Pés de obra


Por Gabriel Ferreira Borges

26/03/2019 às 07h12- Atualizada 26/03/2019 às 07h25

Anualmente, findados os campeonatos regionais, milhares de jogadores são, como milhões de brasileiros, relegados à informalidade. Crua, a realidade do futebol brasileiro é de precarização do pé de obra, embora as mais tradicionais agremiações, privilegiadas, apresentem orçamentos milionários. Entre dezembro e março, a maior parte de atletas, cuja ocupação declarada seja de jogador profissional, é submetida a relações empregatícias deploráveis. Já entre abril e novembro, em busca de renda, bicos em distintas ocupações e jogos de várzea.

Há temporadas, a reivindicação pelo fim dos regionais reverbera como incontestável solução ao desleal calendário brasileiro. Ora, o raciocínio é lógico – e, por isso, raso. Se as 15 datas destinadas aos regionais no início das temporadas fossem eliminadas, as demais seriam diluídas de melhor maneira ao longo do ano. Além disso, janeiro seria utilizado para pré-temporadas – inexistentes atualmente, diga-se. É certo que a disparidade econômica entre os mais populares e os interioranos sepultou os estaduais como se construíram, historicamente, no século passado.

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Entretanto, encerrá-los ou relegá-los à disputa entre as agremiações pequenas seria impiedoso. Se o clero futebolístico ganha centenas de milhares de reais, a plebe recebe não mais que dois salários mínimos durante quatro meses quando muito. Profissionais nem são. Pois, no Brasil, o futebol é, por imposição, amador. Precário por conveniência. Reclamar o fim dos estaduais esgota-se quando o futebol é pensado como um meio de integração social.

Há futebol para além de transmissões televisivas, fidelização e estádios monumentais. Ao passo que o futebol brasileiro exporta pé de obra por quantias exorbitantes, há, nos rincões, jovens andarilhos em busca de alojamentos, refeições e, porventura, ordenados em dia. A procura de dignidade, afinal. Em cerca de cem anos, a discussão do futebol brasileiro é a própria profissionalização. Assim ainda será, visto que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e suas respectivas filiadas aparentam outras preocupações.

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