Faz (toda) diferença


Por Renan Ribeiro

14/09/2019 às 07h00

Passei o olho correndo pela mesa de trabalho e não notei aquele pequeno pedaço de papel amarelo de primeira. Toquei a vida, com as atividades que já estavam acumuladas e aquele pequeno recado foi ficando para depois. A rotina, às vezes, engole as sutilezas mais saborosas e importantes. Dia desses, uma amiga me deu um bombom. Eu agradeci e fiquei muito feliz na hora, mas ao invés de viver aquele momento até o fim – desembrulhando e saboreando o chocolate, como deveria ter feito -, guardei-o para depois. Era preciso seguir em frente e concluir as muitas tarefas do dia. O prazer de viver aquela alegria poderia esperar, eu concluí, equivocadamente.

Mora nesse instante o perigo. Não me dei conta, mas pensado depois, fiquei horrorizado. Me lembrei de outras pequenas coisas que fui deixando para ver e sentir depois, ao longo da semana. Veio na mente as horas de sono que deixei de dormir, porque era preciso acordar mais cedo para dar conta; a ligação que eu não fiz, porque tinha algo mais urgente na lista; da mensagem que eu cheguei a rascunhar, mas não enviei, porque o assunto parecia irrelevante, do abraço que deixei de dar, porque parecia não fazer sentido abraçar sem ter motivo.

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Talvez, se não tivesse deixado de fazer tudo isso, voltar ao bilhete amarelo não tivesse um efeito tão forte quanto teve. Era uma mensagem bem simples e direta, que fui ver com horas de atraso. Ela dizia sobre estar tudo bem errar às vezes, ter dias ruins, não ser perfeito, ser você mesmo e fazer o que é melhor para você. Lembrava ainda que havia estrada além do que era possível ver. O que não estava escrito ali também foi essencial para eu entender a mensagem.

Foto: Felipe Coury

Nós não devemos esquecer de nós mesmos. Estamos nos tornando automatizados, nos planejamos para fazer tudo com pressa, entregar tudo com o máximo de rapidez e eficiência possível. E onde nós ficamos no meio dessa correria toda? Onde nos colocamos? Qual é o espaço de exercer o nosso querer de maneira consciente e presente? O pequeno e potente bilhete que recebi me fez parar e entregar um abraço, no meio do dia. Ele me ajudou a enxergar melhor ao interromper todas as minhas preocupações, mudando a perspectiva pela qual eu via tudo passar. Passei a me concentrar em mim e nas pessoas que estão ao meu redor. No frigir dos ovos, valorizar a vida parte de ver com cuidado cada uma das pequenas coisas que a compõem. Nenhuma delas é desimportante, ou deve ser deixada de lado. Cuidar do que sentimos é tão relevante quanto cuidar do corpo, ao qual somos mais incentivados a estar atentos. É necessário lembrar disso sempre! Faz (toda) diferença!

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