Pelo direito ao futebol


Por Gabriel Ferreira Borges

18/06/2019 às 07h00

De maneira mórbida, a Copa América finda, em 2019, após 12 anos, a era de grandes eventos esportivos sediados pelo Brasil. Ainda que as mazelas sociais saltassem aos olhos, o Governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e a CBF articularam a candidatura do Brasil como sede dos Jogos Mundiais Militares, Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos. À época, o Rio de Janeiro já se estruturava para receber os Jogos Pan-Americanos.

Calculado, na década passada, em meio às benesses econômicas, o movimento fora irresponsável, senão negligente; o setor da construção civil, entretanto, lambeu os beiços. Pois bem. Se há legado do período, apenas a consolidação da elitização do esporte mais popular do país, uma vez que, como antes, por outro lado, as modalidades olímpicas padecem de condições minimamente satisfatórias para a prática. A elitização do futebol, contudo, é a consequência cabal. Justiça seja feita, o processo iniciara seu curso em países desenvolvidos, como a Inglaterra, já nos anos 1990.

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No Brasil, a elitização foi demarcada, essencialmente, a partir da construção ou, então, reforma dos estádios para a Copa do Mundo. Tornaram-se arenas. A mudança não é meramente semântica; as arenas instituem um processo de gentrificação. Se, nos estádios, a geral era o setor de emancipação dos torcedores subalternizados, nas arenas estes nem entram. A cabo da elitização, a relação dos clubes com os torcedores foi logicamente mercantilizada; o futebol é um produto, e o torcedor um consumidor, vejam só. Bem como as transmissões pay-per-view, os programas de sócio-torcedores das agremiações institucionalizaram a mudança de paradigma.

Como escreve o brilhante Luiz Antonio Simas, historiador, a arenização dos estádios está relacionada a “estratégias de desencanto, higienização urbana, esvaziamento de sentidos, contenção do lazer e ataque às formas de sociabilidade dos pobres”. Na abertura da Copa América, no confronto entre Brasil e Bolívia, o público de 46 mil pessoas deixou nos cofres da Conmebol cerca de R$ 22,5 milhões. O futebol retorna às origens aristocráticas; os torcedores, então, darão lugar a simpatizantes.

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