Barroco delirante e (por que não?) moderno
Exposição ‘Transbarroco: Rococailles e outros delírios’ reúne trabalhos de Valéria Faria e Paulo Alvarez no Espaço Cultural Correios
Ao ver a dupla conversando, percebe-se que Valéria Faria e Paulo Alvarez são não apenas amigos de longa data, mas daqueles que carregam muitas afinidades entre si, em especial as artísticas -, e, neste caso, a influência do barroco no trabalho dos dois artistas plásticos resultou na exposição “Transbarroco: Rococailles e outros delírios”, que pode ser visitada no Espaço Cultural Correios, no Centro, até 30 de janeiro de 2019. São mais de 30 obras com produções recentes de Valéria e Paulo, entre pinturas, assemblages (colagens) e técnicas variadas que mostram o quanto o barroco e seu desdobramento, o rococó, podem se apresentar como modernos, ainda mais num período em que o hibridismo se faz tão presente nas artes.
Todos os trabalhos apresentados na exposição são inéditos, mas, pelo menos no caso de Valéria Faria, algumas pinturas são a retomada de uma série criada na década de 1990 (“Conversas com Cy Twombly”, inspirada no artista plástico norte-americano), que surgiu a partir da necessidade da artista de resgatar a persona pintora, que deu início a sua carreira artística em 1991. “Fui convidada para montar o curso de design da UFJF e fiquei muito tempo envolvida com a tecnologia da imagem, e passei a desenvolver outros tipos de trabalho, mas sempre envolvida de alguma forma com a pintura. Só que chegou um dia que falei ‘chega de tecnologia!’ (risos) e comentei com o Paulo que havia retomado a pintura, daí saiu a ideia para a exposição”, conta.
Caminhos divergentes para uma influência convergente
Além de “Conversas com Cy Twombly”, a exposição conta com outra série iniciada por Valéria, “Chandeliers”, inspirada em uma viagem feita pela artista a Ouro Preto, um dos locais em que a arte barroca mais se faz presente em Minas. Daí não foi difícil notar em seu trabalho, mesmo que com técnicas e estilos diferentes, uma aproximação com o trabalho do amigo – ainda que por caminhos cruzados, e não paralelos.
“Eu comecei com o figurativo, mas aos poucos ele foi sendo ‘destruído’ e daí fui para a abstração, o que por consequência me levou de volta a ‘Conversas…’. Já o trabalho do Paulo faz o caminho inverso, tem muito do abstrato que, aos poucos, vai adquirindo elementos figurativos”, analisa Valéria Faria. “Essas obras são uma nova etapa do trabalho que venho desenvolvendo desde 2013, que rendeu as exposições ‘Alegorias tecidas’ e ‘Sobre ornamentos’, que já pegavam as características do barroco de trabalhar com fragmentos”, explica Paulo Alvarez. “Eu geralmente começo com a pintura e depois incluo uma pedra, aí passo da moldura e vira uma escultura. Gosto de pegar as coisas e transformá-las. Minha obra tem muito do ‘fingimento’ típico do barroco, com aquelas colunas que parecem feitas de ouro mas que na verdade são de madeira. Uma das coisas que me interessa no estilo é essa coisa de o que parece que é, mas não é.”
Para Paulo Alvarez, o processo criativo de cada um não impede com que os trabalhos da dupla, quando misturados na exposição, deixem de dialogar entre si. “Há todas as referências da iconografia religiosa, e as obras também conversam entre si quanto a cor, e isso cria unidade”, acredita. “Vejo muita afinidade em nosso trabalho, mesmo com as diferenças”, pontua Valéria. “A obra do Paulo tem muita ligação e referências do teatro, do carnaval, outras das atividades dele, e isso cria uma experiência para as pessoas, que acredito que saem mudadas da exposição. No meu caso, é mais um ‘happening’ (risos).”
‘Um pé no barroco, outro no rococó’
Independente dos estilos e das origens, a influência do barroco na dupla vem de muitos anos. “Gosto do barroco desde sempre, quando comecei a estudar os mais diversos estilos. Eu gosto da arte que privilegia mais a emoção que os sentidos, e que é uma característica do barroco. É uma linguagem que está na essência da minha criação e que permite que trabalhe com vários elementos nas minhas obras, mesmo além da pintura.”
“A minha influência vem desde a infância, das excursões escolares para as cidades históricas de Minas, além das festas religiosas, das ornamentações das igrejas para esses eventos. E isso foi sendo reforçado à medida que fui estudando. O barroco foi basicamente o primeiro estilo com que os artistas brasileiros passaram a trabalhar, e até hoje ele está presente na arte brasileira em diversas situações. Até mesmo no modernismo é possível observar isso”, afirma. “Na verdade, acho que temos um pé no barroco, e outro no rococó (risos)”, encerra Valéria Faria.
TRANSBARROCO: ROCOCAILLES E OUTROS DELÍRIOS
Com Valéria Faria e Paulo Alvarez
Segunda a sexta-feira, das 10h às 17h30, no Espaço Cultural Correios (Rua Marechal Deodoro 470). 3690-5715. Até 30 de janeiro.