essa sensação de cachorro vira-lata que a gente tem? A única coisa que fiz foi fazer o meu som do meu jeito, o que me faz feliz. O que me fazia feliz naquele momento era gravar aquelas músicas, se amanhã quiser gravar em espanhol, será assim. Está muito errado esse mercado daqui.”

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