Um risco incalculável


Por Azelino Cesar de Lima, professor

16/08/2020 às 06h58

A meu ver, a volta às aulas não é risco de vida. Pois é, mas, antes que me condenem, complemento: é certeza de morte. Conheço muito bem o dia a dia das escolas públicas e privadas. Nelas passei quase cinco décadas da minha vida trabalhando como professor e sei que a lida educacional possui uma razoável distância entre teoria e prática.

Teoricamente, a educação deveria ser uma obrigação do Estado, mas, por absoluta incapacidade de gerenciamento total, na prática, este dever foi amplamente partilhado com a iniciativa privada, que cobra seu preço, o que é absolutamente normal, pois ninguém trabalha de graça. As escolas se dividem em públicas e privadas, e os mais desavisados pensam que nas públicas a educação é gratuita. Não é. Os profissionais da educação que trabalham nas escolas públicas, municipais, estaduais ou federais, do professor à faxineira, são todos assalariados, e os prédios destas escolas, próprios ou alugados, demandam manutenção, pois gastam água, luz, telefone e inúmeros outros itens. A teoria dessa gratuidade é falsa, pois alguém está pagando por tudo isso, na prática, o cidadão que recolhe seus impostos, muitos deles tão disfarçados e embutidos que o coitado nem sequer percebe.

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Dizem alguns que educação é investimento. Concordo. O que não é aceitável é o fato de algumas escolas públicas, em decorrência de desperdícios, desvios, péssima gestão e total deszelo, possuírem custos muito mais elevados do que as mais refinadas escolas particulares, que, teoricamente, possuiriam os mesmos gastos das públicas, acrescidos do lucro dos donos, pois se trata de um negócio como outro qualquer, sujeito às regras de mercado.

É exatamente neste ponto que, teoricamente, aparece, sem qualquer cerimônia, a figura malévola do interesse, na prática, ponto focal da questão “voltar ou não às aulas bem no meio de uma pandemia”. De um lado, a administração pública quer estar bem aos olhos de todos e, às vezes, se curva à realidade dos fatos, não medindo bem as consequências de aventuras por caminhos incertos e destinos de alheios, o que é lamentável. Do outro, o grande problema das particulares. As despesas continuam, pois é preciso honrar os compromissos com fornecedores e os salários de seus funcionários, mas o faturamento despencou.

E aí? Bem no meio desta pandemia estão também gigantescos interesses comerciais de terceiros. Poderosos laboratórios internacionais travam uma verdadeira guerra pela comercialização das suas vacinas, por enquanto, somente promessas, que nem sequer foram produzidas, sendo algumas delas com noticiados e possíveis resultados duvidosos. Essas são algumas das variáveis que estão assombrando uma tragédia anunciada.

E agora, José? Responda você, como cidadão versado e inteligente que é: na teoria e na prática, a quem interessa o retorno das crianças e dos jovens às salas de aulas?

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