A dor de uma mãe é de todas as mães

A coluna deste domingo fala sobre o amor que move uma mãe em busca da filha desaparecida


Por Regina Campos

07/07/2019 às 07h00- Atualizada 24/07/2019 às 09h52

Ao se aproximar do início da peregrinação junto a dezenas de romeiros rumo a Aparecida, 17 de julho, tenho procurado ler e entender mais um pouco sobre fé, um sentimento que sempre foi imprescindível na minha vida. Estudo, rezo, agradeço e vou armazenando meu estoque de fé em um pote imaginário. Quando necessário, recorro a ele para me abastecer de confiança. Na minha concepção, dores e provações são inevitáveis e, muitas vezes, necessárias para o nosso progresso espiritual. Para vencê-las, é preciso ter fé, uma palavra tão pequena e de um significado gigante.

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Nos meus mais de 30 anos como repórter, em Juiz de Fora e Belo Horizonte, presenciei muitas tragédias. Convivi com os dramas mais diversos, conheci o melhor e o pior do ser humano e nunca me acostumei com isso. Certa vez, ao cobrir um acidente de carro que matou três crianças, não escondi o choro ao entrevistar o policial responsável pelo registro da ocorrência. “Você deve ser nova no ramo”, ele me disse. “Com o tempo, você se acostuma.” “Não. Não quero me acostumar”, pensei sozinha, com a certeza de que jamais conseguiria ser insensível à dor do outro. E chorei muitas vezes depois disso. Outras histórias, outras dores, sem nunca me acostumar a elas.

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Graça de Deus mantém a fé de encontrar sua filha que só viu na hora do parto (Foto: Leonardo Costa)

Foi assim, sempre transparente com os meus sentimentos, que conheci Graça de Deus (foto). Buscava alguém que fornecesse refeição para fora, e ela me foi recomendada por uma vizinha. Cheguei ao endereço, e ela já me esperava no portão. “Foi Deus que te mandou aqui. Soube que você é jornalista e sei que vai me ajudar”, me disse emocionada. Tive medo da expectativa que ela depositava em mim e pedi que me contasse sua história para que eu pudesse entender por que Deus “teria me mandado lá”.

Em 1980, Graça, com então 15 anos, morava com os pais e os irmãos em Lima Duarte quando engravidou. Os pais, logo que souberam do fato, levaram a filha para o Abrigo Santa Mônica, entidade filantrópica em Juiz de Fora que hospedava moças solteiras grávidas. O bebê, uma menina, nasceu no dia 24 de abril de 1981, na Maternidade Therezinha de Jesus.
Logo após o parto, Graça segurou a filha nos braços por alguns minutos e em seguida não pôde mais ficar com a criança. Como todas as outras mães recebiam seus bebês nos quartos, ela não entendia o motivo daquela separação. A resposta só veio no dia em que recebeu alta do hospital. Os pais de Graça deram a neta recém-nascida para adoção.

Desde então, Graça não passa um dia sem procurar pela filha. Ela nunca soube quem adotou a menina e qual o nome ela recebeu, mas jamais desistiu de tentar encontrá-la. Conta sua história para todos que cruzam seu caminho na esperança de que, ao observar seu rosto, a pessoa reconheça alguma menina/moça/mulher que tenha seus traços. Certa vez, ela me disse que, sempre que se deita, à noite, pensa em como estará a filha naquele momento, se sente frio, fome… se é feliz, amada… se sabe de sua existência, se tem vontade de conhecê-la…

Fiz algumas reportagens sobre essa história e não consegui uma pista que ajudasse Graça, mas não me afastei mais dela. A dor constante que ela carrega em seu peito também é minha e é de todas as mães que conhecem essa história. Quando uma mãe sofre, todas as outras mães sofrem junto.

Por isso, minha amiga, ao caminhar rumo ao santuário de Aparecida, estarei com você em meu pensamento.

P.s.: Confira abaixo (e também na TMTV) a entrevista com dois dos coordenadores da Caminhada da Fé, Marco Aurélio Costa e Miriam Cristina Brandão.

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Tópicos: fé na estrada

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