Peça de ficção

O Orçamento é a peça principal para a execução das emendas impositivas criadas pelo Congresso, assembleias e Câmaras, pois nem sempre tem projeções suficientes para atender os pedidos dos parlamentares


Por Tribuna

06/03/2020 às 07h04

O Orçamento é uma peça de ficção, pois, embora defina as despesas, tem na arrecadação apenas uma expectativa. Como se trata de projeção, há uma dependência direta das circunstâncias políticas e econômicas, principalmente. É peça fundamental em todos os níveis administrativos, por tratar-se de um documento próprio para a elaboração de metas. Ele é acompanhado com atenção, sobretudo pela instância política por causa de as emendas parlamentares também serem definidas com base em suas projeções.

Como tem, necessariamente, que passar pelo Legislativo, o relator tornou-se, ao curso dos anos, uma das mais poderosas figuras dos parlamentos, por conta do próprio papel que desempenha. Um dos momentos mais sombrios da história recente do Congresso ocorreu em 1993, quando, a partir de denúncias do economista José Carlos Alves, foi desvendado o que ficou conhecido como “Escândalo dos anões do orçamento”. Deputados que faziam parte da Comissão de Orçamento criaram esquemas de propina que culminaram com 18 acusações de fraude. Seis foram cassados. O presidente da Comissão, deputado João Alves, lavava o dinheiro comprando bilhetes premiados de loteria.

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A questão agora é outra. O Congresso, com extensão às assembleias e câmaras municipais, criou a figura da emenda impositiva, pela qual, a despeito de qualquer argumento com base no desempenho da Lei de Meios, os governos são obrigados a pagá-las. A principal justificava dos legisladores foi o que chamaram uso político das emendas e intransigência, sobretudo, dos técnicos da área econômica.

No primeiro caso, a despeito da prerrogativa dos parlamentares de indicarem o destino dos recursos provenientes de emendas, há o velho hábito de o Governo da vez de só atender aos aliados, deixando os demais sem qualquer perspectiva – o que é um problema, especialmente em anos eleitorais.

A segunda questão é meramente técnica. Pelo viés impositivo, o Executivo não tem como bloquear os repasses com base em contingenciamentos. No caso nacional, estão em jogo cerca de R$ 31 bilhões. O presidente Jair Bolsonaro vetou a proposta do Congresso e foi respaldado pela maioria do próprio Legislativo ante o risco de o Governo ficar sem recursos para cumprir outras metas. Uma negociação deu fim ao impasse, mas foi apenas uma solução temporária.

Com base nas emendas impositivas, os legisladores entendem que poderão cumprir promessas que ficavam na dependência do humor do Executivo. Ademais, consideram ser a única saída para isonomia de repasses, isto é, sendo aliado ou não do Governo, o parlamentar tem as mesmas garantias de pagamento.

A discussão, no entanto, ainda não foi pacificada, pois os dois lados têm sólidas razões para defenderem seus pontos de vista. Em momentos como este, porém, vale o princípio da razoabilidade. É necessário um entendimento capaz de superar divergências sem, no entanto, comprometer o caixa do Executivo, que, em tempos de crise global, está bem abaixo de todas as expectativas, com cenários mais críticos para estados e municípios ante a dependência direta do combalido caixa da União.

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