Lei Áurea, silêncio e autocensura


Por Gabriel Ferreira Borges

14/05/2019 às 07h13

Passados 133 dias, o Brasil acumula, em 2019, conforme dados do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, 14 denúncias de racismo. Em 2014, 2016 e 2017, foram registradas 19, mas em relatórios anuais; já em 2015, 24. Desde 2014, o instituto mapeia os ataques racistas ocorridos no futebol brasileiro. Embora os números referentes ao último ano estejam sob avaliação, o observatório estima a superação de 50 denúncias. Rememora-se, nesta segunda (13), a assinatura da Lei Áurea; entretanto, ainda marginalizados, os negros enfrentam diariamente repressão estatal e marginalização social.

Márcio Chagas da Silva, árbitro uma vez filiado à Federação Gaúcha de Futebol, deixou o ofício, em 2014, em razão de uma série de ataques. Após partida do Campeonato Gaúcho, em Bento Gonçalves (RS), encontrou as portas do próprio carro amassadas, além de cascas de banana em cima do capô. Foi o estopim. “No futebol, existe uma tendência ao silenciamento quando o assunto é racismo. Muito jogador negro que passa por isso prefere ignorar os ataques temendo ter problemas na carreira se abrir a boca”, disse Márcio em relato ao UOL Esporte.

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Como em quaisquer esferas, o racismo é relativizado também no futebol; seja por Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e federações estaduais ou pela maioria dos clubes e jogadores. A jurisprudência adotada pelo Supremo Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) data de 2005 apenas. Embora o Código de Justiça Desportiva preveja a exclusão de times em competições eliminatórias em ofensas coletivas, o dispositivo determina a perda de apenas três pontos em torneios corridos, desproporcional à conduta.

A maioria dos jogadores brasileiros – em atividade ou formação – é negra. Contudo, dos 20 treinadores em atividade na elite do futebol brasileiro, apenas um o é – Roger Machado. Já dos presidentes, nenhum. Aristocrática, a estrutura, além de silenciar atos racistas, impõe aos jogadores, árbitros e treinadores a autocensura. No Brasil, quaisquer subversões são repreendidas, mesmo as mais fundamentais dos direitos humanos. É a vez de ouvir Cajus, Reinaldos, Jeffersons e Tingas.

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