Protesto por melhorias fecha BR-267 por uma hora

Após conversa com Dnit, deputado federal presente no ato diz que máquinas devem começar a trabalhar em 20 dias


Por Sandra Zanella

11/03/2020 às 10h29- Atualizada 28/05/2020 às 13h00

Protesto fechou a rodovia na manhã desta quarta-feira (Foto: Sandra Zanella)

O caos em que se transformou o esburacado trecho da BR-267 entre Juiz de Fora e Bicas mobilizou lideranças políticas e moradores de dez cidades da região em um protesto pacífico, na manhã desta quarta-feira (11), no km 68 da rodovia. O ato foi um pedido de socorro diante do aparente descaso das autoridades com a grave falta de manutenção da estrada, que tem colocado milhares de vidas em risco todos os dias, há mais de três meses. Os manifestantes fecharam totalmente a via, pouco depois das 8h, permitindo apenas a passagem de ambulâncias e de outros veículos de urgência. Cerca de uma hora depois, por volta das 9h15, a pista sentido Juiz de Fora/Bicas começou a ser liberada e, em seguida, todas as faixas de circulação voltaram a ser abertas ao tráfego. O fim antecipado do movimento, previsto para terminar às 10h, aconteceu após negociação com a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Mesmo assim, houve congestionamento de até um quilômetro em cada sentido.

Um dos interlocutores junto ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), o deputado federal Júlio Delgado (PSB) esteve presente na manifestação, após conversa com a direção do órgão federal na véspera. “O departamento não vai decretar emergência”, anunciou. A alegação, segundo o parlamentar, é que a licitação para contratar uma nova empresa já está para ser concluída, e as obras começariam em 20 dias, mesmo período que delongaria o ato emergencial. Os trabalhos inicialmente seriam paliativos, com tapa buracos, para um novo recapeamento asfáltico ser iniciado após o período chuvoso.

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“Esse protesto representa o esgotamento da capacidade de negociação que os prefeitos e representantes da região tiveram. Estamos solidários à paralisação, porque a rodovia está intransitável.” Conforme o deputado, o diretor do Dnit assumiu o compromisso de começar a resolver o problema até início de abril. “Ele nos deu prazo de 20 dias para que as máquinas já estejam aqui fazendo, primeiro, uma trafegabilidade. Mas o processo de licitação envolve a revitalização de toda a rodovia.” O deputado estima que os custos ultrapassem R$ 30 milhões, sendo que o valor chegaria a R$ 100 milhões no caso de a recuperação se estender até Leopoldina.

Além de Juiz de Fora, as cidades da Zona da Mata mais afetadas pela precária pavimentação do pequeno trecho de 30 quilômetros mais crítico da BR-267 integram o Consórcio Intermunicipal de Especialidades (Ciesp). A associação pública tem sofrido para conseguir transportar pacientes de Bicas, Descoberto, Guarará, Mar de Espanha, Maripá de Minas, Pequeri, Rochedo de Minas, São João Nepomuceno e Senador Cortes. O órgão ligado à saúde, que tem Juiz de Fora como referência para atendimentos de consultas e exames, chegou a enviar ofício ao Dnit, no dia 19 de fevereiro, informando as dificuldades enfrentadas diariamente devido aos “inúmeros buracos e verdadeiras crateras”. Problemas pelos quais também passa qualquer tipo de veículo, inclusive ônibus de várias linhas intermunicipais e interestaduais. “A situação é insustentável, já que as más condições de trafegabilidade da BR-267 têm prejudicado os aspectos sociais e econômicos”, alertou o Ciesp.

Para a secretária executiva do consórcio, Mônica Loureiro, o objetivo da manifestação foi cumprido. “Não quisemos dificultar a vida de ninguém, por isso escolhemos um horário mais tranquilo. Queremos mesmo é chamar a atenção das autoridades competentes para resolverem a nossa situação. Por isso estamos aqui, com todos os prefeitos unidos, da forma mais pacífica.” Segundo ela, a saúde é uma das grandes causas do movimento, “pelo tempo que estamos tendo de transporte dos pacientes até Juiz de Fora”.

Rodovia de fuga
O deputado Júlio Delgado foi o responsável por levar o ofício do Ciesp ao Dnit. “Informamos sobre a paralisação e que precisamos de revitalização total do trecho entre Juiz de Fora e Maripá. A emenda de bancada que colocamos (R$ 10 milhões) não é impositiva, temos que lutar para liberar. Mas o Governo tem recursos”, completou. Segundo ele, a direção do Dnit informou terem ocorrido “equívocos” com a empresa que era responsável pela conservação do segmento, como não cumprimento de obrigações e critérios. O parlamentar destacou que a BR-267 tem sido utilizada como rodovia de fuga e interligação. “Muita gente, caminhoneiros de veículos pesados, para poder fugir de balança, sai da 040 e da 116 e usam a 267, causando tráfego muito maior do que em muitas estradas com concessão. Nós não queremos que o Dnit tenha que recuperar aqui para colocar concessão, como foi feito historicamente. Essa rodovia é de total responsabilidade do Governo federal, e ele tem que disponibilizar os recursos.”

Em nova nota nesta quarta-feira, a assessoria do Dnit não confirmou prazos, mas voltou a reafirmar que está realizando processo licitatório para contratação de serviços de manutenção e de conservação na BR-267, entre Bicas e Juiz de Fora. “O contrato anterior estava paralisado por determinação judicial, o que justifica os problemas verificados na rodovia”, explicou.

Iniciativa privada tapa buracos com terra

Motoristas e passageiros que seguiam pela rodovia e foram surpreendidos pela interdição na manhã desta quarta-feira (11) também apoiaram o movimento, apesar da longa espera. Cristiane Novais, 43 anos, seguia para Natividade (RJ) e precisou aguardar por cerca de 40 minutos para continuar a viagem. “Eu não sabia do protesto, mas tinha conhecimento da condição da estrada. Tenho uma filha que estuda em Juiz de Fora, então venho uma vez ao mês. E realmente está um caos, desde outubro. Ainda comentei ontem: isso está uma vergonha, ninguém vai fazer nada? Se os governantes não tomam as providências, o povo realmente tem que gritar e pedir socorro.” Já o motorista Rubens Caobianco precisou aguardar 50 minutos para prosseguir pela rodovia até Senador Cortes. Mesmo assim, apoiou a manifestação. “Esta estrada está muito difícil.”

Enquanto a reportagem seguia para o protesto e constatava uma rodovia muito mais caótica do que aquela denunciada há mais de três meses pela Tribuna, uma equipe foi vista tapando buracos com terra. Segundo populares, a operação foi promovida por iniciativa de um empresário que possui uma frota de cerca de 20 caminhões, os quais estariam sendo danificados pelas péssimas condições do pavimento. “Hoje estamos correndo risco de acidentes sérios. Se a população não estivesse colocando terra nos buracos, a rodovia já estaria paralisada”, disparou o deputado Júlio Delgado. Conforme ele, uma parceria tentada pelos prefeitos junto ao Dnit na recuperação do trecho também foi inviabilizada por falta de verbas.

O prefeito de Descoberto, Marcos Lima (PSDB), disse que os moradores têm sofrido as piores consequências possíveis. “O prejuízo não é só ao erário público. Há também o desconforto e risco para pacientes e universitários. Acredito que não tenha nenhum município que consiga colocar os estudantes no primeiro horário.” Ele classifica a situação como “humilhante”. “Estamos fazendo essa paralisação para chamar a atenção do Governo federal e dos deputados que nos representam.”

O chefe do Executivo de Pequeri, Rafaneli Sales de Almeida (PSDB), reforçou que os 60 quilômetros até Juiz de Fora se transformaram em duas horas de viagem. “O problema maior é que os três ônibus que temos para levar os alunos estão chegando atrasados, e eles estão perdendo aula. Estamos no ponto de não termos como prestar conta do que estamos gastando com a reforma dos carros. Amanhã o Tribunal de Contas vem nos cobrar: por que tanto pneu o senhor comprou? É muito descaso e falta de respeito.”

O prefeito de Guarará, José Maurício (PSDB), fez coro com as demais lideranças sobre o atraso nas viagens, ainda mais preocupante para os serviços de saúde e educação. A demanda vem desde 2017, quando enviou ofício ao superintendente do Dnit, em Belo Horizonte. “Pedi melhorias, como recapeamento e acostamento asfaltado. Ele respondeu que não tinha verba. Em abril de 2018, marcamos reunião com o ministro dos Transportes. O superintendente também foi e disse que o serviço ficaria em torno de R$ 200 milhões. O ministro falou que não tinha dinheiro, mas pediu para que atualizasse o valor e colocasse no orçamento de 2019. Mas como o presidente e o ministro mudaram, ficou parado.”

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De acordo com a secretária de Saúde de Mar de Espanha, Jaqueline Pacheco, para se ter uma ideia do tamanho dos transtornos, diariamente, dois ônibus com 28 passageiros cada precisam cruzar o “campo minado” até Juiz de Fora, além de oito veículos menores. Já outros cinco coletivos transportam 600 estudantes em dois turnos. Um desses quebrou a roda na última semana, e os universitários tiveram que aguardar na estrada para serem levados em outro veículo. “Eles chegaram só às 22h, quando normalmente retornam às 18h, 19h. Esperamos providências, porque as pessoas que fazem tratamento de saúde já têm um sofrimento, como os pacientes de oncologia, que fazem quimioterapia, e os de hemodiálise. Tudo isso correndo o risco de ficarem pelo caminho. É a vida deles que está em risco.”

Na pele
À frente da Prefeitura de Senador Cortes, Pedro Paulo dos Santos (PTB) sentiu literalmente na pele o incômodo pela falta de pavimentação decente na 267. Ele passou por uma cirurgia abdominal e foi orientado pelo médico a se recuperar por mais tempo em Juiz de Fora a fim de evitar as viagens, já que as trepidações ou quedas bruscas do veículo poderiam prejudicá-lo. “Precisamos de caminho, e rápido. Pelo amor de Deus. Eu sofri.”
O chefe do Executivo de Maripá de Minas, Sebastião Machado (PSDB), concluiu: “Temos que circular nesta estrada todos os dias, não tem como evitar. O prejuízo para o Município é muito grande, porque quebram muitos carros. É dinheiro jogado fora. Acho que pelo menos uma melhoria o povo da Zona da Mata merece.”

Crateras prejudicam a própria fiscalização, diz PRF

Após o fim da manifestação, o policial rodoviário federal Wallace Wischansky confirmou que o dia e horário escolhidos para o ato são de menor impacto, por isso o engarrafamento não se estendeu por mais de um quilômetro. “Mas qualquer congestionamento em uma rodovia como a BR-267, na situação em que se encontra, é sempre muito preocupante e problemático. Por isso a PRF sempre fala que não pode acontecer interdição, não é permitido legalmente. Logicamente entendemos toda a demanda e preocupação, porque estamos falando em segurança, bem-estar e economia, porque os municípios do entorno dependem dessa estrada no seu dia a dia. A revolta se justifica, mas os meios nem sempre são os ideais.” Também de forma pacífica, a PRF orientou os manifestantes, que decidiram encerrar o ato mais cedo. “Negociamos a liberação e não tivemos qualquer tipo de problema ou incidente”, afirmou Wischansky.

O policial lembrou que, além dos buracos, a própria característica da BR-267 causa preocupação. “É um traçado, em alguns lugares, muito sinuoso, com aclives e declives acentuados. A falta de uma terceira faixa para veículos mais lentos acaba gerando uma ansiedade em alguns motoristas, que fazem ultrapassagens em faixas contínuas, causando risco para si e outros.” Ainda assim, a rodovia não registra alto número de acidentes. “O fluxo é muito menor do que nas BRs 040 e 116, embora a 267 hoje seja muito procurada por vários condutores de transporte de carga que buscam sair da região de pedágio. O veículo pesado, transitando com mais frequência na rodovia, gera um desgaste mais prematuro. E nem sempre conseguimos fiscalizar o excesso de peso, que com certeza é um dos maiores violões do pavimento.”

Mesmo com todas as ponderações, Wischansky admite ser necessária uma “ação de emergência”. “Oficializamos os órgãos competentes há bastante tempo, porque até mesmo a fiscalização fica prejudicada: como vou fiscalizar uma pessoa cometendo infração de trânsito em uma rodovia em que ela sequer consegue se manter na faixa de rolamento, dada a quantidade de buracos?”

Tópicos: br-267

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