Partilhando minha fé

Acompanhe, a partir deste domingo, os preparativos da jornalista Regina Campos para a caminhada da fé até o Santuário de Aparecida


Por Regina Campos

16/06/2019 às 07h00- Atualizada 24/07/2019 às 09h52

Nascida numa família de oito filhos, com muitos tios e primos, sempre vivi cercada de muito afeto. A casa da minha avó materna, Celme, era o nosso mundo mágico. Ali morava a felicidade, e a sensação era de que toda aquela alegria seria para sempre. Os anos foram se passando, o amor foi sendo sedimentado e, na fase adulta, estávamos preparados para o mais difícil desafio que nossa família iria enfrentar. Uma de minhas irmãs, Eliane, na época com 23 anos, recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla.

PUBLICIDADE

Era o ano de 1990, eu tinha acabado de me tornar mãe e conhecer o maior amor do mundo. Tentava conciliar a felicidade de ter meu filho nos braços com a angústia de imaginar qual seria o futuro da minha irmã. Ela tinha acabado de se casar e, assim como eu, sonhava em gerar um filho. Busquei uma força interior que nem sabia que tinha e não permiti que o medo me paralisasse. Junto com os meus irmãos, prometemos a Eliane que faríamos de tudo para dar a ela todos os recursos disponíveis para preservar sua qualidade de vida. Unidos por uma fé inabalável, seguimos juntos para enfrentar o que viesse. Três anos após o diagnóstico, nasceu Thales, o filho que Eliane tanto sonhou.

De lá para cá, a luta foi se tornando árdua. Proporcionamos a ela todo tratamento disponível na época, consultas aos maiores especialistas do país, mas nada disso impediu que a doença avançasse. Em pouco tempo, as pernas já não conseguiam mais sustentar o corpo, e Eliane precisou ir para uma cadeira de rodas. Mulher jovem, forte e com um filho ainda pequeno. Se o destino era esse, tínhamos que aceitá-lo. Nossos braços se fortaleceram para empurrar a cadeira aonde quer que Eliane quisesse ir. Até que a coluna já não conseguia mais manter o tronco ereto e sentar passou a ser um sacrifício para ela.

Os últimos oito anos, Eliane passou em cima de uma cama, sem conseguir falar, se mexer e deglutir, sendo alimentada por uma sonda gástrica. Dentro do quarto, nós compartilhávamos histórias e celebrávamos vitórias, enquanto ela vivenciava tudo com resignação. A fé continuava inabalável. Nos mantínhamos fortes, sem revolta ou tristeza. Ao contrário, a firmeza em saber lidar com a fragilidade da vida nos encorajava, e a doença unia ainda mais a nossa família.

No dia 5 de maio, aos 52 anos, Eliane se foi. Ao nos despedirmos dela, nossa família era só agradecimento por tudo que ela nos ensinou. Foram anos e anos de muito amor e companheirismo. Seguimos nossas vidas aqui na Terra com a certeza de que a experiência ao lado dela nos transformou em pessoas melhores.

Como jornalista, profissão que exerço há 33 anos, acredito ter aperfeiçoado meu olhar para o mundo. Alimento minha alma ouvindo e contando histórias de pessoas comuns que, assim como eu ou Eliane, aprendem todos os dias a vencer as dificuldades impostos no caminho. Por tudo isso, me senti motivada a propor à direção da Tribuna cobrir os dez dias da Caminhada da Fé, realizada todos anos por devotos de Nossa Senhora Aparecida.

Partirei a pé, ao lado de cem romeiros, de Juiz de Fora até a Aparecida do Norte, no dia 17 de julho, com chegada ao Santuário no dia 27. Serão 300km percorridos em dez dias de caminhada, período que irei conectar comigo mesma, conhecer lugares e pessoas, ouvir e contar histórias. Quero saber quem são esses devotos e porque eles caminham a pé até o santuário, mostrar a rotina da viagem, as refeições, os alojamentos, os lugares por onde passam os romeiros, os voluntários que abrigam e ajudam a alimentar os peregrinos e descobrir a fé que move todas essas pessoas.

Criada por uma família espírita, doutrina que sigo com muita convicção, me encanto pela devoção cristã, independente de religião. Por isso, me senti à vontade ao me apresentar ao grupo de fiéis da Igreja Católica e pedir para seguir por dez dias ao lado deles, com respeito e admiração. Meu objetivo é mostrar aos leitores, internautas e ouvintes do Grupo Solar de Comunicação todos os ângulos desse desafio de caminhar por tanto tempo, vencendo limites em nome da fé.

Te convido a embarcar comigo nesta viagem de autoconhecimento. Estarei ocupando este espaço nos próximos dias para relatar minhas impressões dessa experiência única que desejo vivenciar.

O conteúdo continua após o anúncio

 

 

 

Tópicos: fé na estrada

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.