Jovem preso por roubo em JF tenta provar inocência

Suspeito foi reconhecido por vítima nesta segunda na delegacia, mas câmeras mostram que ele estaria do outro lado da cidade


Por Sandra Zanella

14/10/2019 às 17h51- Atualizada 14/10/2019 às 20h20

Depois de ter passado dois dias no Ceresp, um jovem de 24 anos preso em flagrante pela Polícia Militar por roubo a pedestre na noite do último dia 3, no Cruzeiro do Sul, tenta provar sua inocência. Apesar de ser morador do mesmo bairro da Zona Sul de Juiz de Fora onde aconteceu o crime, o ajudante de pintor Rafael Minas de Souza afirma que estava no Centro e na Avenida dos Andradas, no Morro da Glória, quando o assalto acontecia.

Câmeras de segurança de estabelecimentos comerciais por onde o rapaz passou também reforçam a tese defendida pelo advogado Carlos Mattos. No entanto, na manhã desta segunda-feira (14), o suspeito voltou a ser reconhecido pela vítima, desta vez pessoalmente, durante procedimento na 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil, em Santa Terezinha. Por meio de um vidro espelhado, a mulher de 22 anos reafirmou ter sido Rafael quem a rendeu com um canivete, roubando sua mochila com blusa de moletom, celular, carteira, R$ 30, documentos e chaveiros, próximo a um escadão na Rua Aurora Torres, na divisa com Santa Luzia.

PUBLICIDADE
Rapaz esteve na delegacia na manhã desta segunda (Foto: Carlos Mattos)

O primeiro reconhecimento havia sido feito por meio de fotografia mostrada pela PM à jovem no dia do delito. “Houve falha desde o início. A vítima sofreu pressão psicológica por ter sido assaltada e a induziram, mostrando a foto de um homem negro, alto e magro, características comuns na nossa sociedade”, aponta o advogado. “Isso cria uma falsa memória. Mas temos imagens demonstrando que ele foi preso injustamente.” Ao deixar a delegacia nesta segunda, após averiguação também criticada pela defesa, diante da ausência de outros suspeitos e de uma estrutura “precária”, Rafael desabafou com Carlos: “Precisamos correr atrás. Por eu ser negro e pobre, ninguém vai fazer nada para provar minha inocência”.

Após ter sido preso na noite do dia 3, Rafael ficou até o fim da manhã seguinte na delegacia e foi encaminhado ao Ceresp. Já na tarde do dia 6, o jovem obteve a liberdade provisória durante audiência de custódia no Fórum Benjamin Colucci. “O próprio juiz apontou que ele seria facilmente confundido com outras pessoas. E o primeiro reconhecimento feito por foto é ilegal, conforme o Processo Penal. Isso é questionado pela doutrina e pela jurisprudência”, adverte Mattos. “A vítima continua insistindo ser ele o autor. Ela afirma ter sido assaltada às 19h, mas no boletim de ocorrência consta 20h21, horário bem divergente.”

‘Ceresp foi humilhante, estou com vergonha’

Enquanto corria trás de imagens de câmeras de segurança na tarde desta segunda-feira (14) para provar sua inocência, Rafael falou por alguns minutos com a Tribuna. “Ninguém da polícia vai me ajudar, porque sou negro e pobre. Minha mãe, minha família e meus amigos é que estão comigo. As lojas também estão colaborando com as filmagens, para eu ter minhas provas. Já pedi para puxarem as gravações do Olho Vivo.” O jovem confessa estar receoso de andar na rua após tudo o que passou. “Foi humilhante ir parar no Ceresp. Não desejo nem para cachorro. Fui chamado de ladrão. Passei a maior vergonha.”

Segundo a defesa, naquele dia 3, a filha da namorada de Rafael, de 2 anos, havia passado mal, e eles a levaram ao Pronto Atendimento Infantil (PAI) na Avenida dos Andradas. “Conseguimos as filmagens em horários bem próximos ao do roubo”, conta o advogado Carlos Mattos. Segundo ele, a partir das 18h o rapaz esteve no Fórum, em uma loteria na Avenida Rio Branco e depois seguiu para o Parque Halfeld, onde ficou sentado com a mulher e a enteada à espera de um primo. Eles seguiram caminhando até o PAI, e a criança foi atendida por volta das 19h20. Por volta das 20h, uma compra de medicamento foi feita em uma farmácia da Andradas. Antes disso também o jovem e o parente foram à padaria comprar pirulitos para a menina, sendo as imagens disponibilizadas.

No dia do roubo, a PM bateu na casa de Rafael, no Cruzeiro do Sul, e foi atendida pela mãe dele. Ao ser informado, aos prantos, por ela que estava sendo procurado, o rapaz se apresentou à polícia na mesma noite. “Ele ficou até a manhã seguinte na delegacia, e a família já tinha conseguido algumas filmagens, mas o delegado nem quis ver nem ouvir ninguém”, afirma a defesa.

Flagrante delito

Em nota, a Polícia Civil informou que a ocorrência foi recebida no plantão pelo delegado Francisco Rezende Corrêa. “Na ocasião, a autoridade policial entendeu que todas as testemunhas necessárias para a formação da convicção da autoridade foram ouvidas. Desta maneira, foi ratificada a prisão do suspeito, em flagrante delito, pela incidência penal de roubo qualificado.” O caso foi encaminhado para a Delegacia Especializada de Roubos, e o titular, Rafael Gomes, investiga o caso. A Tribuna também entrou em contato com a PM, mas a corporação não se pronunciou até o fechamento desta reportagem.

O conteúdo continua após o anúncio

“Vamos aguardar a finalização do inquérito. Queremos provar que ele está sendo injustiçado. Mesmo com as provas que temos até o momento, meu cliente está muito abalado”, pontua Carlos. Embora ainda espere o desenrolar do caso, inclusive o parecer do Ministério Público, o advogado já pensa em processar o Estado. “Depois que ficar comprovada a inocência dele, vamos tomar essa providência. Não pela questão financeira, mas pelo constrangimento que passou, ficando no Ceresp com superlotação de 1.200 pessoas. Insisto: houve falha desde o início.”

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.